Esvaziando os barris da Petrobras

artigo de Fernando Rizzolo para Agência Estado Broadcasting, publicado em 15 de agosto de 2008

Foi durante um caloroso discurso no Aterro do Flamengo, no Rio, que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva pediu apoio a estudantes para fazer mudanças na Lei nº 9.478/97, a Lei do Petróleo. Falou sobre os pobres, sobre a educação e sublinhou o fato de que “o povo precisa decidir o destino do petróleo. O petróleo brasileiro não pode ficar na mão de meia dúzia de empresas. Ele é do povo brasileiro”, disse Lula.

Numa tentativa de reeditar a “Campanha do Petróleo é Nosso”, organizada em 1947, o presidente Lula tentou, através de um discurso político e popular, estabelecer novas normas em relação a Lei do Petróleo, e mais, além de mencionar que a educação deveria ser beneficiada com os recursos da extração, defendeu um novo marco regulatório para o petróleo, quando mencionou a intenção de criar uma nova estatal.

O que com certeza não ficou claro é até que ponto o governo asseguraria o cumprimento das regras do jogo prevalecente por hora. Podemos inferir nas afirmações do presidente – e isso não ficou devidamente claro – que até mesmo nas áreas sob concessão, tanto a Petrobras quanto as demais exploradoras de petróleo poderiam estar subordinadas a essa nova estatal. Evidentemente, a criação desta nova estatal, que ainda não está bem clara em relação às suas atribuições, passa por uma questão mais política do que propriamente de gestão nos recursos da extração do mineral.

Vale ressaltar e sem o prejuízo do objetivo original – proporcionar uma maior arrecadação para fins sociais – que já existem formas de maximizar a receita a sociedade, vez que o decreto que regulamenta a participação especial (taxa cobrada sobre campos de alta produtividade) contempla as devidas alterações, ou seja, bastaria alterar o decreto das participações especiais impondo novas e maiores alíquotas e licitar tudo. O decreto na sua essência já foi instituído dessa forma e leva em consideração eventuais mudanças. Ademais, através da promoção de licitações, somente com o bônus de assinatura do leilão o Brasil poderia arrecadar bilhões de reais.

Mas o cerne da questão não passa apenas pelo viés arrecadatório. Lula teme uma Petrobras excessivamente poderosa e não deseja que aconteça com a Petrobras o mesmo que ocorreu com a estatal venezuelana, a PDVSA, cuja diretoria foi acusada de conspirar contra o presidente Hugo Chávez culminando na crise de 2003, em que Chávez se viu obrigado não só a destituir toda a diretoria, mas também os 18 mil funcionários da PDVSA. O problema crucial é a constituição dessa nova estatal sem antes ao menos começarmos a exploração, que está prevista para de 2010.

De qualquer forma, o que observamos é que ainda há pouca discussão no tocante ao gerenciamento dos recursos advindos da extração do petróleo, principalmente, àqueles para fins de viabilizar os nobres projetos sociais que originalmente sensibilizaram os estudantes da Une no Aterro do Flamengo. Talvez a criação da nova estatal seja mais interessante do ponto vista político, porque traz a simpatia do poder da gestão estatal e esvazia de certa forma os barris da Petrobras e seu poder, evitando o que ocorreu com Chávez, já conhecido por suas experiências com a PDVSA.

Resta-nos, enfim, e aos estudantes, um grande circo regado a petróleo, petróleo esse altamente inflamável, tão inflamável quanto os discursos sobre o assunto no Aterro do Flamengo.

Fernando Rizzolo

Fatores externos fazem inflação recuar, não os juros de Meirelles

Assim com aumentaram, os preços dos alimentos caíram pela ação dos especuladores em Chicago

A queda geral da inflação, confirmada por todos os índices, impõe, necessariamente, uma conclusão: “esse recuo da inflação nada tem a ver com os aumentos da taxa básica de juros conduzidos pelo Banco Central desde abril”, como disse em uma de suas análises o Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI), uma entidade de empresários. Ou, nas palavras do ex-ministro Delfim Netto – “Uma coisa é certa: se a inflação voltar à meta de 4,5% no início de 2009 não será devido à ‘tempestiva precipitação’ [do BC], mas a fatores externos, a não ser que seja o aumento de juros no Brasil que está derrubando o preço das ‘commodities’ em Chicago…”.

Delfim refere-se à última ata do Comitê de Política Monetária do BC (Copom), onde se diz que “a estratégia adotada visa trazer a inflação de volta à meta central de 4,5% tempestivamente”. Em seguida, afirma-se que o aumento de juros só agirá sobre a inflação no fim deste ano e no início do próximo.

O aumento localizado da inflação teve origem externa. A queda atual, também. Os aumentos de juros do BC tiveram como efeito perturbar o crescimento e promover um charivari no câmbio, prejudicando o saldo comercial, portanto, as contas externas. Mas eles nada tiveram a ver com a queda da inflação. Têm a ver com a drenagem de recursos do Tesouro para os bancos, principalmente os externos, via juros – além da intenção de facilitar a vida dos tucanos na eleição de 2010, freando o crescimento implementado pelo presidente Lula.

O preço dos alimentos – principal setor onde houve aumento da inflação – começou a cair porque os especuladores, centralizados na Bolsa de Chicago, começaram a se livrar dos papéis lastreados neles, por medo de que daqui a pouco não possam vendê-los por preço maior do que aquele pelo qual os compraram.

A especulação nas “bolsas de futuros”, onde se aposta qual será o preço de tal ou qual alimento depois de um determinado prazo, tem sido um dos principais, senão o principal fator que tem catapultado esses preços para o espaço sideral, já que nesse cassino jogam os próprios monopólios que dominam o comércio mundial desses produtos, assim como os bancos vinculados a eles.

A queda dos preços que se verifica no momento corresponde à banal lógica da especulação: compram-se títulos quando seus preços estão baixos para vendê-los quando seus preços atinjam o máximo possível. O problema é que ninguém sabe por antecipação quando é o momento do “preço máximo”, porque especuladores não são adivinhos. Mas se alguns desconfiam que chegou esse momento, ou está próximo, começam a vender seus papéis – e os colegas de ofício os acompanham, apavorados com a perspectiva de serem os últimos, ou seja, de ficarem com o mico na mão sem ter a quem vendê-lo ou tendo que vendê-lo abaixo do preço pelo qual foram comprados.

Daí a queda atual nos preços dos alimentos, depois de uma contínua alta nos últimos anos – e principalmente nos últimos meses, após a erupção da crise norte-americana das hipotecas, quando muitos especuladores fugiram dos títulos lastreados nelas, querendo compensar as perdas com os papéis lastreados nos alimentos.

Assim são, enquanto o país não estabelecer mecanismos de proteção, as elevações e quedas da especulação mundial – a manipulação dos especuladores faz com que os preços se elevem e depois caiam, com alguns se dando bem e a maioria se retirando, provisória ou permanentemente, para a rua da amargura. Aliás, numa dessas Meirelles foi “aposentado” da presidência do BankBoston, depois que, na crise argentina de 2001, deixou o banco e seus clientes ficarem com o mico na mão. Mesmo com De la Rua fazendo jus ao seu nome, ele achava que tudo voltaria a ser como dantes na grande nação do Prata…

CARLOS LOPES
Hora do Povo

Rizzolo: O excelente texto do jornalista Carlos Lopes, desnuda o que realmente ocorre com a questão inflacionária no Brasil. Não resta a menor dúvida que o componente externo é sim o fator preponderante na queda da inflação, de fato, os especuladores da Bolsa de Chicago, começaram a se desfazer dos papéis vinculados a algumas commodities relacionadas aos alimentos, fazendo o preço cair. A política monetária do Banco Central serviu apenas para emperrar ainda mais o desenvolvimento do País e de certa forma contribuir para uma maior especulação interna, alem de criar obstáculos às exportações face ao real valorizado. O mais interessante é o silêncio de Meirelles e do Copom desde que a inflação começou a ceder.

Charge do Angeli para a Folha de São Paulo

Esquerda da América Latina festeja posse de Lugo no Paraguai

ASSUNÇÃO – O ex-bispo Fernando Lugo toma posse na sexta-feira como presidente do Paraguai, numa cerimônia que terá a presença dos principais líderes esquerdistas da América Latina.

Lugo, cuja formação política está ligada à Teologia da Libertação e à luta dos sem-terra, encerrou 61 anos de hegemonia política do Partido Colorado ao ser eleito presidente, em abril, com 40 por cento dos votos.

Na véspera da posse, milhares de seguidores foram a um ginásio da capital para ver um discurso em que ele prometeu não elevar o próprio salário.

“Assim que Lugo começar a mudar as coisas os ataques vão começar. Mas graças a Deus temos o apoio do nosso povo. Novos ventos estão soprando na América Latina, que realmente vive uma nova era”, disse o presidente esquerdista do Equador, Rafael Correa, ao desembarcar em Assunção na quinta-feira.

O boliviano Evo Morales declarou que Lugo é um “irmão” que faz parte das transformações na região. O venezuelano Hugo Chávez, outro expoente da esquerda latino-americana, também deve assistir à posse.

Embora Lugo prometa governar para os pobres, ele se diferencia de Chávez e aliados por adotar um tom mais conciliador em relação à iniciativa privada e por prometer menos intervenção estatal na economia.

O brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva e a argentina Cristina Kirchner também devem comparecer à cerimônia. Já os presidentes mais conservadores da região –Alan García (Peru), Álvaro Uribe (Colômbia) e Felipe Calderón (México)– devem apenas enviar representantes.

Para permitir a posse de Lugo, o Vaticano aceitou com relutância revogar o seu “estado clerical”.

Eleito com 40 por cento dos votos em turno único, Lugo chega ao poder cercado por grandes expectativas, mas terá de enfrentar enormes desafios –especialmente a corrupção, endêmica no país.

O problema é tão grave que Lugo diz ter tido dificuldades em encontrar um diretor de alfândegas, epicentro da indústria paraguaia do contrabando. Uma pessoa convidada para o cargo sofreu ameaças de morte, segundo o novo presidente.

O Nobel de Economia norte-americano Jospeh Stiglitz dá consultoria ao novo governo e sugeriu a Lugo que taxe as exportações de soja e carne em 15 por cento, para melhorar a arrecadação fiscal.
Agência Estado

Rizzolo: Às vezes fico realmente em dúvida se estes governos que se dizem de “esquerda”, usam o dialeto esquerdista para tomar o poder para que depois acabem sorrindo para a direita, ou se no fundo, tudo isso é não uma tática marxista. Tomam o poder a estratégica ” violino”, ou seja, “tomam com a esquerda, e tocam com a direita”, o problema são os grupos que circundam estes governos de esquerda, que evidentemente começam a cobrar posições, como no caso brasileiro.

A verdade é que existe na América Latina um certo ” ar charmoso” bem latino, coisa antiga da década de 50,de que ser de esquerda é ” chique”. Detesto radicalismos, já li toda obra de Marx, durante anos ” O Capital” e outros, foram meus livros de cabeceira, coisa que muito comunista nunca fez, li tudo sobre Leon Davidovtich Trostsky, fiz uma incursão também ao trotskismo, coisa que muito comunista também nunca fez, estive nas favelas da Venezuela e fui um dos primeiros brasileiros a ser convidado a conhecer o que é o chavismo, oportunidade e convite que muitos dos que apóiam Chavez nunca foram ou receberam.

Hoje não me considero nem de direita tampouco de esquerda, sou racional, frio, sigo a uma lógica judaica de enxergar o mundo. Defendo os EUA? Sim, em muitas coisas, nem todas. Existe algo de bom nos governos de esquerda? Sim, nem tudo. Racionalismo, lógica, discernimento, desapego, cultura, só assim a esquerda e a direita brasileira e da América Latina vão crescer. O resto é pura bobagem, o resto é seguir os outros que estão completamente perdidos do ponto de vista ideológico.