Bush injeta US$ 200 bi na economia para conter crise nos EUA

WASHINGTON – O Departamento do Tesouro norte-americano anunciou neste domingo, 7, que assumiu o controle de duas gigantes hipotecárias Fannie Mae e Freddie Mac e pode destinar até US$ 100 bilhões a cada uma a fim de conter a crise no sistema financeiro do país. O socorro à economia visa a sustentar o mercado imobiliário à medida que muitos clientes vêm atrasando o pagamento de suas hipotecas.

Segundo o presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, a medida é “temporária” e foi necessária porque as empresas representam “um risco inaceitável” para a economia. “Colocar essas companhias em condições financeiras sólidas e reformar suas práticas comerciais é critico para a saúde do nosso sistema financeiro”, afirmou Bush em comunicado.

As duas empresas são cruciais no mercado imobiliário americano, já que juntas são responsáveis pela metade de todas as hipotecas dos Estados Unidos e foram fortemente atingidas pela crise no setor. A Freddie Mac e a Fannie Mae anunciaram recentemente perdas de bilhões de dólares.

Os mais altos executivos das empresas perderam sua posição. O executivo-chefe da Freddie Mac, Richard Syron, e o executivo-chefe da Fannie Mae, Daniel Mudd, foram substituídos por David Moffett, um alto executivo do US Bancorp, e Herb Allison, antes na Merrill Lynch e no fundo de pensões TIAA-CREF. Além disso, o Tesouro terá controle acionário imediato de US$ 1 bilhão em cada empresa, na forma de ações preferenciais.

As ações preferenciais do governo terão um valor maior do que as ações atuais, preferenciais ou comuns, e terão garantias que darão ao governo uma fatia de 79,9 por cento da empresas.

O Tesouro também desenvolveu um programa sob o qual comprará títulos garantidos por hipotecas atualmente nas mãos da Fannie Mae e da Freddie Mac, para injetar novo capital no mercado de hipotecas. Essa medida será tomada no fim deste mês, e o governo terá autoridade para realizar essas aquisições até 31 de dezembro de 2009.

O secretário do Tesouro, Henry Paulson, disse que a Fannie Mae e a Freddie Mac são tão grandes que “a falência de uma delas causaria uma crise imensa em nosso mercado financeiro doméstico e nos mercados mundiais”.

A intervenção foi planejada em conjunto pelo Departamento do Tesouro dos EUA e pela Agência Federal de Financiamento de Habitação. A agência vai atuar como “conservadora” das duas empresas, tomando o controle de suas operações diárias. A agência afirmou que não tem um “período exato” para esse sistema acabar e que o poder dos acionistas das empresas será suspenso até que este momento chegue.

Agência Estado

Rizzolo: A medida veio em boa hora, aliás isso demonstra que a famosa ” falta de regulamentação do mercado” ou a liberdade para deixar o mercado sem a mínima intervenção do Estado, realmente não funciona. A questão das ” subprime” serviu de certa forma de ” lição” ao governo americano que ” as forças do mercado” precisam sim serem monitoradas, delimitadas até porque a sede de lucro, ou melhor, a irresponsabilidade de alguns setores financeiros pode levar o País à bancarrota.

Agora, depois de todo o estrago, surge o governo. O mais interessante é que nos EUA se apregoava a mínima intervenção estatal, sem a mínima regulamentação do Estado, agora, depois que os irresponsáveis ” escancararam ” a economia, preconizam o socorro do ” velho Estado”. Melhor seria se deste o início ter havido maior regulamentação financeira.

Venda do Bear Stearns e temor sobre setor bancário derrubam Bolsas em NY

As Bolsas americanas operam em baixa nesta segunda-feira, após uma breve reação do índice Dow Jones Industrial Average (DJIA) pela manhã. Os investidores vendem principalmente seus papéis do setor financeiro, devido à venda do banco de investimentos Bear Stearns ao rival JP Morgan, por US$ 236 milhões.

Às 13h37 (em Brasília), o DJIA –principal índice da Nyse (Bolsa de Valores de Nova York, na sigla em inglês)– estava em baixa de 1,11%, com 11.818,55 pontos; o S&P 500, por sua vez, caía 1,97%, para 1.262,74 pontos. A Bolsa Nasdaq tinha queda de 2,1%, indo para 2.165,20 pontos.

A venda do Bear provocou o temor entre os investidores de que o sistema bancário –e mesmo o sistema financeiro de modo geral– possam estar em situação mais frágil que o previsto. O Federal Reserve (Fed, o BC americano), inclusive, aprovou ontem uma linha de crédito de US$ 30 bilhões para financiar a compra

O Fed também aprovou um programa de empréstimos para as maiores empresas de investimentos em Wall Street e cortou sua taxa de redesconto para 3,25% ao ano.

A taxa de redesconto é um instrumento do Fed para conceder empréstimos de curto prazo a instituições com problemas temporários de liquidez (oferta de dinheiro). O instrumento, no entanto, é utilizado com cautela pelas instituições financeiras: as que recorrem a empréstimos com essa taxa ficam de certo modo marcadas como instituições fragilizadas, que não conseguem empréstimos em outras fontes e têm de recorrer ao ‘concessor do último recurso’ –papel que cabe ao Fed.

“Isso remove o risco de mais perdas para esse setor –o risco de que algo como o que aconteceu com o Bear Stearns ocorra de novo”, disse à agência de notícias Associated Press (AP) o gestor de carteiras Robert Pavlik, da Oaktree Asset Management.

Amanhã o Fomc (Comitê Federal de Mercado Aberto, na sigla em inglês, equivalente ao Copom no Brasil) do Fed deve se reunir e decidir sobre sua taxa de juros, atualmente em 3% ao ano. A expectativa dos analistas é de que o banco mantenha sua política de cortes de juros e reduza a taxa em ao menos 0,75 ponto percentual.

O Fed reduziu sua taxa em cinco ocasiões consecutivas, entre setembro do ano passado e janeiro deste ano, como forma de tentar impedir que a economia americana caia em recessão.

O JP Morgan irá pagar US$ 2 por ação do Bear Stearns –para se ter uma idéia do que isso significa, os papéis do Bear não eram cotados abaixo dos US$ 20 desde 1995. “Alguns participantes mais fracos do mercado empurrados para fora dos negócios”, disse o diretor de investimentos Joseph Battipaglia, da Ryan Beck, à AP.

As ações do Bear Stearns chegaram a cair pouco mais de 87% hoje; as ações do banco, que encerraram a sexta-feira (14) cotadas a US$ 30, hoje pouco passam dos US$ 3.

Também preocupa os investidores a situação do Lehman Brothers Holdings; o banco de Cingapura DBS Group Holdings orientou seus operadores hoje a desconsiderarem novas transações com o Lehman –que deve divulgar seus resultados trimestrais nesta semana–, segundo a AP.

Hoje o governo divulgou dois indicadores que ficaram um pouco à margem dos acontecimentos do dia, diante do ocorrido no setor bancário. O Federal Reserve de Nova York informou que seu índice Empire State –que mede a atividade manufatureira no Estado– registrou em março o nível mais baixo desde que começou a ser elaborado, em julho de 2001.

O índice sobre as condições gerais da atividade manufatureira em Nova York ficou em -22,23 pontos em março, frente aos -11,72 pontos do mês anterior, e ficou muito abaixo da previsão dos analistas.

Hoje também o Departamento do Comércio informou que o déficit em conta corrente dos EUA no ano passado recuou 9% em relação ao registrado um ano antes, para US$ 738,6 bilhões, depois de ter atingido a marca recorde de US$ 811,5 bilhões em 2006. O balanço em conta corrente é uma medida mais ampla que a balança comercial do país, porque abrange não apenas o comércio de bens e serviços, mas também transferências unilaterais –que incluem recursos destinados a ajuda internacional.

Folha online

Rizzolo: A origem de toda essa crise foi a falta de regulamentação e a irresponsabilidade dos agentes financeiros americanos na questão dos “subprimes”. O sistema financeiro americano não é devidamente monitorado; especuladores de toda sorte, especialistas em ” fazer dinheiro rápido” optaram pelo setor imobiliário americano no oferecimento de crédito a um enorme contingente de tomadores que eram na sua maioria insolventes. O corte nas taxas de juros efetuado pelo FED não foi o suficiente para estancar a crise, mesmo agora cortando a taxa de redesconto para as maiores empresas de investimento em Wall Street para 3,25% ao ano, poderá deixar ainda mais claro quais são as empresas que lançam mão da medida, e trazer mais insegurança ao mercado. O mais interessante em toda essa questão é o fato de que no capitalismo dos EUA a tudo é permitido fazer no mercado com a menor intervenção possível do Estado regulador, agora, quando as perdas surgem e nada dá certo, quem salva é o Estado. Esse Estado que o capitalismo abomina.

BC dos EUA promove segundo corte nos juros em nove dias

O corte agora foi de 0,5% e a taxa básica caiu para 3%. Já o pacote anunciado por Bush, de US$ 150 bilhões, dará um cheque de restituição de US$ 600 a cada contribuinte que declare até US$ 75.000 no IR, mais US$ 300 por filho menor

Na tentativa de conter a crise nos bancos, corretoras e seguradoras, e a recessão, o banco central dos EUA, o Federal Reserve, voltou a cortar na quarta-feira 30 de janeiro, pela segunda vez em nove dias, a taxa básica de juros, que agora caiu para 3%. O corte de 0,5% na reunião regulamentar do Fed de janeiro, foi o dobro do que vinha sendo previsto pelos bancos. No corte anterior, decidido, em caráter de emergência, em pleno feriado e por videoconferência, o Fed havia reduzido o juro básico em 0,75%, o maior corte de uma só vez em 25 anos. O BC dos EUA também cortou na quarta-feira em 0,5% a taxa de empréstimos entre bancos, a chamada taxa de redesconto, que caiu para 3,5%.

PACOTE

Noutra frente, o pacote anunciado por Bush, de US$ 150 bilhões – cerca de 1% do PIB dos EUA -, parece muito aquém do que a situação exige. O secretário do Tesouro de Bush, Henry Paulson Jr., teve que negociar com os democratas sua aprovação na Câmara dos Deputados. Pelo acordo, 116 milhões de pessoas receberão cheques de restituição de imposto de renda. Cada contribuinte que perceba até US$ 75.000 terá direito a US$ 600; US$ 1200 para o casal (teto de US$ 150.000 de renda), e mais US$ 300 por filho menor. O cheque-restituição será reescalonado a partir desse teto de US$ 75.000 de renda, e zerado a partir da renda declarada de US$ 87.000 (até US$ 150.000 o casal).

60 DIAS

O pacote inclui US$ 28 bilhões para que pessoas isentas do imposto de renda possam receber cheques de US$ 300. Temporariamente também será elevado de US$ 417.000 para US$ 729.750 o valor limite de hipoteca que poderá ser coberto pelas seguradoras Fannie Mae e Freddie Mac. Paulson afirmou que, assim que o Senado aprove, e Bush assine a lei, em “60 dias” os cheques estariam sendo enviados, possivelmente a partir de maio ou junho. Ele estimou em dez semanas o tempo necessário para enviar todos os cheques, isto é, antes das eleições de novembro. O pacote ainda terá que ser aprovado no Senado.

Mas há pouca gente que creia que essas medidas serão suficientes. Como assinalou a revista inglesa “The Economist”, a expectativa do governo dos EUA e do Fed de que a crise do estouro da bolha das hipotecas não iria se alastrar ao conjunto da economia se desfez em janeiro. Supõe-se que os rombos recordes do Citibank e da Merrill Lynch no último trimestre de 2007 tenham ajudado a clarear as idéias.

De acordo com uma compilação da BBC, as perdas até dezembro passado chegam a US$ 22,1 bilhões na Merrill Lynch, US$ 18 bilhões no Citibank, US$ 9,4 bilhões no Morgan Stanley, US$ 3,2 no Bear Stearns, US$ 3 bilhões no Bank of America, US$ 3,2 bilhões no JP Morgan Chase e US$ 1,1 bilhão no Wachovia. Os rombos devem ser ainda maiores, já que todo dia mais um mafuá com papéis bichados vai à lona, forçando a mais baixas contábeis nos ativos que os bancos diziam ter. Abalroados, o Citibank e a Merrill Lynch precisaram comunicar ao distinto público que estavam sendo socorridos por fundos soberanos de vários países, além de um príncipe saudita no caso do primeiro, em respectivamente, US$ 14 bilhões e US$ 6,6 bilhões.

Às más notícias se soma o anúncio do Departamento do Comércio, no início da semana, de que as vendas de casas novas despencaram 26,4% no ano passado, para 774 mil. Uma queda pior ainda do que a da crise de 1980 – quando encolheu 23,1%. Ainda segundo o Departamento, no ano passado os EUA tiveram o mais fraco crescimento do PIB desde 2002 – 2,2%. No último trimestre, o crescimento anualizado ficou em 0,6%. Também piorou o desempenho das exportações, ainda com crescimento, mas baixando de 19% no terceiro trimestre, para 3,9% no quarto trimestre, em relação a igual período do ano anterior, mesmo com a desvalorização do dólar pernate outras moedas.

Hora do Povo

Rizzolo: Todas as medidas para conter a crise imobiliária nos EUA foram tomadas à tempo pelo FED, além disso, o enfrentamento da mesma e suas medidas drásticas adotadas po Ben Bernanke, presidente do FED, foram chanceladas pelos conservadores dos EUA , inclusive por Alam Grinspum. Um fato preocupante , sem dúvida, é o anúncio do Departamento do Comércio, no início da semana, de que as vendas de casas novas despencaram 26,4% no ano passado, para 774 mil, esse dado com certeza nos leva a uma percepção da dimensão da crise. As medidas de incentivo ao consumo podem levar os EUA, se não houver uma fina dosimetria nos cortes das taxas de juros, a um aumento da inflação, que a meu ver já é esperada. Contudo já há quem detecte sinais incipientes de “estagflação”, ou seja, um período de ausência de crescimento associada à alta de preços.

Incluir os esquecidos gera crise ?

Ainda me lembro, quando na década de 70, sugia um filme que como se dizia na época era ” de cunho comunista” chamado ” A classe Operária vai ao Paraíso” do diretor italiano Elio Petri. Com pinceladas socilistas, retratava-se as manifestações de alienação dentro de uma fábrica e a precarização do trabalho que nela ocorre de forma generalizada; ainda estudante de Direito, imagina o dia em que literalmente os pobres iriam vivenciar o consumo, e sua conseqüências boas e ruins.

Na época, o mundo vivia uma fracionazação social entre ricos e pobres muito mais acentuada, o que propiciou as investidas da esquerda no ganho do terreno ideológico em muitos países, inclusive no Brasil. O que não poderíamos imaginar, é que a produção dos bens de consumo, surgiriam como um problema nos Estados socialistas a ponto de perturba-los, e num resumo das pregações leninistas, stalinistas e trotskistas, passassem a rever as relações com os meios de produção, abandonando de vez o socialismo, ou transformando-o, como a China o fez, num ” socialismo de mercado”. Com isso, agregado ainda aos que não sonharam tal sonho, como alguns países da América Latina, observou-se uma investida de forma contundente na inclusão por parte da população mais pobre desses países, no acesso aos bens de consumo.

Nem precisou os economistas se aterem aos estudos de Adam Smith, para logo se apropriarem da idéia de que só a produção e a capacidade de consumo de um povo, aumenta o bem-estar social; face a isso, iniciou-se um alavancamento dos meios de produção em países como a China e Índia, que passaram a fabricar manufaturados e consumir bens elevando e incluindo uma população gigantesca que outrora jamais tivera acesso ao mercado. Na euforia produtiva, os EUA passaram a investir mais na Ásia, e por conseqüência, importar mais produtos desses países consumindo o americano médio mais do que deveria.

Na corrida ao consumo, países emergentes passaram a ter políticas voltadas à inclusão social, com programas evolutivos que culminaram com a acessibilidade maior a tudo que, em tempos atrás, apenas uma pequena parcela tinha participação. Na imensa bolha de consumo mundial, surge o consumo desenfreado com o fácil crédito imobiliário americano, desregulamentado e arrebanhando os excluídos americanos do sonho da casa própria. O final da história já sabemos, crise americana que poderá se tornar mundial sem termos hoje, meios de saber sua intensidade.

Não há que se falar em ” descolamento”, se ela (crise) vier, teremos todos que enfrenta-la. Numa análise mais profunda, observamos que a partir do momento em que os pobres do mundo passaram de forma uníssona a consumir mais, surgiu uma crise, e fica a pergunta no ar: Seria a inclusão dos esquecidos um fator de geração de crises? Ou será que classe operária não tem espaço no capitalismo, para viver no paraíso.

Fernando Rizzolo

Paulo Nogueira Batista Jr: “Ansiedade e pânico nos EUA”

Aqui nos a situação econômico-financeira é tenebrosa, como se sabe. Imigrantes brasileiros, por exemplo, começam a retornar ou a planejar o retorno para casa. O diretor-gerente do FMI, Dominique Strauss-Kahn, declarou que a situação é “séria”. Muitos já perderam a esperança de que uma recessão possa ser evitada.

Por Paulo Nogueira Batista Jr*

Isso me faz lembrar uma história de Winston Churchill. Certa vez, quando ele era primeiro-ministro, Churchill teve um encontro com a sua contraparte da República da Irlanda. Os dois países enfrentavam grandes dificuldades na época.

Churchill disse ao primeiro-ministro irlandês que a situação da Inglaterra era “serious but not hopeless” (séria mas não desesperançada ou irremediável). E o irlandês respondeu, segundo relato de Churchill, que a situação no país dele era “hopeless but not serious”.

A situação atual dos EUA está mais para a da Inglaterra ou a da Irlanda de então? Difícil dizer. Os americanos talvez estejam pagando o preço econômico por ter conferido dois mandatos consecutivos a George W. Bush. Oito anos! Eis o resultado: em algumas áreas importantes da economia e do sistema financeiro, a superpotência acumulou ao longo desses anos indicadores dignos de uma república bananeira, como já tive ocasião de comentar nesta coluna.

O presidente do Federal Reserve, Ben Bernanke, ao depor na quinta-feira passada em uma comissão do Congresso, tinha a ansiedade estampada no rosto. O pacote de estímulo fiscal, cujas linhas gerais foram anunciadas pelo presidente Bush na sexta, foi considerado vago e insuficiente, desencadeando uma situação de quase pânico nos mercados financeiros internacionais. Em resposta, o Fed acabou antecipando em uma semana o corte de 0,75 ponto percentual que seria feito na reunião regular dos dias 29 e 30 – decisão pouco usual que demonstra o grau de preocupação da autoridade monetária.

O Fed está correndo atrás do prejuízo. As autoridades monetárias e fiscais subestimaram a extensão da crise e agora têm pouco tempo para agir. Reina uma certa afobação, tanto no Fed como no Executivo e no Congresso. A decisão de antecipar o corte de juros, por exemplo, pode ter impacto ambíguo, sobretudo quando tomada de afogadilho. Por um lado, o efeito é positivo – o Fed finalmente acordou para a gravidade da crise. Por outro, pode gerar mais insegurança – o que é que o Fed sabe que nós não sabemos?

A ansiedade dos responsáveis pela política econômica é compreensível.

É perigoso entrar em uma recessão com o sistema financeiro tão fragilizado e vários bancos importantes tão vulneráveis. A recessão, ao gerar dificuldades adicionais de pagamento para pessoas físicas e jurídicas, levaria a um agravamento dos problemas dos bancos e de outras instituições, colocando em risco a solvência do sistema financeiro. Por sua vez, o agravamento dos problemas financeiros realimentaria as forças recessivas, criando um círculo vicioso que pode ser difícil de quebrar mais à frente.

A insistência na urgente adoção de um pacote de estímulo fiscal (com aumentos de gastos e redução de tributos) também tem sua razões. O peso de evitar ou amenizar a recessão não pode recair exclusivamente sobre o Federal Reserve. Se tudo depender de diminuições adicionais da taxa de juro, o dólar ficará sob pressão nos mercados internacionais. A depreciação pode transformar-se em colapso, solapando a confiança no dólar como moeda internacional de reserva.

* Economista e diretor-executivo do FMI

Artigo publicado na edição desta quinta-feira (24) da Folha de S.Paulo

Rizzolo: O efeito ansiedade não é bom para a economia, contudo, não restou outra alternativa ao Federal Reserve a não ser as medidas tomadas às pressas. O fato de Bush estar tanto tempo na presidência, contribuiu para que sua política de beligerância se tornasse mais importante do que uma eventual regulamentação financeira, dentro do mercado americano. Especuladores do calibre de Soros admitem essa falha. Eu já não definiria que a situação não é “serious but not hopeless” ou “hopeless but not serious”, mas na verdade ” quite serious “. No tocante ao medo sobre o que pode acontecer, “Quem sabe teme. Quem sabe muito, não sai de casa. Quem sabe ainda mais, tranca-se no armário. Quem sabe demais, fica mesmo no cofre . ” ( risos..)

A preocupação é maior do que o corte de juros

Uma das características da atual crise americana que se iniciou com a questão dos ” subprimes”, é o fator confiança. A profundidade da eventual recessão americana é que o mercado se questiona. A obscuridade do problema face aos mercados globalizados, leva os investidores a uma análise, a meu, ver perfunctória da realidade, que pode ser maior ou menor do que tende a aparentar.

O mercado teme que a medida emergencial do banco central americano (BC) de cortar os juros básicos no país em 0,75 ponto porcentual, para 3,5% ao ano, não seja suficiente para estimular o sentimento em meio aos temores crescentes de recessão nos EUA e o tombo das bolsas européias e asiáticas nos últimos dois dias.

Não resta a menor dúvida que o problema é grave na medida em que difícil é mensurar ou quantificar a extensão da questão econômica americana. Além disso é importante salientar que a China possui uma boa quantidade dos chamados ” títulos podres” e que de certa forma também sera afetada pela crise.

Quando o Fed concretizou as apostas do mercado, deixou transparecer sua preocupação com a saúde da economia norte-americana. “O comitê tomou esta ação à luz do cenário de enfraquecimento econômico e aumento dos riscos de baixa para o crescimento”, disse o Comitê de Mercado Aberto do Fed, em comunicado. Isso fez com que o índice Dow Jones da Bolsa de Nova York abrisse o pregão em forte queda, ontem.

Na Europa, o comissário para Assuntos Econômicos e Monetários da União Européia, Joaquin Almunia, declarou que retração dos EUA não deve atingir diretamente o crescimento da zona do euro. Ele admitiu que a queda nas bolsas européias ontem mostrara “que os mercados estão considerando a possibilidade de uma desaceleração mais pronunciada, possivelmente, uma recessão, nos EUA”. Entretanto, disse, a UE não está tão vulnerável quanto no passado. “No passado, nossas economias eram mais dependentes da dos EUA”, disse Almunia.

No Brasil poderá haver um impacto sobre o preço das commodities, devido ao esperado enfraquecimento da economia global, e isso não seria nada bom face ao fato da nossa economia não deter uma produção de manufaturados estruturada, sendo vulnerável e dependente dos preços das mesmas, contudo, o que mais afetaria seria as exportações, o que seria compensado exatamente com investimentos de estrangeiros e brasileiros que estão interessados no aquecido mercado consumidor doméstico, que cresce a taxa superior a 10%. A primeira amostra disso deu-se ontem, após acumular perdas de quase 16%, a Bovespa (Bolsa de Valores de São Paulo) ganhou força e descolou das Bolsas americanas, sua principal referência externa. Vamos ver no que vai dar daqui para frente.

Fernando Rizzolo

Citibank anuncia rombo recorde de US$ 18 bi no quarto trimestre

O maior banco dos EUA divulgou também um prejuízo de US$ 9,8 bilhões.
Vai ainda realizar 21.000 demissões e corte de 41% nos dividendos

O Citibank, o maior banco dos EUA em ativos, anunciou um prejuízo de US$ 9,8 bilhões no último trimestre de 2007 – o maior da história – e confirmou um rombo de US$ 18 bilhões em perdas no ‘subprime”, isto é, na especulação hipotecária, e mais US$ 4,2 bilhões com empréstimos bichados. O novo presidente do Citi, Vikram Pandit, convocado às pressas em novembro passado, anunciou, ainda, mais 4 mil demissões, além das 17 mil já comunicadas no meio do ano, e um corte de 41% nos dividendos. As ações despencaram e as bolsas no mundo inteiro vêm acompanhando a derrubada.

E eis que o colapso da pirâmide com papéis podres de hipotecas arrasta de roldão o segundo banco da família Rockefeller – o outro é o Chase, agora fundido com o JP Morgan -, por décadas, o símbolo da arrogância imperial e da intromissão na economia alheia. O banco que presidia o “Comitê dos Bancos Credores” no achaque da crise da dívida externa dos países dependentes, e que, como notou o presidente Lula, se metia “a dar palpites sobre como administrar os países, as coisas”. “Quando chega a hora de mostrar a sua competência, eles mostram que não têm tanta competência quanto falavam”.

O rombo do quarto trimestre é recorde, mas não é o único. No terceiro trimestre de 2007, os resultados já haviam sido tão ruins que o então presidente, Charles Prince, no cargo desde 2003, caiu. O banco teve de admitir no dia 5 de novembro um rombo de US$ 11 bilhões nesse período. Mas em julho, quando já fazia mais de um ano desde que a bolha especulativa começara a estourar, Prince ainda asseverava que o Citi continuava “dançando o boom das aquisições”. Antes de ir ao chão, ainda filosofou sobre “significativa volatilidade de mercado” e “ruptura das relações históricas de preço”.

RUPTURA

A “ruptura das relações históricas de preço” era uma cínica referência ao fato de que os títulos-frankstein montados pelas operações de “engenharia especulativa”, para bancar empréstimos alavancados e a pirâmide das hipotecas, então tidos como “AAA”, do dia para a noite eram descobertos como “junk”, lixo. Por precaução, o Citi anunciou a demissão de Prince num domingo, antes que as bolsas abrissem. Agora em janeiro, a agência “Standard & Poor’s”, buscando se desvincular da fraude na determinação dos títulos subprime, rebaixou o Citi para “AA-” e apontou como “negativa” a tendência para o banco. Afinal, não eram a S&P, a Moodys e outras espeluncas que asseguravam que os títulos “junk” eram de primeirís-sima linha?

Muito tem sido escrito sobre a concessão de empréstimos sem critérios, a gente que não tinha como pagar. Mas não foram as pessoas que foram enganar os bancos, mas os bancos, as corretoras e todo tipo de espertalhão que montaram operações em larga escala para levar a população a adquirir os títulos bichados, botando sua casa no risco. Um analista comparou os “títulos” suprime a um porquinho pintado de batom, a que foi atribuído valor equivalente a um título do governo dos EUA, AAA.

Outro comparou com montar uma torta de camadas, em que várias delas são constituídas de lama, estrume e outras especiarias, mas que, como também tinha chantilly, virava um “título AAA”. Mas, a pirâmide com hipotecas é apenas o lado mais “extenso” da questão, porque paralelamente foram montados esquemas mais sofisticados, entenda-se, com um nível de fraude mais apurado. O tipo de “papéis” que dão suporte a uma avalanche de aquisições e fusões “alavancadas”. Por exemplo, a BBC afirmou que no dia 14 de dezembro o Citi encerrou sete operações “SIV” – tipo particularmente arriscado de derivativo -, no montante de US$ 48 bilhões.

PADROEIRO

Assim como na crise de 90-91, quando 500 bancos norte-americanos foram à lona e os demais se salvaram com a ajuda de São Greenspan, o santo padroeiro dos Rockefellers durante quase duas décadas, o Citi saiu à cata de socorro lá fora. Na época, um príncipe saudita compareceu com o dinheiro. Dessa vez, o Citi apelou, em novembro, para o sheik de Abu Dhabi, conseguindo US$ 7,5 bilhões. Conforme a coisa piorou, chamou o príncipe saudita de novo, que ampliou sua cota, e também o sheik do Kuwait e o governo de Cingapura, que estão aportando US$ 14,5 bilhões. Nada como ter uma frota armada nas imediações dos cofres amigos.

SONO DOS JUSTOS

Mas há muito chão até a fina flor da malandragem de Wall Street poder dormir sossegada. No dia 17 de julho do ano passado, uma das maiores corretoras de títulos dos EUA, a Bear Stearns, teve de comunicar aos seus clientes que dois de seus fundos, bancados por títulos subprime, de US$ 20 bilhões, não valiam mais nada. Em 9 de agosto, o banco francês Paribas interrompeu operações por “não ter como avaliar o preço” dos títulos. Havia meses que os bancos faziam de conta que nada estava acontecendo, mesmo após US$ 10 bilhões de perdas do HSBC. A crise causou um aperto de crédito, em cada banco temia realizar operações com o outro, convulsionou as bolsas no mundo inteiro e escancarou o estouro da bolha nos EUA. Desde então, praticamente todos os grandes bancos e corretoras dos EUA declararam rombos nas suas contas, assim como vários outros da Europa, que se envolveram na especulação ‘subprime’. Só nas vésperas de Natal, os bancos centrais liberaram mais de US$ 500 bilhões no mundo inteiro aos bancos comerciais, para mantê-los à tona.

INJEÇÃO

Quanto à injeção de capital no Citi, ainda há muito chão à frente. Como já assinalou a revista inglesa “The Economist”, “se há algo que deixa os grandes de Wall Street sem dormir, é a perspectiva das pontes irem ao colapso. Bancos que financiaram operações de aquisição [buy-outs] têm facilitado os acordos por tomarem dezenas de bilhões de doláres em débitos e ações ‘ponte’. O objetivo é dar baixa na contabilidade rapidamente repassando-os para investidores institucionais”. O que, conclui a revista, tem ficado “cada vez mais difícil de fazer”, conforme “os apetites por papéis altamente lucrativos mas de alto risco definham”. Como os demais mastodontes financeiros dos EUA, o Citi está entupido desse lixo tóxico.

ANTONIO PIMENTA
Hora do Povo

Rizzolo: A crise dos “subprimes” demonstra a vulnerabilidade do mercado americano onde especuladores fazem o que bem entendem sem a devida regulamentação do setor bancário. O mais interessante é que quando é para se fazer uso de empréstimos irresponsáveis, é a lógica do mercado que impera, contudo nas crises a tutela do Estado é apregoada, para enfim pagar a conta dos prejuízos causados pelos sedentos de lucros.

Como diz o texto, não foram as pessoas que foram enganar os bancos, mas os bancos, as corretoras e todo tipo de espertalhão que montaram operações em larga escala para levar a população a adquirir os títulos bichados, botando sua casa no risco. Com certeza o reflexo será sentido no Brasil, mas face ao mercado interno aquecido o efeito poderá ser brando. Até o tema das campanhas presidenciais americanas mudou, antes o foco era o Iraque, agora com certeza será a economia que poderá fazer e trazer tanto estrago quanto a guerra de Bush.

As taxas de juros e a crise americana

Antigamente dizia-se que “quando os EUA tosse, o mundo fica doente “, indubitavelmente, a irresponsável crise dos subprimes nos EUA, afetará de uma forma ou de outra a economia mundial. Muitos são os sinais de uma recessão na América, contudo, o panorama econômico mundial tende a estar menos descompensado, face ao desenvolvimento dos mercados da China e da Índia. Até mesmo a Rússia, vive um período de prosperidade face ao preço do petróleo. A origem da crise americana, é a desregulamentação do setor financeiro dos EUA, cujos bancos a seu bel prazer, criaram veículos tão complexos e deliberadamente obscuros – todos concebidos para gerar lucro em cada operação de ” swap” ( troca de indexadores), que perderam há tempos a referência do valor real dos papéis. Fica claro, que a velha Lei de Mercado de Capitais, criada na época de Roosevelt para regulamentar as atividades dos bancos deveria ser reeditada.

O receituário para que se possa ” blindar ” a economia, são vários, e partem de diferentes opiniões, muitas delas ortodoxas e conservadoras. Mas o principal problema é desvendar o que ocorre na economia brasileira hoje, e termos a visão e a sensibilidade, para analisarmos os movimentos econômicos de outros países. Com efeito, um dos problemas da nossa economia, é a taxa de juros, que ainda é extremamente elevada, muito embora tenha declinado.

Outra questão preocupante, é o crescimento das Despesas Correntes da União, cujo aumento não se deve aos gastos com o social ou pessoal, e sim com as despesas com juros e encargos da dívida. A dívida pública federal interna, em valores reais, foi multiplicada por sete, entre 1995 e 2006, e claro, são remuneradas com as taxas estratosféricas de juros, aplicado no “Cassino Brasil”. Aliás, esse fator produz sim, um aumento da carga tributária, fazendo com que promova-se, superavit primários elevadíssimos. O governo central tem hoje um superávit primário em 12 meses de 2,3% do Produto Interno Bruto (PIB) que poderia ser deduzido dos investimentos federais previstos no Projeto Piloto de Investimentos (PPI). Com isso, a meta de superávit do governo central para este ano seria de 1,7% do PIB.

Na verdade, os juros nesse patamar, impedem a exportação face ao câmbio hiper valorizado, alem disso, de nada adianta políticas de viabilidade setorial, para suprir as dificuldades de exportação de manufaturados. Temos que impulsionar o mercado interno, declinando as taxas de juros, aumentando as exportações, e por conseqüência, isso faria com que o câmbio pare de se valorizar gradativamente. Hoje o que nos sustenta em termos de câmbio, são os altos preços das commodities, mas isso não é saudável.

Não podemos ser apenas produtores de matérias-primas, precisamos deslanchar as exportações de manufaturados, e isso, evidentemente, tem muito a ver com taxas de juros e cambio. Fica patente que a autonomia do Banco Central é extremamente prejudicial, vez que engessa o poder decisório do Executivo, que já há muito tempo sabe o quanto perverso é, o patamar das taxas ditadas pelo pessoal do Copom sob a batuta de Meirelles. Mas não tem correlação de forças para intervir.

Fernando Rizzolo