O Jornal Hora do Povo publicou artigo inédito enviado a eles pelo brigadeiro Sergio Xavier Ferolla, uma das mais ilustres personalidades democráticas e patrióticas do Brasil. O brigadeiro é um dos maiores conhecedores de nosso país e de seu potencial, conhecimento adquirido em décadas de relevantes serviços prestados à Nação, em especial à nossa Aeronáutica. Com o engenheiro Paulo Metri, do Conselho Nacional de Energia Nuclear, e conselheiro do Clube de Engenharia, Ferolla escreveu “Nem Todo o Petróleo é Nosso”, livro imprescindível aos que se interessam pelo problema de nossos recursos energéticos na atualidade. É desses dois autores o texto abaixo, onde eles analisam a questão de Angra 3, sua necessidade nacional estratégica, e a importância decisiva da alternativa nuclear como fonte energética para o país
SERGIO FEROLLA E PAULO METRI
O calvário de Angra 3 se estende desde a década de 70, pois a decisão sobre a utilização da fonte nuclear para ampliação do parque gerador nacional envolve fortes interesses políticos e econômicos, não representativos das reais aspirações da sociedade brasileira, impedindo a complementação do nosso complexo nucleoelétrico. Nossas usinas nucleares, depois de uma fase inicial, onde esses mesmos interesses atuaram, têm tido um bom desempenho, numa comparação com as similares internacionais.
Para realçar a importância da alternativa nuclear em nosso país, neste momento em que a questão energética e a preservação do meio ambiente destacam-se nas manchetes dos noticiários e no debate envolvendo técnicos e importantes lideranças em todo o mundo, é imperativo nos atermos à expectativa de preço da eletricidade gerada a partir das térmicas a gás natural, quando o preço desse derivado do petróleo tiver acompanhado o preço do barril, que, a curto prazo, deverá chegar aos 100 dólares.
Além desta questão, a contribuição para o ameaçador efeito estufa, característica das termelétricas, é insofismável, haja visto que uma usina a carvão, que produz 10 TWh (terawats/hora), lança na atmosfera 10 milhões de toneladas de CO2, além de outros gases e partículas sólidas e uma usina a gás natural, produzindo os mesmos 10 TWh, lança na atmosfera 5 milhões de toneladas de CO2, além de outros gases, enquanto Angra 1 e 2, que geraram em 2003 cerca de 13,8 TWh, lançaram na atmosfera, simplesmente, vapor d’água. Além do mais, as centrais nucleoelétricas são o único segmento da geração elétrica que tem total controle sobre seus rejeitos.
FATOR ECONÔMICO
É oportuno lembrar, também, que apesar de existir muita demanda a ser suprida nos próximos anos pela construção de novas hidroelétricas, como as projetadas para o Rio Madeira, no Estado de Rondônia, cada aproveitamento hidráulico é diferente dos demais, devido à vazão do rio, à queda da água, ao relevo no local da barragem e ao impacto sócio-ambiental, todos esses fatores repercutindo no preço da energia gerada. Dessa forma, não podemos dizer que todos os aproveitamentos hidráulicos geram eletricidade mais barata que a nucleoeletricidade, cujos investimentos são, estes sim, praticamente constantes.
Além disso, a comparação deve ser feita considerando-se a energia colocada nos grandes centros de consumo, já que a maioria dos aproveitamentos hidráulicos que restam a construir, está na região amazônica, longe desses centros, enquanto as usinas nucleares podem ser instaladas em qualquer região, desde que estejam próximas à costa ou a algum rio, por necessidade de refrigeração. Assim sendo, apesar de ainda existirem no Brasil alguns potenciais para hidroeletricidade mais atraentes que a geração nuclear, sob o ponto de vista econômico cada caso deve ser analisado em função dos parâmetros da região a ser atendida em nosso país continente.
FRANÇA E EUA
Muitos países com grande demanda de energia utilizam intensamente a fonte nuclear, como é o caso da França, onde mais de 70% da energia elétrica gerada atualmente é de origem nuclear e nos Estados Unidos, a eletricidade gerada a partir dessa opção, 17% do total, é maior que a eletricidade gerada por todas as fontes em operação no Brasil. Além disso, em todo o mundo volta-se a priorizar a geração nucleoelétrica, graças à já citada contribuição para a redução das emissões dos gases do efeito estufa. Portanto, é desconcertante verificar a ênfase imposta pela mídia e algumas entidades manipuladas por interesses alienígenas, que lançam dúvidas sobre a atratividade da conclusão de Angra 3, cuja boa parte dos equipamentos estão armazenados, há anos, exigindo gastos elevados para sua conservação, onerando o tesouro nacional e deixando de oferecer energia elétrica para o desenvolvimento do país. Angra 3 assegurará, também, maior estabilidade ao sistema elétrico nacional, por sua localização em uma das pontas desse sistema, fornecendo energia para a elevada demanda da região Sudeste, com os centros industriais do Rio, Minas e São Paulo.
DESENVOLVIMENTO
Nossos ecologistas não querem as hidroelétricas por trazerem danos ao meio ambiente, pela inundação de vastas áreas; também não querem as térmicas com a queima de combustíveis fósseis, por liberarem gases do efeito estufa. Sugerem, como alternativa, a utilização de energia solar, eólica e maremotriz, realmente benéficas e cuja busca para otimizá-las empenham-se laboratórios e empresas em todo o mundo. A realidade atual, porém, é que algumas destas fontes, além do custo elevado, ainda não foram suficientemente desenvolvidas e seriam incapazes de atender à crescente demanda, fornecendo cerca 3.000 MW/ano de acréscimo à capacidade instalada nacional. Sua imposição, com exclusividade, significaria, no curto prazo, propor a estagnação do crescimento do país, sem acréscimo da capacidade de geração. Cabe-lhes rever essas posições e considerar o benefício da inserção das nucleoelétricas, como vem ocorrendo no cenário internacional, lembrando, com espírito patriótico e enfoque na realidade nacional, que a tecnologia no setor tem evoluído de forma acentuada, afastando as superadas preocupações com a segurança e com o meio ambiente.
ELETRONUCLEAR
Existe mais um aspecto, para o qual a sociedade brasileira precisa ser alertada, que consiste do fato da não construção de Angra 3 representar a destruição da maior parte de um setor criado com grande esforço por gerações passadas. Primeiramente, os técnicos treinados na Alemanha e que se aposentarão até 2010, não terão a oportunidade de treinar seus substitutos, perdendo-se muito do conhecimento adquirido. Os segmentos de projeto e construção da Eletronuclear serão desativados, pois não faria sentido manter equipes altamente técnicas sem a existência de demanda por essas atividades.
Na NUCLEP teríamos a perda natural de capacitação da fábrica de equipamentos pesados para componentes de uma usina nuclear, que exige, por exemplo, soldas especiais para os trocadores de calor, geradores de vapor e vasos de contenção. A empresa Indústrias Nucleares do Brasil (INB) será inviabilizada, pois não conseguirá se manter trabalhando por muito mais tempo abaixo do ponto de equilíbrio já que, hoje, só fornece elementos combustíveis para Angra 1 e Angra 2, ocupando cerca da metade da sua capacidade. Sem a INB não existirá razão para termos o enriquecimento de urânio em escala industrial, no porte projetado, predominando no futuro a exportação desse minério “in natura”, de reduzido valor comercial. Nosso país tem a sexta reserva mundial de urânio, cerca de 300.000 toneladas de U308, e a tecnologia do enriquecimento, verdadeiro patrimônio da capacidade tecnológica nacional, desenvolvida no país pela Marinha de Guerra com apoio do Instituto de Pesquisas Energéticas Nucleares e cuja primeira fase já foi implantada pela INB, permitiria, também, a exportação do excedente da produção, com elevado valor tecnológico e comercial agregado.
A própria Marinha, que hoje utiliza a capacidade industrial da NUCLEP para a fabricação de grandes componentes destinados aos submarinos de fabricação nacional, receberá também outro destruidor impacto, pois além de não dispor desses componentes, não terá mais o enriquecimento da INB para a propulsão do seu projetado submarino nuclear.
Na verdade, Angra 3 representa, pela sua relevância e interação com outros projetos, como demonstrado, mais uma questão do Estado brasileiro e não a de um governo específico. Estadista é o líder maior que se preocupa com as questões de Estado, além daquelas de governo, e decide, contrariando, se necessário, interesses políticos conjunturais, para que o objetivo maior da sociedade seja preservado. Daí a esperança ainda depositada nos atuais governantes, pressionados por interesses de toda ordem, mas que não ousarão deixar um legado para as futuras gerações não condizente com a confiança e a esperança recebidas do povo brasileiro.
Fonte Jornal Hora do Povo
Obs. O Brigadeiro Sergio Xavier Ferolla, é uma das mais ilustres personalidades democráticas e patrióticas do Brasil, o livro dele e do Paulo Metri é imprescindível aos que se interessam pela questão energética no Brasil.