SÃO PAULO – Em dois pen drives de uso pessoal do delegado Protógenes Queiroz, criador da Operação Satiagraha, peritos da Polícia Federal encontraram uma coleção de imagens – fotos e vídeos – do advogado Nélio Machado, defensor do banqueiro Daniel Dantas, do Grupo Opportunity
Gravados nesses dispositivos portáteis de armazenamento de dados, os arquivos de Protógenes, agora devassados, indicam que o delegado manteve sob severo monitoramento o advogado do principal alvo da missão.
A PF avalia que esse procedimento viola a Constituição, o Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a jurisprudência dos tribunais superiores, que protegem as prerrogativas da defesa. Tais normas vetam terminantemente investigação ou mesmo vigilância sobre advogados de réus ou suspeitos.
A PF está convencida de que Protógenes espionou ilegalmente Machado durante largo período, antes mesmo da deflagração da operação, em julho.
É forte a suspeita, também, de que a espreita incluiu interceptação telefônica – ligação do advogado para o gabinete de uma desembargadora do Tribunal Regional Federal da 3.ª Região (TRF 3) foi captada.
Relatório
Os pen drives – um de 2 gigabytes, cor verde, outro de 8, cor preta – foram apreendidos na madrugada de 5 de novembro, por ordem judicial, no apartamento 2.508 do Hotel Shelton Inn, no centro de São Paulo, ocupado pelo delegado.
Relatório de análise de mídias produzido pela PF revela o conteúdo de quase todos os registros particulares de Protógenes e os movimentos do mentor da Satiagraha – caso que abriu grave crise interna no Judiciário, envolvendo a magistratura de primeiro grau e o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes.
O documento tem 28 páginas e expõe passo a passo a ação de Protógenes, que tudo armazenou em seu próprio pen drive.
É o segundo relatório parcial da PF que coloca Protógenes como alvo central de inquérito sobre o vazamento de informações da Satiagraha. O primeiro parecer apontou que, em discos rígidos dos computadores da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), base de operações do Rio, foi identificado “farto material pornográfico”.
O inquérito deverá ser concluído em março. Protógenes deverá ser indiciado por quebra de sigilo funcional.
Suspeita
A PF acredita que as fotos, filmagens e grampos de Machado foram feitas por agentes da Abin, recrutados por Protógenes para dar curso à sua investigação secreta. Aos arapongas, estranhos aos quadros da PF, o delegado confiou trabalhos de escuta e análise de documentos. Pelo menos 84 agentes e oficiais de inteligência foram mobilizados na Satiagraha.
O novo relatório é subscrito por um delegado, um agente e um escrivão da Polícia Federal. Os registros de Protógenes foram desbloqueados por meio do Sistema de Acesso Remoto de Dados, técnica empregada pelos peritos federais.
A PF localizou cinco arquivos exclusivos para Nélio Machado. Os arapongas fotografaram até reuniões do advogado e seus deslocamentos por Brasília, Rio e São Paulo.
“Ainda foram apontadas como de interesse várias fotografias, possivelmente realizadas por meio de celular, as quais documentaram uma reunião que tinha como participante o advogado Nélio Machado”, assinala o relatório da PF.
Além da vigilância sobre o advogado, os pen drives guardam 450 arquivos de áudio referentes à Satiagraha, alguns com identificação dos interlocutores, outros não.
A PF constatou que a ação de Protógenes no encalço do advogado do banqueiro não teve respaldo legal. O monitoramento não foi submetido à análise da Justiça e muito menos ao Ministério Público Federal. Não há nos autos da Satiagraha documentos que autorizem a espionagem contra Machado.
Criptografia
Os peritos selecionaram 210 arquivos, mas encontram dificuldades para abrir algumas pastas. “Verifica-se que foram apontados 7 arquivos criptografados, cujo conteúdo ainda não foi possível aferir”, atesta o relatório, página 9. Os peritos localizaram, ainda, anotações sobre “lista de investidores” e “projetos” do Opportunity.
Agência Estado
Rizzolo: Realmente se ficar comprovada esta acusação, estamos diante de um grande problema. Espionar advogados no exercício de sua função, agride o Estado de Direito, e aniquila o direito de defesa. Investigar a atuação de advogados é na verdade, uma afronta à Constituição, e ao Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). E o pior, tudo foi feito, segundo informações, à revelia da legislação, sem o devido mandado judicial. Sem considerar o lado positivo da operação, que tem seus méritos, o componente político ideológico contaminou as diligências, e hoje o que vemos, é a total subversão dos fins desta investigação, não mais policial e sim política ideológica. Uma pena.