Plutarco afirmava que “o desequilíbrio entre ricos e pobres é a mais antiga e a mais fatal das doenças das repúblicas”. Os problemas que resultam dessa convivência, e particularmente a questão da justificação da boa sorte de alguns face à má sorte de outros, são uma preocupação intelectual que atravessa o tempo. Continua sendo atual.
Poderíamos até fazer uso da Bíblia para fundamentar a essência desse pensamento: os pobres sofrem no mundo dos vivos, mas é certo que eles serão magnificamente recompensados no reino dos mortos. Esta solução admirável permite que os ricos gozem de sua riqueza ao mesmo tempo em que invejam os pobres pela boa fortuna que estes terão quando chegarem “ao lado de lá”.
Através dos anos várias foram as formas da sociedade lidar com essa culpa, uma delas era a de culpar os pobres pelo seus desígnios. Um dos mais proeminentes ” pensadores” nesta área, foi o pastor anglicano Thomas Robert Malthus (1766-1834): se os pobres são pobres, é culpa deles isso se deve à sua fertilidade exagerada, já na na metade do século XIX, uma nova fórmula de negação chegou a ter grande sucesso, particularmente nos Estados Unidos: o “darwinismo social”, associado ao nome de Herbert Spencer (1820-1903). Para ele, tanto na vida econômica como no desenvolvimento biológico, a regra suprema era a sobrevivência dos mais aptos.
Infelizmente no Brasil ainda exercitamos mecanismos para aliviar essa culpa, que por muitas vezes saltam aos olhos face às argumentações adotadas para justifica-las. Vivemos num País onde as diferenças existem, promovidas pelo próprio Estado que deveria ser um agente de distribuição de renda e oportunidades à imensa maioria pobre, no entanto investidas no âmbito do ” darwinismo social” ainda subsistem em diferentes aspectos da nossa sociedade, inclusive no Direito.
Não poderíamos deixar de relatar o que ocorre atualmente na Justiça brasileira, onde muito embora as decisões tenham cunho técnico, algumas por unanimidade até corporativa, ganham notoriedade. A utilização do instituto do Habeas-Corpus com a finalidade de frustrar a prisão temporária ou preventiva – como no caso do banqueiro Daniel Dantas – quando segundo informações, estão consubstanciadas em provas robustas, que por si preenchem os requisitos da aplicação das mesmas, faz com que aos olhos da população pobre, a Justiça se desmoralize.
Com efeito, a decisão do presidente do STF, ministro Gilmar Mendes em relação à operação Satiagraha, na concessão do HC, ainda com a efetiva determinação de punir o juiz de primeira instância, fez com que mais de 130 juízes federais de São Paulo e Mato Grosso do Sul divulgassem uma carta de apoio ao referido juiz federal da 6ª Vara, Fausto Martin De Sanctis, responsável por ter expedido o pedido de prisão do banqueiem questão, o que gerou sim uma disputa jurídica em relação ao caso. A rebelião da toga nasceu espontaneamente e criou uma verdadeira insurgência contra os atos do então ministro Gilmar Mendes.
O apoio foi também reafirmado por Quarenta e dois procuradores da República que divulgaram uma carta aberta à sociedade brasileira, na qual lamentam a decisão do presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes no habeas corpus que tirou o banqueiro Daniel Dantas da prisão pela primeira vez, no dia 9 de julho, trazendo ao debate jurídico, no entender dos procuradores, o ” foro privilegiado à membros da elite brasileira”.
O mundo jurídico vive sim um momento de apreensão, começamos a observar a indignação de Juízes, de membros do Ministério Público, de Delegados de Polícia Federal, e de renomados advogados como Dalmo Dallari e tantos outros, no sentido de questionar o STF na interpretação penal mais branda aos ricos do que aos pobres no Brasil, que somam mais de 45 milhões de pessoas que vivem abaixo da linha de pobreza.
Fica patente que a explicação e a argumentação de alguns, de que os pobres ficam presos porque não possuem advogados bons, e de outras tristes justificativas, nos remetem a reflexões e pensamentos elitistas datados de 1766, como acima me referi. Temos que redesenhar o Brasil, num caminhar em direção a um Brasil justo, um País participativo, igualitário, onde acusados quer sejam ricos ou pobres tenham tratamento igualitário, sem justificativas anglicanas como as do pastor Thomas Robert Malthus (1766-1834) , tampouco argumentações “darwinistas spencerianas”; para que no mínimo, a indignação não afete tanto a nossa consciência de culpa que já é grande. A nós nos cabe enfim, apenas comentar, até porque decisão judicial tem por princípio não se discutir e se rebelar, mas cumpri-la na íntegra.
Fernando Rizzolo
09/09/2009 às 10:39 AM
Muito boa matéria gostei, o maior problema do Brasil é essa diferença da justiça em relação com os pobres e ricos, essa desigualdade social, onde ha essa capacidade de pessoas que chegam a o STF e cometem tipos de descriminação. Projetamos os nossos olhos na base “a educação” porem pessoas formadas e corruptas, onde e quando nossos jovens vão ver exemplos nesse país?