Como de costume, todo Sábado procuro não escrever textos que não estejam relacionados com o Shabbat e com o estudo da Tora. Sem ter a intenção de dar uma conotação pessoal religiosa ao que escrevo, permito dirigir me a você, que acompanha minhas reflexões diariamente, e compartilhar com o amigo(a), de uma forma humilde, esses momentos de introspecção dos meus estudos no Shabbat, que se iniciam todas às sextas-feiras, quando me recolho duas horas antes da primeira estrela surgir no céu, numa Sinagoga ortodoxa que freqüento em São Paulo.
Como já disse anteriormente, tenho profundo respeito por todas as crenças, religiões, e acima de tudo sou um brasileiro patriota, amo meu país e o povo brasileiro, e tenho sim, uma grande satisfação espiritual em ao estudar a Parashá (Porção da Tora semanal) relacioná-la ao que vivemos nos dias atuais. Shabbat é um dia de paz, descanso e harmonia. Devemos nos abster das tensões e às exigências da vida cotidiana.
Como é uma reflexão de estudo pessoal, baseada na introspecção bíblica, recomendo a todos que acompanhem no Antigo testamento (Torah ) os comentários aqui expostos, para que possamos ter uma semana de paz; e que através dos estudos judaicos, possamos compreender nossas vidas e encontrar formas de superar as adversidades na visão de Hashem (Deus). Isso nos dará energia e um “Idiche Kop” ( perspicácia particular), para que enfim tenhamos condições de construir um Brasil cada vez mais digno e com mais justiça social, que é a base do Judaísmo, do Cristianismo, do Islamismo, e de todas as religiões que levam a um mesmo Deus.
E lembre-se, Deus não quer apenas que você ore, mas que você aja com um parceiro dele aqui neste mundo, promovendo mudanças, estudando, se aperfeiçoando cada vez mais em sua área de atuação, e lendo, lendo muito. Quem não lê não pensa, e quem não pensa será para sempre um servo . Nesses aspectos, Ele Hashem ( Deus), precisa mais de você do que você dele. Somos aqui nesse mundo, parceiros de alguém maior. E quando orares, siga um conselho do Rabi Menahem Kotzk que ouvindo o comentário, respondeu: ” Se alguém clama ” Pai, ó Pai ! ” várias vezes, Deus acaba se tornando realmente seu Pai “.
A parashat desta semana chama-se Ki Tissa e começa com a ordem de D’us a Moshê para fazer um recenseamento, coletando uma contribuição igual de uma moeda de meio-shêkel de cada adulto do sexo masculino entre as idades de 20 e 60, e estes lucros irão para o Mishcan (Tabernáculo).
D’us descreve a Moshê o kiyor de cobre (lavatório e base) na qual os Cohanim santificarão suas mãos e pés antes de servirem no Mishcan. É também discutido o azeite para unção que seria usado para santificar os vários utensílios para uso normal. A isso segue-se a receita para o ketoret, insenso aromático a ser queimado duas vezes ao dia. D’us designa Betsalel, da tribo de Yehudá, e Oholiyav, da tribo de Dan, a supervisionar a construção do Mishcan que está para ser iniciada. A mitsvá do Shabat é então repetida para advertir a nação de que mesmo a construção do Mishcan não suplanta a observância do dia semanal de descanso.
A Torá retorna à narrativa da Revelação no Monte Sinai, e descreve o terrível pecado do bezerro de ouro. D’us acede às preces de Moshê para que os filhos de Israel sejam poupados da aniquilação por sua grave transgressão, e Moshê desce da montanha com as duas Tábuas dos Dez Mandamentos.
Ao testemunhar uma parcela da população dançando ao redor do Bezerro de Ouro, Moshê quebra as Tábuas e queima o ídolo, iniciando o processo de arrependimento. Como resultado da queda do povo de seu patamar espiritual elevado, D’us anuncia que Sua presença não pode residir entre eles.
Moshê é forçado a mudar temporariamente a tenda para fora do acampamento, para que D’us continue a se comunicar com ele. Moshê novamente sobe à montanha para rezar a D’us para que perdoe o povo judeu, e lhes devolva o status de povo escolhido. Moshê finalmente retorna com o segundo conjunto de tábuas e um pacto renovado com D’us; sua face aparece resplandecente como resultado da revelação Divina.
Essa parashat é interessante pois revela após o entusiasmo do povo em relação à construção do Tabernáculo o povo se reuniu a pedido de Moisés e fizeram generosas doações para financiar a construção. Na verdade, foi a primeira coleta de fundos do povo judeu, feita para possibilitar a construção do tabernáculo. Instantes antes de iniciarem a as doações e a obra, forma ditas as seguintes palavra ” De certo, Meus sábados guardareis, pois este é um sinal entre mim e vós.E guardaram os filhos de Israel o Shabat, para fazer do Shabat, por suas gerações, uma aliança perpétua ” Êxodo 41:13-16
Na verdade Deus tinha um pequeno receio que o entusiasmo na construção do Tabernáculo, levasse o povo a não mais respeitar o Shabat. O conteúdo do Shabat e o modo como seus resultados são alcançados, são assuntos para uma discussão à parte. No entanto, é interessante acompanharmos a redescoberta do Shabat por pensadores contemporâneos, que não cresceram em sua observância. A cultura consumista e escravizante da sociedade tecnológica ocidental, tritura os indivíduos até os ossos, fez com que tais pensadores passassem a sentir saudades da mensagem do Shabat, passando a enaltecê-lo. Por exemplo:
” A era tecnológica tritura a alam humana. O desafio das velocidades destrói o ritmo de comunicação emocional entre as pessoas, tornando-a, no melhor dos casos, uma comunicação funcional, empobrecida de conteúdos emocionais e espirituais… A multiplicação das possibilidades e a potência das opções de satisfação das necessidades corroem a paz de espírito do homem. A publicidade moderna, incluindo as ” relações públicas “, tem por objetivo furtar os últimos vestígios de tranqüilidade dos ” clientes”, levando-os continuamente de uma paixão induzida a outra, Assim também foi destruida a comunicação interiro na alma do indivíduo, que não consegue conhcer a si próprio nem compreender seus sentimentos…É para isto que necessitamos do Shabat. Ele nos é indispensável, se quisermos sobreviver nesta terra de forma permanente. Não há nada mais moderno do que no Shabat original ! O Shabat em sua originalidade, em sua compreensão espiritual e em sues parâmetros psicológicos é importantíssimo para nós, os filhos do século vinte… O shabat é a ” complementação da criação ” Ou seja, ele apresenta um ritmo necessário para existência da vida em sua totalidade, o qual é totalmente diferente do ritmo dos dias de trabalho… ”
Texto para Reflexão
O que diz a lei judaica sobre a pena de morte?
A maioria dos países ocidentais aboliu a pena de morte. Os Estados Unidos são uma das poucas exceções. Os defensores da pena de morte freqüentemente citam a Bíblia como a fonte para justificar seu uso, mas será uma surpresa para muitos que, sob a lei judaica, a pena de morte é praticamente impossível de aplicar. Isso ocorre porque, além dos Cinco Livros de Moshê (a Lei Escrita) a lei judaica consiste também da Lei Oral, que explica e interpreta a Lei Escrita. Enquanto a Torá nos dá uma lista de crimes capitais, o Talmud (Lei Oral) estabelece os requisitos necessários para se provar a culpa. Antes que a culpa possa ser estabelecida e uma execução levada a cabo, numerosos requerimentos legais devem ser satisfeitos:
1 – Duas testemunhas versus prova circunstancial. A célebre história de Rabi Shimon ben Shetach (San’hedrin 37b) ilustra até que ponto a prova circunstancial não é considerada pela lei judaica. Ele testemunhou ter visto um homem perseguir seu amigo até umas ruínas. Correu atrás dele e encontrou o amigo morto, enquanto o perseguidor segurava uma espada banhada em sangue. Rabi Shimon disse: “Ó perverso, quem matou este homem? Ou fui eu ou foi você. Mas o que posso fazer – seu sangue não foi entregue às minhas mãos, porque a Torá diz: ‘Com base em duas testemunhas, ele será condenado à morte.'” A faca podia estar suja de sangue, o homem que ali estava podia ser o único que possivelmente cometera o assassinato. Mas enquanto não houvesse duas testemunhas que realmente presenciaram o crime, as cortes não poderiam condenar.
2 – Requisitos para testemunhas. As testemunhas devem ser “casher”. Isso significa, por exemplo, que não podem ser parentes umas das outras ou de qualquer outra pessoa envolvida no crime. Além disso, o Talmud relaciona uma vasta quantidade de razões que desqualificam uma testemunha, baseada em personalidade, ocupação, etc. Por exemplo, uma pessoa que aposta em jogos de azar é desqualificado como testemunha.
3 – Advertência. Na lei judaica, ninguém pode ser condenado por um crime, a menos que tenha sido advertido adequadamente. Isso significa que as duas testemunhas que vêem uma pessoa prestes a cometer um crime devem bradar ao criminoso em potencial tanto o texto bíblico proibindo o ato quanto a penalidade para tal infração em particular.
4 – “No prazo”. Uma advertência não é suficiente se for feita mais de quatro segundos antes do crime ser cometido. É possível que o infrator tenha esquecido a advertência ou não a esteja mais levando a sério, caso mais que quatro segundos se passarem entre o sinal de alerta e o crime!
5 – Aceitação da advertência. O último requisito é provavelmente o mais “chocante” e “ilógico” da série. Para que tudo que foi dito acima tenha validade, o criminoso prestes a cometer um crime deve indicar verbalmente que ouviu a advertência e optou por ignorá-la. Somente se o criminoso responder : “Apesar disso, farei”, o tribunal pode prosseguir com suas deliberações para a pena de morte.
Devemos lembrar que o sistema legal que reconhece D’us como Juiz Supremo não está afirmando que este homem deva permanecer impune. Ao contrário, quer dizer que uma corte humana é apenas designada por D’us para executar a retribuição quando existe certeza absoluta. De outra forma, devemos deixar que D’us cuide para que os perversos recebam o que lhes é devido.
Dadas as restrições acima, é compreensível que Rabi Elazar ben Azaryá dissesse que um tribunal que pronuncia uma sentença de morte a cada setenta anos é um tribunal assassino (Talmud, Tratado Macot 7a).
Os padrões que explicamos – do requisito de duas testemunhas até a aceitação da advertência – derivam todos da Torá. No entanto, a própria Torá, em termos que não deixam dúvida, ordena: “Certamente deve ser morto.” Como pode a Lei Escrita ordenar uma sentença que a Lei Oral torna impossível impor? Como esta contradição pode ser resolvida? Qual é, então, a vontade de D’us?
Melhor prevenir que remediar
Há uma grande diferença entre a lei judaica e outros sistemas legais. Enquanto outros se concentram na situação após o crime ter sido cometido, a lei judaica tenta impedir que o crime seja cometido. Apesar das alegações daqueles que propõem punições pesadas, a estatística indica que os criminosos muitas vezes não são impedidos pela ameaça de uma sentença severa. No máximo, sentenças severas afastam os criminosos da sociedade por algum tempo. Quanto ao crime capital, e na verdade todas as formas de crime, o objetivo da lei judaica é prevenir o crime.
No Êxodus, o sistema legal do judaísmo é introduzido com o seguinte versículo: “E estes são os estatutos que deverás colocar perante eles” (Shemot 21:1). Este é o único lugar em que a frase “perante eles” (Lifnehêm) é usada. Em qualquer outro lugar da Torá, as ordens são dadas “a eles” (Lahêm). Por que então a Torá usa as palavras “perante eles” quando apresenta o sistema legal?
O famoso orador, o Maguid de Dubno, respondeu com uma parábola: “Os sábios de Chelm” – conhecidos mundialmente por possuírem a sabedoria que exemplifica a estupidez da humanidade – depararam-se com um sério problema. Uma das estradas da cidade tinha um aclive muito íngreme no ponto em que fazia a curva em torno da encosta da montanha. Não havia defensas. Quando cavalos e carruagens desciam em alta velocidade, eram incapazes de acompanhar a curva e se precipitavam no despenhadeiro, ficando gravemente feridos.
“O que deveria fazer a cidade de Chelm quanto a esta situação terrivelmente perigosa? Durante vinte e quatro horas reuniram-se e deliberaram. Uma curva acentuada, sem proteção, pessoas, cavalos e carruagens constantemente se ferindo. O que fazer? E então a resposta veio num clarão de brilhante discernimento. A cidade de Chelm votou unanimemente pela construção de um hospital sob o desfiladeiro.”
O mundo tem demonstrado uma reação de “Chelm” a seus problemas. Uma onda de crimes? Construa mais prisões. Uma epidemia de drogas? Comece mais campanhas contra os tóxicos. Violência, perversidade, corrupção? Construa hospitais que lidem com os efeitos, mas nunca com as causas.
Prevenção, não punição
A essência da lei judaica é preventiva. Estas ordens são colocadas “perante eles” porque visam lidar com o crime “antes” e não após o ato. A lei judaica foi feita para ser estudada por todos, não somente advogados. O judaísmo afirma que quando uma criança é criada com o conhecimento da lei de D’us e com amor pela Torá, esta criança provavelmente não transgredirá. A declaração de que um malfeitor “certamente deve ser condenado à morte,” não significa uma punição a ser posta em prática depois que o crime foi cometido, mas uma doutrina educacional, a ser estudada por todos, de que aos olhos de D’us isso é um crime hediondo.
Como podemos transmitir aos filhos o grau de severidade implícito em diferentes tipos de comportamento errado? Se o filho perturba com um pequeno ruído, o pai diz: “Pare com isso.” Se ele, inadvertidamente, brinca com uma chave de fenda e começa a colocá-la numa tomada, os pais gritam a plenos pulmões e talvez até digam: “Se fizer isso de novo, vou matá-lo.” Obviamente, a ameaça não deve ser levada a sério, pois seu propósito é assegurar que aquilo não aconteça. Afinal, os pais não querem que a criança perca a vida.
Quando D’us estabeleceu estas leis perante o povo de Israel, Ele estava, na verdade, intercedendo em uma linguagem similar de amor e preocupação. Quando D’us diz: “ele certamente será morto”, está dizendo que se a pessoa cometer este crime, merece morrer, não que Ele realmente deseja que seja executada. Para enfatizar isso ainda mais, estas palavras são seguidas pela ordem de D’us aos tribunais: “E o tribunal julgará e o tribunal salvará” (Bamidbar 35:25), ordenando aos juízes que façam tudo ao seu alcance para conseguir um veredicto de “inocente”.
Alternativa para a pena de morte
O judaísmo encontrou uma notável alternativa para a pena capital. De fato, reunir pessoas em praça pública às segundas e quintas-feiras pela manhã, bem como no Shabat. Que a praça seja a sinagoga. Em vez de enforcar ou guilhotinar, eletrocutar ou decapitar, que todos ouçam as palavras do próprio D’us: “Aquele que fizer tal e tal coisa certamente será morto.” Imagine uma criança que, desde os primeiros dias, vem ouvindo em nome do Onipotente que amaldiçoar ou ferir os pais é um crime capital e quem fizer assim deve morrer. É difícil acreditar que um dia considere displicentemente a perpetração destes crimes.
O que outras culturas fazem após o crime, via execuções públicas, o judaísmo consegue com uma metodologia de instrução pública.
Medidas de emergência
Existe ainda uma admoestação final, a de medidas de emergência. Se os criminosos souberem que sempre conseguirão escapar impunes, se os castigos bíblicos forem vistos como universalmente inaplicáveis, não é possível que a compaixão acabe sendo inútil? Os Sábios estavam claramente conscientes desta possibilidade. Portanto, em situações extremas, o San’hedrin (Tribunal Supremo de 71 juízes), recebeu a autoridade de fazer vista grossa às benesses das leis de pena capital e impor uma sentença de morte, apesar da falta de advertência total e evidência incontestável.
A pessoa se pergunta como o San’hedrin lidaria com a sociedade moderna. Chegamos ao ponto em que medidas de lei de emergência deveriam ser consideradas aplicáveis? Seria bom sentir que não fomos tão longe a ponto de nossa sociedade não poder ser trazida de volta à lei de D’us. Entretanto, algo fica muito claro na lei judaica. Antes que os tribunais pudessem ignorar as leis de punição capital, deveriam ser feitos todos os esforços para assegurar que toda a sociedade entendeu, desde tenra idade, o que D’us deseja de nós.
Fontes: Beit Chabad, e Reflexões sobre a Torá de Moishe Grylak
Tenha uma semana e um sábado de muita paz !
” A voz daquele que chora à noite é ouvida, e as estrelas choram com ele”.
Rabi Nahaman de Brtslav
Fernando Rizzolo