Ainda me lembro daquela reunião. O que parecia ser um encontro do “coletivo” para uma discussão mais aprofundada sobre determinando assunto, acabou por tornar-se um bate -papo informal. Estávamos nos anos 70, portanto eu ainda jovem, naquela fase em que participar de um grupo de esquerda na época, era no mínimo ” chique”, existindo naquilo um bom conteúdo de ” adrenalina”. Comentava-se na conversa descontraida, que os ” companheiros presos” pouco tinham o que fazer, a não ser estudar e ler, tudo é claro, menos leitura marxista; afinal eram presos políticos. Lia-se de tudo principalmente, diziam, livros de Direito.
Após ter lido nos jornais tudo a respeito da questão do dossiê contra FHC envolvendo os cartões corporativos e contas B, promovido pela Esplanada dos Ministérios com o propósito de constranger o ex-presidente e a oposição, fiz um reflexão sobre os caminhos que levaram a secretária executiva da ministra Dilma, a utilizar os dados sigilosos para a elaboração desse documento sem a devida autorização judicial. A argumentação que tem como esteio, a utilização de eufemismos e retórica esdrúxula na tentativa de minimizar um ato no mínimo delituoso como este, a quase ninguém convence ou impressiona, até porque, dossiê é o produto final da coleta de um banco de dados, ou seja, bando de dados é a matéria-prima elaborativa, existindo no caso perfeita adequação em termos de nexo causal quando falamos em dossiê.
Não poderíamos nos colocar como ingênuos iniciando uma análise, partindo do pressuposto petista de que ” ninguém de nada sabia”. Com efeito, muito embora não se tenha uma prova concreta, recai sobre a ministra Dilma Rousseff a acusação de ser a mentora da elaboração deste documento, que provavelmente, se comprovada sua participação, obteve sua inspiração jurídica no Código de Processo Civil. A ministra como público é o fato, ficou presa por ter em nome da organização Comando de Libertação Nacional (COLINA), ter participado, na época, da ação que roubou o cofre do ex-governador paulista Adhemar de Barros onde foram subtraídos US$ 2,6 milhões de dólares americanos.
É claro, que teve ela um passado de luta, muito embora de cunho terrorista o que culminou com a sua prisão entre 1970 a 1973. Imagino que talvez nessa época, até para se ocupar, tenha se aprofundado no estudo dos institutos jurídicos das provas, previsto no Código de Processo Civil com o título de ” produção antecipada de provas” tema este, que pelos fatos elencados e ocorridos, nos leva a pensar ser de sua predileção. Na realidade a prova antecipada, é uma espécie de ação cautelar, está prevista nos artigos 846 ao 851 do Código de Processo Civil brasileiro, muito semelhante, e talvez inspiradora, da manobra elaborada pela Esplanada dos Ministérios.
A principal finalidade da medida cautelar é assegurar a produção da prova antes do momento processual adequado e reservado para tal, já que, se tiver que ser aguardado, o momento oportuno poderá se perder, e, desse modo, comprometer a elucidação da causa de mérito. A principal semelhança como já disse anteriormente, é a antecipação da coleta de provas. Já na primeira semana de fevereiro, muito antes de a Comissão Parlamentar de Inquérito(CPI) dos Cartões ter sido instalada, o Palácio do Planalto, mobilizou toda a Esplanada dos Ministérios para coletar informações e montar um dossiê com dados sobre gastos de FHC, e ao que tudo indica sob os auspícios de Dilma, que não hesitou talvez, em relembrar suas leituras dos tempos de repressão.
A pergunta que fica sobre toda essa questão, mais uma vez passa pelo exemplo da integridade moral. Que tipo de exercício político temos hoje, que instrumentalizado é, por quebra de sigilo despido de mandado judicial? Como bem disse o nobre presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Cezar Britto ” O agente público não pode gerir a coisa pública como se fosse um bem particular a seu bel-prazer “. Diante desse quadro temos apenas a certeza de que o modo petista de se fazer política muitas vezes se assemelha a conceitos processuais, mas por sorte, não exercidos por operadores do mundo jurídico e sim por amadores de pouco conteúdo ético. Mas a pergunta que me mais intriga é a inicial: Seria mesmo a Dilma, a ” Mãe do Pad ” ( produção antecipada de dossiê) ? Bem, isso terão que provar.
Fernando Rizzolo