O primeiro passo para aumentar a competitividade do Brasil no mercado global exige o esforço da humildade
A PRODUÇÃO de flores nas margens do rio São Francisco ou uma cirurgia parece ter pouca relação com o crescimento da globalização. Entretanto pequenos empreendedores do Nordeste estão transformando a matriz econômica de municípios ao exportar flores tropicais. Na área médica, vemos o aumento da concorrência mundial em determinadas intervenções, movido pelo duo preço e qualidade de serviços. Apesar das barreiras comerciais e de outros aspectos limitantes da internacionalização, cada vez é mais difícil encontrar um setor no país que não seja influenciado por movimentos internacionais.
Gostaria, então, de convidar o leitor para uma reflexão sobre o impacto da globalização na vida das pessoas e das empresas. Esse fenômeno teve início com a evolução da área logística, que resultou em menores custos de transporte, estimulando o comércio. Logo depois, veio a globalização de processos produtivos, decorrente do maior acesso ao conhecimento e às novas tecnologias.
Hoje em dia, também vivemos o fenômeno da globalização da força de trabalho, o que deverá crescer nos próximos anos. Isso leva a expressivas mudanças comportamentais. À medida que as organizações precisam ter patamares internacionais de eficiência, nos quais o custo é um fator primordial, passa-se a requerer profissionais mais capacitados, com níveis de educação diferenciados.
Diante desse desafio, muitas empresas também passaram a adotar uma atitude diferente em relação às demais organizações. Isso porque a globalização ampliou a possibilidade de empresas brasileiras compararem-se com outras -os chamados benchmarks internacionais- e aplicarem as melhores práticas em seu dia-a-dia. Esse comportamento, aos poucos, passa a integrar-se aos governos, cuja ineficiência na gestão de recursos impacta diretamente na capacidade de competir das companhias brasileiras. Entretanto o impacto da globalização, pela sua extrema complexidade, não é devidamente percebido e debatido pelas lideranças políticas, empresariais, acadêmicas e sindicais.
Conseqüentemente, há uma redução das oportunidades de inserção de um número maior de empresas no mercado global e de inclusão de novas gerações no mercado de trabalho. Isso é reflexo de uma soma de fatores: instituições ainda em fase de consolidação, carga tributária elevada, custos com a burocracia excessiva, baixos níveis de educação e ineficiência da infra-estrutura logística.
O primeiro passo para aumentar a competitividade do Brasil no mercado global requer um esforço individual de cada um de nós: humildade. É isso mesmo. É preciso ter humildade para, antes de tudo, avaliar suas próprias práticas e enxergar os pontos a serem aprimorados nesse ambiente mutante, internacionalizado e cada vez mais complexo.
JORGE GERDAU JOHANNPETER, 70, é presidente do conselho de administração do grupo Gerdau, presidente fundador do Movimento Brasil Competitivo (MBC) e coordenador da Ação Empresarial.
Folha online
Rizzolo: À parte a questão da “humildade” e de outros fatores elencados por Gerdau como, instituições ainda em fase de consolidação, carga tributária elevada, custos com a burocracia excessiva, baixos níveis de educação e ineficiência da infra-estrutura logística, o Brasil precisa se posicionar como um país com um mercado consumidor de 190 milhões de pessoas. De nada adianta estarmos preparados, se as barreiras protecionistas instituídas pelos países ricos insistem em nos barrar. Não há como ser competitivos sem concessões recíprocas, não podemos nos colocar em condição subserviente em relação a países que “querem tudo para eles” e fecham suas portas de certa forma até “patriótica” inviabilizando acordos pautados de reciprocidades.
Como o que ocorreu na Rodada de Doha, onde os setores industrial e agroindustrial brasileiros não aceitaram a pouca disposição demonstrada pelos Estados Unidos e pela União Européia, acordos equilibrados é que faltam, temos que pensar que possuimos um mercado interno grande e “barganhar” e até mesmo vincular a presença do capital internacional no Brasil, nessas negociações.
Os EUA e a União Européia são governos fracos, em final de mandato, sem apoio eleitoral em seus países. Uma Europa sem liderança e sem política comum, a não ser defender com unhas e dentes essa política fracassada de subsídios agrícolas. De nossa parte devemos tirar todas as lições, continuar negociando, mas cuidar do Brasil e do Mercosul, da integração da América do Sul, do nosso mercado interno, aprofundando nossa política de desenvolvimento e nossa política industrial e de inovação.
Não podemos culpar e jogar sobre as nossas costas, o fato de não estarmos incluídos de forma globalizada na economia mundial, unicamente pela carga tributária, pela burocracia, enfim, contra fatos não há argumentos, precisamos sim estar mais competitivos, mas antes de tudo temos que negociar e usar o potencial do nosso grande mercado interno, onde as multinacionais aqui faturam alto, e ainda fazem remessas de lucros vultuosas; só para se ter uma idéia, em maio, o Banco Central registrou a entrada de US$ 501 milhões referentes ao chamado investimento direto estrangeiro, ao mesmo tempo em que as transnacionais instaladas no país enviaram US$ 2,632 bilhões para suas matrizes no exterior a título de lucros e dividendos. Esses dados são relativos à questão da produção, não englobando os capitais meramente especulativos, atraídos pelos juros altos.
O fato das remessas de lucros terem superado em mais de cinco vezes a entrada dos festejados “investimentos” diretos demonstra, mais uma vez, que a brutal desnacionalização a que foi submetida à economia brasileira tem proporcionado a transferência de fabulosos recursos para o exterior. Será que isso não dá para negociar o protecionismo dos países de origem dessas empresas? Precisamos de humildade sim, para reconhecer que ainda não soubermos nos impor. E aprender com eles, a saber gerenciar os interesses da nação e do povo brasileiro, este sim seria um ponto a ser aprimorado.