Inclusão digital desafio técnico-social

Todos os grandes projetos acabam se constituindo imensos desafios à sociedade. Foi assim com o fornecimento da água e da luz elétrica, este último datando de 1879. Sua primeira utilização no Brasil foi na estação Central (atual Central do Brasil) da estrada de ferro D. Pedro II, no Rio de Janeiro. Agora, temos diante de nós talvez o maior desafio da pós-modernidade: levar a inclusão digital às camadas mais pobres da população brasileira. Ao contrário dos projetos de visam apenas proporcionar condições de vida melhor e dignidade, o viés digital transporta e irriga o direito à cultura, à informação, à socialização, permeando as comunidades carentes com instrumentos de cidadania e mobilização.

Não há como falar em cultura, ou em direito à informação, se deixarmos de lado o poderoso e já indispensável papel da internet no desenvolvimento intelectual dos jovens e da população em geral. Para tanto, medidas de democratização do uso da internet têm sido tomadas por parte dos Estados, apesar de a operacionalidade técnica em nível federal ainda não estar totalmente concluída. O papel do Estado como provedor e difusor da cultura nos remete à sua responsabilidade na implementação das ações técnicas do uso da internet, viabilizando o uso da banda larga aos grandes centros carentes.

Com base nisso, em dezembro de 2009, o governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, lançou, em parceria com as prefeituras de mais seis cidades, o projeto Baixada Digital, cujo objetivo é beneficiar cerca de 1,7 milhão de pessoas. Anunciado como “um dos maiores programas de inclusão digital do mundo”, o projeto prevê em sua primeira etapa a cobertura de 100% do município de São João de Meriti, 60% de Duque de Caxias e Belford Roxo e 20% dos municípios de Nova Iguaçu, Mesquita e Nilópolis. Contudo, a implantação de projetos dessa magnitude, não só no Estado do Rio de Janeiro, mas também nos demais, exige uma planificação cuidadosa, uma vez que a propagação dos sinais deve ser estável em todas as regiões envolvidas.

Do ponto de vista técnico, várias são as opções em levar o sinal, de forma abrangente, a todas as localidades do país; porém, é compreensível que alguns fatores, como a lentidão na implementação dos projetos, cause certo atraso no objetivo final. No entanto, o essencial é que o Poder Público se aproprie da tarefa de se fazer o ator principal na condução e execução desses programas, até porque existe uma estrita relação entre difusão cultural e instrumentos digitais, e isso é papel do Estado.

Na contramão dos investimentos primordiais do Estado no que se refere à cultura, em São Paulo a política adotada é diametralmente oposta à do Rio de Janeiro. Na mais rica unidade da federação, o governo decidiu não investir diretamente na criação de infraestrutura para prover o acesso gratuito à banda larga, mas baseou seu projeto de inclusão digital – batizado de Banda Larga Popular – na isenção fiscal às operadoras privadas. Desse modo, o governo de São Paulo eximiu-se do papel fundamental do Estado na promoção da banda larga, deixando-se valer dos argumentos privados para legitimar a inviabilidade do projeto. Segundo informações, a concessionária de telefonia fixa, que também oferece acesso à banda larga, diz que o valor estabelecido pelo programa só pode ser oferecido a usuário que já tenha ou queira ter linha fixa da operadora.

Quer do ponto de vista técnico, da informação, da cultura ou até da segurança nacional, a disseminação da banda larga popular deve ter como premissa principal a correlação causal entre informação e cultura, que sempre foi protagonizada pelo papel obrigatório do Estado. Políticas públicas de grande envergadura, destinadas à imensa população pobre, que possuem viés tecnológico, jamais devem ser delegadas a empresas privadas. Internet e banda larga significam condutores de cidadania, algo deveras importante para ser tutelado por terceiros, sem o lastro do compromisso técnico-social.

Fernando Rizzolo

Uma Inclusão Digital como no antigo Mobral

Quem não se lembra do MOBRAL ? Bem, com certeza uma grande maioria, até porque nem nascidos eram. Mas vale a pena relembrar esse Movimento Brasileiro de Alfabetização que surgido em 15 de dezembro de 1967, propunha a alfabetização funcional de jovens e adultos, visando “conduzir a pessoa humana (sic) a adquirir técnicas de leitura, escrita e cálculo como meio de integrá-la a sua comunidade, permitindo melhores condições de vida”.

Este movimento, mantido pelo governo federal durante o governo militar, visava a instrumentalizar o cidadão e torná-lo capaz de exercer sua cidadania. No entanto, o MOBRAL se limitou a alfabetizar de maneira funcional, não oferecendo uma formação mais abrangente, que capacitasse ao verdadeiro exercício da cidadania. Durante anos, jovens e adultos freqüentaram as aulas do MOBRAL, sem atingir um nível aceitável de alfabetização face a uma série de problemas de gestão. O MOBRAL acabou sendo incorporado pela Fundação Educar, devido à recessão econômica iniciada nos anos oitenta.

Mas o que eu gostaria de refletir neste artigo, é o aspecto arrojado do movimento que propunha a erradicação do analfabetismo. Hoje temos um outro tipo de analfabeto: o analfabeto digital. Estima-se que o número de internautas residenciais ativos em fevereiro de 2008 cresceu 4,5%, atingindo 22 milhões de usuários, 56,7% mais do que em fevereiro de 2007. Também continuamos a ser o país com maior tempo médio mensal de navegação residencial por internauta entre os 10 países monitorados pela Nielsen/Netratings. Face a esses dados, podemos nos certificar que a medida que determinada faixa de usuários aumenta, demais faixas ou classes sociais ainda não participam do mundo digital, quer pela indisponibilidade operacional do Estado na oferta de computadores, quer pelo completo analfabetismo digital que antecede a inclusão nos programas que poderíamos chamar de “inclusão digital “.

Com efeito, é imperiosa a necessidade de implementarmos num compasso definido, a disponibilidade das redes nos órgãos públicos, nas escolas públicas, no financiamento na compra de computadores populares, bem como uma iniciativa arrojada nos termos de um MOBRAL DIGITAL, que denominei como MOBRINDI, Movimento Brasileiro de Inclusão Digital, onde a sociedade e o Estado, sob inspiração do antigo Mobral, compactuassem de um mutirão contra o analfabetismo digital.

O que observamos, é que mesmo a implementação técnica dos projetos de inclusão, face aos recursos destinados, estes correm à frente da informação didática básica a ser levada ao usuário pobre, sobre de que forma utilizar e navegar na Internet; na realidade a inclusão digital do ponto de vista pessoal informativa, deveria preceder ao investimento material e tecnológico, sob pena de no futuro termos computadores disponíveis e uma população de baixa renda sem a devida instrução sobre seu uso.

O governo do presidente Lula através do Ministério da Ciência e Tecnologia, possui projetos arrojados de implantação tecnológica de redes, mas isso não basta se na outra ponta, a população, a grande massa, não tiver a informação operacional, estando devidamente alfabetizada do ponto de vista digital. O grande desafio passa a ser do Poder Público, principalmente o Municipal, em oferecer instrumentos para viabilizar o que eu carinhosamente chamei de MOBRINDI, Movimento Brasileiro de Inclusão Digital, na luta contra o analfabetismo digital, com informação e inclusão da grande massa. E mais, Mobrindi lembra brinde, que sabe poderia ser até um computador.

artigo de Fernando Rizzolo