O cirurgião cardiologista e ex-ministro Adib Jatene ganhou notoriedade no debate sobre a CPMF, ao passar um pito no presidente da Fiesp, Paulo Skaf, flagrado pela jornalista Mônica Bergamo. Skaf, à prente da poderosa entidade do capital industrial, está em campanha, pelo fim da CPMF. O cardiologista e ”pai” da CPMF, segundo Mônica, falou alto e de dedo em riste ao empresário: ”No dia em que a riqueza e a herança forem taxadas, nós concordamos com o fim da CPMF. Enquanto vocês não toparem, não concordamos. Os ricos não pagam imposto e por isso o Brasil é tão desigual. Têm que pagar! Os ricos têm que pagar para distribuir renda”, disparou.
Skaf tenta rebater (sempre conforme a colunista da Folha de S.Paulo): ”Mas, doutor Jatene, a carga no Brasil é muito alta!”. E Jatene: ”Não é, não! É baixa. Têm que pagar mais. Por que vocês não combatem a Cofins (Contribuição para Financiamento da Seguridade Social), que tem alíquota de 9% e arrecada R$ 100 bilhões? A CPMF tem alíquiota de 0,38% e arrecada só R$ 30 bilhões”. Skaf desconversa: ”A Cofins não está em pauta. O que está em discussão é a CPMF”. E Jatene, certeiro: ”É que a CPMF não dá para sonegar!”
Dedo na ferida com precisão cirúrgica
Jatene tem uma carreira política tortuosa, que o levou à Arena (partido da ditadura militar) e aos ministérios de Fernando Collor e Fernando Henrique. Mas estava coberto de razão em seu diálogo acalorado com Skaf, no restaurante chique A Figueira Rubaiyat. Ele pôs o dedo na ferida com precisão cirúrgica.
O verdadeiro problema tributário do Brasil é que os ricos têm que pagar imposto, e não pagam. Na hora de discutir a CPMF, eis que o ex-PFL, a Fiesp & Cia vêm a público como paladinos do ”contribuinte”. E esquecem de dizer que, no sistema tributário atual, o trabalhador assalariado é quem paga a conta, enquanto o banqueiro, no vértice dourado da pirâmide social, escapa.
Brasil: o paraíso dos bancos
Em outra ponta do leque ideológico brasileiro bem distante de Jatene, o Unafisco (Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita federal), ligado à Conlutas, publicou um artigo do seu Departamento de Estudos Técnicos que expressa em números essa deformidade. É sobre a arrecadação tributária em 2006, escrito por Álvaro Luchiezi Júnior, Clair Hickmann e Evilásio Salvador, com o eloquente subtítulo Brasil: o paraíso dos bancos.
O texto, fartamente ilustrado por tabelas, mostra que a arrecadação de impostos realmente não pára de crescer: descontada a inflação, subiu 29,54% no segundo governo de FHC, e mais 19,81% no primeiro mandato de Lula. Porém essa carga pesada não recai por igual sobre todos: ”Os dados revelam que a tributação sobre o consumo e a incidente sobre os salários dos trabalhadores responderam por 65% dos tributos arrecadados pela Receita Federal, em 2006”.
Regalias e truques do contribuinte-banqueiro
Do total arrecadado, ”mais da metade (54%) advém de tributos arrecadados sobre o consumo. As famílias de baixa renda são as mais prejudicadas por esta estrutura, já que os gastos com consumo são relativamente maiores na medida em que renda familiar diminui”, aponta o artigo. E dá os dados do IBGE: ”As famílias
com renda de até dois salários mínimos arcam como uma carga tributária indireta de 46% da renda familiar, enquanto as famílias com renda superior a 30 salários mínimos gastam 16% da renda em tributos indiretos” (!).
”A evolução da arrecadação tributária das empresas constitui um caso à parte”, prossegue o estudo. ”Dois grupos de tributos chamam a atenção por razões opostas: de um lado, um grupo de tributos composto pelo Imposto de Renda – Pessoa Jurídica (IRPJ) e a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), cuja evolução foi positiva; por outro lado, o grupo formado pela Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) e pela Contribuição para o PIS/Pasep, que apresentou um crescimento bastante tímido.” Vale notar a referência à Cofins, o mesmo imposto que, segundo Jatene, não é questionado porque ”dá para sonegar”.
”Em ambos os casos, o resultado da arrecadação tributária foi influenciado pelo setor financeiro da economia. O montante arrecadado de IRPJ e CSLL cresceu, em termos reais, 5,25% e 2,99% respectivamente, chamando a atenção o crescimento de 20,68% e 12,68%, respectivamente, recolhidos pelas instituições financeiras. À primeira vista esta evolução demonstraria um maior potencial de arrecadação do setor financeiro ou mesmo um incremento da tributação sobre os bancos. Contudo, não é isto o que ocorreu de fato.”
Mais artifícios e jogadas
”Apesar do aumento expressivo dos lucros dos bancos – os 10 maiores tiveram um crescimento de 23,87% e o conjunto do sistema financeiro apresentou aumento de 35,14%, no período de janeiro a setembro de 2006, em relação ao mesmo período do ano anterior —, a arrecadação de tributos desse setor permanece pequena em relação às demais setores da economia”, mostra o estudo.
”A participação dos bancos no total das receitas administradas pela SRF é pífia, apesar dos lucros extraordinários. As instituições financeiras, apesar do pequeno acréscimo no recolhimento de tributos (5,38%, em termos reais), respondem por apenas 5,11% das receitas administradas pela SRF. Os tributos que incidem diretamente sobre a renda dos bancos têm um peso de somente 3,27% nos tributos recolhidos pela Receita Federal”, diagnostica.
O texto explica como os banqueiros lançam mão de artifícios, como o de descontar prejuízos de exercícios anteriores, para pagar menos imposto que quem vive de salário. ”As instituições financeiras têm aproveitado todas as brechas legais, inclusive fazendo interpretações próprias da legislação, para escaparem do seu dever tributário”, prossegue. Mostra que no ano passado, em termos reais, as instituições financeiras recolheram penos PIS (queda de 5,74%) e menos Cofins (13,08% a menos), usando, entre outros recursos, uma brecha criada pela Lei 9.718/98.
”Renúncia fiscal a favor da renda do capital”
Nem só os banqueiros comparecem no levantamento do Unafisco como beneficiários de mágicas tributárias. Empresas estrangeiras, diz o texto, optaram pela remessa de juros sobre capital próprio para aproveitar o real supervalorizado e enviar recursos para fora do país. Há também a isenção de imposto de renda na remessa de lucros e dividendos ao exterior. Outros grandes capitais tiraram partido da dedução de juros sobre o capital. O estratagema, ”único no mundo”, é socialmente perverso, ”porque o rendimento do capital acaba não sendo submetido à tributação progressiva, mas apenas à proporcionalidade, o que fere os princípios da igualdade e da progressividade estabelecidos pela Constituição Brasileira de 1988”.
Já a arrecadação do Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) sobre os Rendimentos do Trabalho alcançou R$ 39,6 bilhões no ano passado, um aumento de 5,5% acima da inflação, acima também do crescimento da massa salarial, que foi de 5,04%, apesar do reajuste de 8% na tabela do IR.
Conclusão do estudo técnico: ”O Estado brasileiro vem praticando uma renúncia fiscal a favor da renda do capital”. Foi o que Adib Jatene disse, com menos números e mais ênfase, ao apontar o dedo para o presidente da Fiesp. Isto é também o que será preciso discutir, para começo de conversa, no dia em que o Brasil tiver a coragem de enfrentar para valer a questão crucial da reforma tributária. Para começo de conversa, porque Jatene, ao passar sua descompostura em Skaf, menciona também a taxação da riqueza e da herança, que trabalho do Unafisco não menciona.
Por Bernardo Joffily
Site do PC do B
Rizzolo: É como eu sempre digo, e fico feliz ao saber que o Dr. Jatene, pai da CPMF, cerra fileira na luta contra o egoísmo perverso da elite, principalmente paulistana, que não gosta de pagar imposto, é insensível à população pobre, e tentar golpear o governo e aos avanços sociais. Como é possível, o camarada empresário, (e não estou falando especificamente do Skaf) que não sabe o que é miséria, tem a sua disposição os melhores médicos, viaja ao exterior à vontade, disponibiliza as melhores escolas aos seus filhos, se alimenta adequadamente, gasta com roupas de grife, tem empregados que lhe servem, e ainda, não quer pagar impostos ? Ou se quer, quer um tipo de imposto que ele possa sonegar, enganar, dissimular a União para que não transfira essa renda ao pobre. Isso é justo? Não, isso é antipatriótico, amoral, e merece um dedo em riste sim, ou voltar ater aulas de catecismo, na primeira igreja que encontrar. Vergonhoso, não?