
Velha inimiga do Brasil, revista “Veja” não quer juros baixos nem câmbio real que viabilize a produção nacional e muito menos crescimento
No momento em que o presidente da República convoca o país, através do PAC, a acelerar o crescimento, o real artificialmente sobrevalorizado ameaça se transformar num pesadelo para a indústria. Os dados obtidos com a nova metodologia para o cálculo do PIB apontam para uma redução maior da participação da indústria manufatureira na renda nacional nos últimos anos – inferior a 20%. Setores que antes exportavam, tiveram que reduzir ou mesmo estancar suas exportações: é o caso da indústria têxtil, que em função disso demitiu mais de 100 mil trabalhadores no ano passado, e da indústria de calçados, que teve 35 mil demitidos. Segundo o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC), no primeiro bimestre deste ano, houve uma queda total de 4,5% no saldo da balança comercial, e, de 20 setores industriais, 13 sofreram redução do saldo.
É incrível que, depois do governo Fernando Henrique Cardoso quase aniquilar a indústria com o câmbio do tresloucado Gustavo Franco, haja ainda alguém disposto a defender tal estupidez. No entanto, há. São os velhos inimigos do Brasil, do seu crescimento, e, especialmente, do presidente Lula, que estão saudando o câmbio artificial que os juros altos provocaram. Naturalmente, não querem juros baixos nem um câmbio real que viabilizem a produção nacional, e muito menos querem crescimento.
“REAL FORTE”
A matéria de capa da última “Veja”, saiu batendo o bumbo do “real forte” e das vantagens que a classe média, os trabalhadores, os empresários, o governo, e, provavelmente, também as almas no outro mundo, estão tendo com esse câmbio maravilhoso. Interessante é que nem os trabalhadores, nem os empresários, nem a classe média, nem o governo, e nem as almas, repararam nessas vantagens.
A “Veja” especializou-se em tentar derrubar o presidente Lula; preferindo matar o povo de fome a matar a fome do povo, acha o Fome-zero um desperdício populista de dinheiro, pois o dinheiro público deve ser dado aos bancos americanos; diz que a política externa do presidente é um descalabro, por ser independente dos EUA, e uma loucura, por levar em conta os interesses do Brasil; odeia o partido do presidente e qualquer político que apóie o presidente; contra Lula, chega ao esgoto de difamar a própria família do presidente, bem ao modo dos nazistas.
Pois bem, é essa revistinha que sempre viveu em função do dólar, que de repente sai cantando odes ao “real forte”. Evidentemente, alguma coisa está errada.
E, realmente, está. O real não está “forte”. Seria o único caso de uma moeda “forte” que enfraquece o país, ao ser trocado pelo dólar. O real está é sobrevalorizado artificialmente, devido aos juros que, nesse patamar absurdo em que estão, atraem dólares para aqui dentro e tornam vantajoso para os bancos que os possuem, e para os especuladores de fora, trocarem-nos por reais para comprar títulos-públicos. Como já disse alguém, “o real transformou-se na melhor mercadoria do mundo”, devido aos juros dos papéis públicos, estabelecidos pelo Banco Central.
Mas, não se pense que essa sobrevalorização é apenas um sub-produto, não intencional, dos juros altos do sr. Meirelles. Em seus sucessivos boletins, o Banco Central explicita que sua diretoria acha muito boa essa aberração cambial – e a aponta como uma de suas realizações para tornar “sólidos” os fundamentos da economia. Certamente porque, além de beneficiar os especuladores externos, a sobrevalorização artificial faz com que a indústria dos países estrangeiros invada o país com importações baratas.
Nada há de original, no ramo da picaretagem econômica, em tentar passar uma sobrevalorização artificial da moeda como se fosse o supra-sumo do sucesso econômico. A farsa da “moeda forte” foi inventada por Salazar, hoje dando seus coices no Inferno, que em 1928 a erigiu em prova de excelência da sua iluminada ditadura. No mesmo ano, ele lançou outro moderníssimo mandamento econômico: “só se gasta o que se arrecada”. Fascista da Idade Média, Salazar não gostava do crédito, essa invenção de judeus.
VIGARICE
Interessante é que ainda haja quem repita o besteirol salazarista como o ápice da sabedoria – mesmo depois que ele tornou Portugal o país mais atrasado da Europa, importador de quase tudo, com uma agricultura feudal, obrigando quase metade da população a emigrar. Que, 80 anos depois, a “Veja” repita as vigarices de Salazar, só mostra sua afinidade com o fascismo – e com a vigarice.
Assim é a história do chamado “risco-Brasil”. Que seja o JPMorgan, hoje parte do JPMorgan-Chase, ou seja, da fusão entre os Morgan e os Rockefeller, quem estabelece o “risco” de aplicar em tal ou qual país, já é um absurdo, isto é, uma manipulação.
Apesar disso, em todos o lugares, quando o “risco-país” cai, é sinal de que os juros têm de ser reduzidos. Pela simples razão de que não é mais necessário mantê-los tão altos para que entre capital estrangeiro ou dinheiro especulativo externo. Essa é a lógica, ainda que seja a lógica dos neo-liberais. Porém, o sr. Meirelles inovou. O “risco-Brasil” caiu até mesmo abaixo da média dos chamados “países-emergentes”, e ele manteve os juros nas alturas. O resultado é a desova de dólares e o real sobrevalorizado, com a indústria e os trabalhadores prejudicados.
Talvez por estar momentaneamente – isso às vezes acontece – mais preocupado com outros problemas do que com a aceleração do crescimento, o ministro Mantega, um homem decente, declarou que “estamos num patamar de câmbio mais condizente com a situação estrutural da economia brasileira”. Segundo ele, “há outras economias que não praticam o câmbio flutuante. Se todos praticassem o câmbio flutuante [as indústrias brasileiras] seriam tão ou mais competitivas do que as de países que usam artificialismos que não usamos”. Realmente, se tudo fosse como desejamos, as coisas seriam diferentes. Mas nosso problema não estaria resolvido se a China, citada pelo ministro, adotasse o câmbio flutuante.
Porém, Mantega não explicou porque o câmbio flutuante é natural, e o não-flutuante é produto de “artificialismos”, no momento em que o câmbio brasileiro é, evidentemente, um artifício. Estabelecer o câmbio flutuante ou não-flutuante é uma decisão de política econômica, segundo os interesses do país a cada momento, nada tendo a ver com um suposto caráter natural de qualquer sistema de câmbio. Tanto assim que, se o câmbio é flutuante, isso quer dizer que ele será estabelecido, não pelo “livre mercado”, que não existe nessa área, mas pelo cartel financeiro e pela ação do Estado na compra e venda de dólares. É exatamente o que está acontecendo.
Os outros países são tão soberanos quanto nós para definir o seu sistema cambial. Nós, tanto quanto eles, temos que conviver, no mundo do qual todos fazemos parte.
Por essa razão, soa algo estranho dizer que “estamos num patamar de câmbio mais condizente com a situação estrutural da economia brasileira”. A que situação estrutural o ministro se refere? A proposta do presidente Lula é acelerar o crescimento. Como, então, a situação estrutural da nossa economia pode conviver com um câmbio que trava o crescimento? Esse é o problema.
CARLOS LOPES
Jornal Hora do Pvo