A “esquerda” aprecia a Lei de Imprensa

Ainda me lembro como se fosse hoje. Estávamos assistindo uma aula de Introdução ao Estudo do Direito, e de repente, entra na sala de aula, o presidente do Diretório Acadêmico e pede licença ao professor. Era o início das aulas no ano de 1974, e o pedido era para que a aula fosse interrompida para que nós, alunos, pudéssemos participar de uma reunião no ‘ coletivo”, contra ” a falta de liberdade de expressão” imposta pela autoritária Lei de Imprensa editada em 1967. Várias correntes da esquerda, na época, promoviam o debate, uma das quais fazia eu parte, era como diria um… ” inocente útil “. O jornal O Estado de São Paulo, a Folha de São Paulo, eram censurados, jornalistas processados, e as esquerdas cerravam fileiras na luta pela liberdade de expressão que, após a abertura política, e com a consagração da nossa Carta Magna, tais liberdades foram comtempladas pela Lei maior.

Mas parte das esquerdas mudaram, ficaram mudas, ganharam parte do poder com o PT de Lula, e agora, imaginem, rechaçam a liberdade de expressão, atacando aqueles, muitos dos quais, na época em que lhes interessava a ” livre opinião”, estavam ao seu lado. Este é o perfil de algumas esquerdas do Brasil, digo algumas porque nem todas aprovam o autoritarismo, nem todas como as ligadas à Igreja assim entendem, nem todas reesposáveis e democráticas assimilam o teor stalinista na defesa dos interesses particulares e pessoais. Posso falar sobre isso de forma confortável, como ex. militante da esquerda, quando ela realmente representava um avanço na defesa das liberdades democráticas. Hoje algumas esquerdas vivem de chancelar tudo o que Lula diz, e tudo o que o PT apregoa. O pior mesmo, é ver o presidente Lula, talvez influenciado por estas ” esquerdas”, insinuar que o direito ao socorro do provimento jurisdicional baseado em tal Lei, é válido, e não questionar os fundamentos autoritários dessa Lei que amordaça o livre pensamento.

Com o costumeiro acerto, o ministro Carlos Ayres Britto, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu, em caráter liminar, parte da Lei de Imprensa. Ao anular, ainda que temporariamente, processos e condenações, o judiciário agiram em nome da democracia e do bom senso, e não como apregoam as “esquerdas” desesperadas, alegando que “o provimento jurisdicional abriu as portas do paraíso para que a mídia use e abuse de seu poder para destruir reputações e acuar inimigos políticos”.

As verdadeiras esquerdas existem no Brasil, são democráticas, não tem medo do debate, e jamais foram contraditórias com seu passado de luta. Se conversarmos com um militante do Partido Socialista Francês, e dizermos que algumas esquerdas defendem uma Lei dessa natureza, realmente ele vai no mínimo dar risada. Uma democracia se faz sem medo. Sem se intimidar ao debate, despida de recursos autoritarescos, e se o presidente Lula quer mesmo agradar a Igreja Universal, o bispo Edir Macedo que é sim um grande líder, deve rechaçar essa Lei que irá com certeza prejudicar a essência do caráter democrático do grande jornal que o bispo pretende empreender. O Código Civil, e o nosso Código Penal, já prevê instrumentos suficientes de ressarcimento aos danos causador por terceiros, basta essas ” esquerdas” estudarem e perderem o medo de serem felizes, fazerem uma terapia de ” vidas passadas ” e relembrarem as bandeiras que defendiam outrora.

Fernando Rizzolo

2 Respostas to “A “esquerda” aprecia a Lei de Imprensa”

  1. Pedro Ayres Says:

    Caro Fernando

    Há anos que milito na imprensa e sempre considerei bem intersssante a confusão que é feita entre a liberdade de expressão(um direito individual e coletivo) e a livre imprensa, que é um tipo de atividade empresarial. Na minha experiência aprendi que nunca houve ou há liberdade de expressão na imprensa, pois, quando um jornal ou revista é editado, a edição sempre refletirá o pensamento dos donos do veículo, jamais o que pensa os seus redatores e repórteres.
    Fernando, os inúmeros processos abertos contra alguns meios de comunicação, podem até ser vistos como uma chicanice e instrumentos intimidadórios não à Liberdade de Expressão, mas, aos abusos de arrogância quando veiculam boatos, intrigas e “fatos” sem nenhum tipo de comprovação real. Aí, sim, há o atentado à liberdade pois ao induzir o pensamento do leitor, com informações falsas ou só pela metade, está lhe retirando a possibilidade de pensar e agir com plena liberdade.
    E, por favor, ex-militante, pode falar por si, menos generalizar situações e comportamentos. E para finalizar, como um bom cultor do Direito, deve se lembrar de que as leis e práticas sociais são sempre determinadas pelo que Hans Kelsen chamava de “grundnorm”, o que limita por extremo qualquer direito à liberdade de expressão, algo que é feito com muita clareza e lucidez por todos os meios de comunicação do mundo a partir de seu interesses e objetivos. O resto é lantejoula.

  2. Fred Says:

    Caro Rizzolo

    Completando o post do Pedro Ayres

    Ja tendo trabalhado em veículo de comunicação – “Orgão de Imprensa”. Vi coisas do arco da velha. aprendi que
    mais do que veículo de informação seus operadores os utilizam como veículos de formação de opinião e poder.
    Para tal não se limitam a divulgar somentes fatos, mas a comentar de acordo com suas opiniões e as impondo a aqueles que sem preparo crítico somente as absorvem como verdades absolutas.
    Se não houverem limites legais, não haverá instituição da sociedade, sejam elas estatais ou privadas, que estejam protegidas contra abusos, erros, omissões, e manipulações que possam ser feitas em nome da liberdade e da democracia.
    Ainda penso que democracia é o sistema onde a liberdade se manifesta no limite da lei. Por este motivo é necessaria a lei para que a liberdade aconteça em sua plenitude pois seu limite passa a ser conhecido, assim como a velocidade máxima em uma rodovia, ela precisa ser estabelecida e comunicada para que possamos viajar em segurança.
    Uma Lei específica de imprensa é necessária, temos é que participar de seu debate e confecção para que ela não seja por demais restritiva nem por demais condescendente.
    Saudações


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