Moralidade: a única coisa que os mercados não fazem

*Por Rabino Chefe da Inglaterra, Prof. Dr. Jonathan Sacks

As contínuas notícias sobre pensões benefícios excessivos, salários e bônus para pessoas no topo provocam em nós uma vontade de jogar o mais antigo dos esportes: a busca por um bode expiatório. Porém elas deveriam nos levar a refletir mais profundamente sobre os valores da nossa cultura como um todo.

Com frequência, nos últimos meses, tenho voltado a uma das mais dolorosas conversas que jamais tive. Foi com um dos maiores industriais britânicos. Ele tinha levado sua empresa a um sucesso consistente durante décadas. Quando o encontrei, tinha se aposentado e estava perto do fim da vida.

Ele não era um homem religioso, mas tinha um profundo senso moral. Falava sobre os princípios que o tinham guiado nos negócios e sobre o salário que recebia. Não era desprezível, mas era modesto. O que o incomodava era que seu sucessor tinha conquistado um salário dez vezes maior que o dele, enquanto sistematicamente destruía a empresa que ele tinha construído com tanto cuidado.

Lembro-me de outra conversa com um bem-sucedido banqueiro de investimentos. Ele me contou que a primeira coisa que precisou estabelecer foi seu caráter, sua reputação como confiável e honesto. Sem isso, ele teria sido incapaz de fechar negócios. Atualmente, disse ele, os acordos não dependem mais do caráter, mas dos advogados.

Comum a essas histórias é o desaparecimento gradual do conjunto de costumes que atendiam pelo nome de moralidade. Qualquer que fosse a sua fonte – religião, consciência, costume ou código – significava que existem certas coisas que você não faz porque elas não devem ser feitas. Você não recompensa a si mesmo quando fregueses, clientes, acionistas ou empregados estão sofrendo perdas. Você não paga a si mesmo de maneira desproporcional àquela que paga os outros. Não tira vantagem do seu cargo apenas porque pode fazê-lo. Você se guia, mesmo que não haja ninguém olhando, por um senso daquilo que é responsável e correto. Sem aquele código interiorizado de honra e confiança, nenhuma instituição pode ser sustentada a longo prazo.

De alguma forma, entre os 1960s e os 1980s, prevalecia a ideia de que podíamos viver sem o senso moral. Quem precisava mais daquilo? Nos 1960s pensávamos que o Estado cuidaria dos nossos problemas. Nos 1980s pensávamos que o mercado cuidaria deles. Restrições auto-impostas eram disseminadas como fora de moda e estraga-prazeres. A ganância era boa. O cara que tivesse mais brinquedos quando morresse, era o vencedor.

O resultado foi que começamos a perder nossa compreensão sobre a distinção vital entre o valor das coisas e seu preço. O principal exemplo – no coração de todo o colapso financeiro – foi a habitação. O valor de uma casa é porque ela é uma casa. É um abrigo, um porto seguro, um espaço pessoal num mundo impessoal. Para muitos, é onde mantemos um casamento e construímos uma família. É onde o amor encontra sua habitação e seu nome.

A certo ponto no tempo, alguns começam a pensar nas casas não como lares, mas como investimentos de capital. Começam a pedir mais dinheiro emprestado e a gastar mais. Construir sociedades torna isso uma obrigação.

Os preços das casas continuaram subindo. Sua atração como investimento cresceu, e assim o ciclo continuou se alimentando: preços cada vez maiores, hipotecas cada vez mais altas, até que os preços das casas e dos empréstimos perderam toda a conexão com a renda média e com a sustentabilidade. Aqueles que queriam apenas um lar não tiveram outra escolha exceto entrar no jogo, com grande custo e risco. Os especuladores estavam convencidos de que tinham se tornado mais ricos, porém em termos reais não tinham. O valor da habitação não tinha mudado nem uma vírgula, porque valor não é o mesmo que preço.

Estava fadado ao colapso, e qualquer um que tenha pensado a respeito, confirmou isso. O investidor Warren Buffet desde 2002 chamava as hipotecas de “armas financeiras de destruição em massa”. Na loucura coletiva, ninguém lhe deu ouvidos.

Após o colapso financeiro muitas perguntas estão sendo feitas. Deveria haver mais regulamentos? O Estado deveria ser o proprietário de instituições financeiras? Chegamos ao fim da economia de mercado? São boas questões, mas não chegam perto do âmago do problema.

A economia de mercado tem gerado mais riqueza real, eliminado mais pobreza e liberado mais criatividade humana que qualquer outro sistema econômico. O defeito não está no mercado, mas na ideia de que o mercado por si só é tudo que precisamos.

Os mercados não garantem igualdade, responsabilidade ou integridadde. Eles podem maximizar o lucro a curto prazo ao custo da sustentabilidade a longo prazo. Não podem distribuir recompensas de maneira justa. Não garantem honestidade. Quando se trata de auto-interesse flagrante, eles combinam o máximo de tentação com o máximo de oportunidade. Mercados precisam de moral, e a moral não é feita pelos mercados.

Ela é feita por escolas, pela mídia, costumes, tradição, líderes religiosos, modelos de moral e pela influência das pessoas. Porém quando a religião perde sua voz e a imprensa idolatra o sucesso, quando certo e errado se tornam relativos e a moralidade é condenada como “julgadora”, quando as pessoas perdem todo o senso de honra e vergonha, quando não há nada que elas não façam se puderem se safar daquilo, nenhum regulamento pode nos salvar. As pessoas vencerão os reguladores, como fizeram pela securização do risco de forma a ninguém saber quem devia para quem.

A grande questãi é: como aprendemos novamente a sermos morais? Os mercados foram feitos para nos servir; não somos nós que devemos servir aos mercados. A economia precisa de ética. Os mercados não sobrevivem somente pelas forças de mercado. Dependem do respeito pelas pessoas afetadas pelas nossas decisões. Se perdermos isto, perderemos não apenas dinheiro e empregos, mas algo ainda mais significativo: liberdade, confiança e decência, as coisas que têm valor, mas não têm preço.

Fonte: site do Beit Chabad

Tenha um sábado de paz e uma boa semana.

Fernando Rizzolo

Por maioria, Supremo decide derrubar a Lei de Imprensa

O STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu nesta quinta-feira (30), por maioria, derrubar a Lei de Imprensa. Sete ministros seguiram o entendimento do relator do caso, Carlos Ayres Britto, de que a legislação é incompatível com a Constituição Federal. Três foram parcialmente favoráveis à revogação, e apenas o ministro Marco Aurélio votou pela manutenção da lei.

Com a decisão do STF, o relator considera que, nos casos em que for cabível, será aplicada a legislação comum, como o Código Civil e o Código Penal.

A ação contra a lei 5.250 foi ajuizada pelo PDT (Partido Democrático Trabalhista). O julgamento começou no dia 1º de abril, quando o relator, ministro Carlos Ayres Britto, votou pela total revogação, argumentando que a lei, editada em 1967, durante o regime militar (1964-1985), é incompatível com a Constituição Federal de 1988. O ministro Eros Grau acompanhou o relato

Um dos pontos de maior debate entre os ministros foi a questão do direito de resposta. O presidente do STF, ministro Gilmar Mendes, fez a defesa mais contundente pela manutenção dos dispositivos da Lei de Imprensa relativos ao tema. “Vamos criar um vácuo jurídico em relação aquele que é o único direito de defesa do cidadão, a única forma de equalizar essa relação, que é desigual”, afirmou.

“Por que considerar a Lei de Imprensa totalmente incompatível com a Constituição Federal? A liberdade de imprensa não se compraz com uma lei feita com a intenção de restringi-la”, afirmou o ministro Menezes Direito, primeiro a votar hoje, seguindo o relator. “Nenhuma lei estará livre de conflito com a Constituição se nascer a partir da vontade punitiva do legislador.”

“Trata-se de texto legal totalmente supérfluo, pois se encontra contemplado na Constituição”, disse o ministro Ricardo Lewandowski. Também votaram nesse sentido os ministros Cesar Peluzo e Cármen Lúcia.

Inicialmente ausente, o ministro Joaquim Barbosa participou de sua primeira sessão após o bate-boca com o presidente da Corte, Gilmar Mendes. Barbosa, a ministra Ellen Gracie e Gilmar Mendes votaram pela revogação parcial, defendendo que alguns artigos sejam mantidos, entre eles trechos relacionados à proteção da honra, à proibição de propaganda de guerra e direito de resposta.

O representante da ANJ (Associação Nacional de Jornais) se disse preocupado com a mesma questão. Para Paulo Tonet Camargo, diretor de Relações Governamentais da entidade, uma regulamentação em relação ao direito de resposta daria conforto aos cidadãos e aos órgãos de imprensa, impedindo que cada juiz se decida de uma forma diferente.

folha online

Rizzolo: É uma vitória sem dúvida, contudo há necessidade de se regulamentar o direito de resposta e as eventuais indenizações. No tocante ao dano moral, existe o preceito da proporcionalidade do agravo, e da capacidade econômica do agente. Com certeza tal matéria será apreciada no legislativo para que não exista um ” vácuo” legal dando margens a injustiças.