As Mães e a Escola de Tempo Integral

Era assim toda quarta-feira: ela chegava pela manhã com uma pequena sacola, no mesmo ritmo de quem acabara de descer de um ônibus vindo da periferia de São Paulo. Havia anos trabalhava na limpeza do meu escritório e de tantos outros no mesmo prédio. O olhar sofrido e as mãos cansadas faziam-na parecer muito mais velha do que realmente era. Neusinha, a minha diarista, era mãe solteira e cuidava sozinha de um menino de 11 anos.

Nosso contato era pouco, até porque, para não atrapalhar o andamento da limpeza geral, eu aproveitava aquelas quartas-feiras para ir ao fórum. Contudo, naquele dia, algo estranho no olhar de Neusinha me chamou a atenção: os olhos marejados indicavam certa tristeza, dando ao rosto branco daquela nordestina um contorno de aflição.

Meio sem jeito, e já de saída com o paletó na mão, perguntei a Neusinha se estava tudo bem. Timidamente e num rompante de desabafo, ela se pôs a chorar. Com calma, pedi que ela me contasse o que havia acontecido, na tentativa de acalmá-la com um gesto de amizade e solidariedade.

– Sabe o que é, doutor, meu filho está envolvido com drogas; ele me contou tudo ontem à noite. Tudo começou na porta da escola pública em que ele estuda. Ele estuda no período da manhã, mas à tarde fica com más companhias.

Entre um soluço e outro, trouxe-lhe um copo com água, o qual foi levado à boca como se contivesse um doce remédio.

– Não tenho com quem deixá-lo. Preciso trabalhar e é aí que ocorre a desgraça – ela disse, olhando-me com um ar de cumplicidade, numa linguagem simples, mas carregada de uma tristeza incalculável.

Minha consciência obrigou-me a acalmá-la e a dispensá-la, pagando-lhe pelo dia de trabalho não concluído, pois seu estado emocional era péssimo. Em seguida, ainda sob o impacto daquela cena, a caminho do fórum, entre centenas de pessoas que aguardavam o metrô, pus-me a pensar no papel da escola de tempo integral e em sua importância para a formação dos jovens, em seu papel de manter o jovem ocupado, em tranquilizar as mulheres que trabalham fora e não têm com quem deixar os filhos, enfim, naquilo que chamo de “tutela educativo-protecionista”.

O que realmente vemos hoje é o descaso do poder público na implantação da verdadeira escola de tempo integral, pois o que há – e em pouquíssimo número – são escolas que disponibilizam uma espécie de duplicação de jornada, fazendo um segundo turno à imagem e semelhança do primeiro, sem dar sentido à amplitude educacional de outras disciplinas como arte, educação física, visita a museus, estímulo à leitura, enfim, mudando o projeto político-pedagógico das escolas.

Já no balanço do trem do metrô e nas paradas cansativas das estações, imaginava quantas Neusinhas pelo Brasil não sofrem por saber que seus filhos não estão protegidos pela “tutela educativo-protecionista” que as escolas de tempo integral poderiam oferecer à sua prole, quando estão trabalhando, longe de casa, sustentando seus lares. Pensei também que a miséria, as drogas, o desamparo são filhos do abandono total do Estado na área da educação, e que melhor do que as palavras de consolo, a indignação e um copo com água para abrandar o soluço de um choro profundo é oferecer uma educação cidadã a todos, com investimentos maciços num único ideal de escola pública, a escola de tempo integral. Talvez, se ela existisse, aquela quarta-feira seria diferente para todos nós, em especial para tantas Neusinhas, diaristas pobres, trabalhadoras nas fábricas, nos campos, nas grandes cidades do nosso país, que sem esperança soluçam por seus filhos perdidos.

Fernando Rizzolo

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Fernando Rizzolo candidato a Dep.Federal fala de Sonhos e Esperanças.

Fernando Rizzolo 3318 candidato a Deputado Federal por SP. Divulgue este vídeo e ajude o Rizzolo a chegar lá !!

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“Bullying”

*Por Sara Esther Crispe

Semana passada fui à casa de meus pais e encontrei alguns álbuns antigos, do ensino médio e do ginásio, e até mesmo alguns da escola primária. Graças ao Facebook e outros sites sociais da rede, muitos desses colegas são pessoas com quem agora mantenho contato.

Ironicamente, tenho muitos “amigos” na minha lista de amigos com quem não tenho amizade. Nunca tive. Quando muito, estes “amigos” tornaram a minha juventude muito infeliz. Eu era provocada, perseguida mesmo, porém anos antes de o termo “bullying” ser usado.

Olhando em retrospecto, posso dizer que talvez tenha sido o mau tratamento tanto pelos colegas quanto por alguns professores (enquanto escrevo essas palavras, meu estômago se contrai à medida que recordo meu professor da terceira série que me aterrorizava), que me tornou a pessoa que sou hoje.

Talvez eu seja uma das sortudas que se fortaleceram através dessas experiências. Pois todos que me conhecem sabem que sou bem dura quando preciso ser, e certamente me recuso a ser forçada… seja por quem for.

Porém olhando para o presente, e não apenas para o passado, percebi algo mais. Por mais que algumas pessoas tenham mudado drasticamente, a maioria continuou do mesmo jeito. Não apenas a grande maioria das minhas colegas mora na mesma cidade onde crescemos, como a maioria tem filhos da mesma idade e nas mesmas escolas que frequentamos.

E embora eu não possa dizer com certeza, poderia apostar que aqueles que eram “populares” quando eu era jovem provavelmente são pais de filhos “populares” agora. Pergunto-me se eles deixam os filhos brincarem com aqueles que “não são tão legais”, ou se eles os mantêm separados da maneira que os pais deles faziam com eles.

Olho para os divorciados na lista desses velhos “amigos” e como os filhos deles estão vestidos e posam nas fotos. Estou julgando superficialmente? Ora! Porém uma foto pode dizer mil palavras, e quando uma mão no quadril e um sorriso irônico se assemelha à mesma pose e rosto da mãe vinte anos antes, é difícil não presumir que as características faciais não são a única coisa que esta criança herdou.

Ainda nesta semana li sobre outro caso trágico de uma criança linda que tirou a própria vida por causa do incessante “bullying” por parte dos colegas. Porém o problema não é apenas entre as crianças. Brota dos pais. E brota dos pais que provavelmente foram “bullies” ou talvez tenham sido vítimas de “bullying”.

Qualquer pai ou mãe que permite que seu filho persiga outros (e se eles não estão cientes de como os filhos se comportam, aí já é outro problema…) provavelmente está repetindo aquilo que fizeram a outros, ou aquilo que gostariam de ter feito. Porque pais que são veementemente contrários e têm tolerância zero com o “bullying” são muito menos prováveis de ter filhos que levam outras crianças a se matarem.

Então, o que podemos aprender com essa recente tragédia? Como fazemos para assegurar que isso não tornará a acontecer?

Escrevo este artigo no período de Sefirat Haomer. Nesta época do ano, durante sete semanas nos dedicamos a aperfeiçoar nossas emoções e nossas características. Cada dia da semana tem um foco diferente, cada dia exige de nós que olhemos para o passado e retifiquemos nossas falhas para podermos melhorar no futuro.

O Judaísmo reconhece que todos nós temos o poder de mudar. Mudar radicalmente. Este é o conceito de teshuvá, verdadeiro arrependimento e retificacão. Porém isso não acontece por si mesmo. Não acontece simplesmente porque ficamos mais velhos. Acontece se, e somente se, mudarmos conscientemente nosso modo de pensar, sentir e agir.

Assim como nossos filhos são indivíduos, eles são também esponjas. Aprendem com aquilo que veem e nós, como pais, somos modelos de comportamento e professores. Se maltratamos os outros, se maltratamos a nós mesmos, é isso que estamos ensinando nossos filhos a fazer. É isso que estamos dizendo que é aceitável. Da mesma forma, se podemos admitir nossos erros e nossas falhas, mostramos a eles que a mudança é possível, mesmo que seja difícil.

Em Pêssach celebramos nossa saída do Egito. Fomos resgatados de gerações de “bullying”, de mau tratamento e escravidão. Porém ainda não estávamos prontos para receber a Torá. Isso veio somente depois de fazermos muita introspecção e auto-aperfeiçoamento. Pois embora tenhamos sido vítimas no Egito, precisávamos provar que não repetiríamos aquilo que vimos e aprendemos. Precisávamos provar que seríamos indivíduos sadios e membros de uma comunidade saudável. Portanto D’us nos deu estas sete semanas, estes quarenta e nove dias para trabalhar em nós mesmos e mudar nossa mentalidade daquela de vítima para a de transformador.

Dez, vinte, trinta anos podem ter passado desde que saímos da escola. Mas quanto realmente mudamos? Quanto realmente nos desenvolvemos? E nossos filhos? Eles são semelhantes àquilo que fomos na idade deles ou a como estamos agora?

Definição de Bullying

Compreende todas as formas de atitudes agressivas, intencionais e repetidas, que ocorrem sem motivação evidente, adotadas por um ou mais estudantes contra outro(s), causando dor e angústia, e executadas dentro de uma relação desigual de poder. Portanto, os atos repetidos entre iguais (estudantes) e o desequilíbrio de poder são as características essenciais, que tornam possível a intimidação da vítima. Formas do bullying: colocar apelidos,ofender, zoar gozar, encarnar, humilhar, fazer sofrer,discriminar, excluir, isolar, ignorar,intimidar, perseguir, assediar, aterrorizar, amedrontar, tiranizar dominar, agredir, bater, chutar, empurrar, ferir, roubar, quebrar pertences.

Fonte: Site do Beit Chabad

Tenham um sábado de paz !!

Fernando Rizzolo

Um jovem no circo da vida

Ainda me lembro de quando, numa entrevista pela televisão, um delegado de polícia informava dos perigos de andar em São Paulo e de ser assaltado no trânsito. Dizia ele que, através de estudos de especialistas, o correto seria o motorista nunca se posicionar na fileira da esquerda nos faróis, pois, segundo ele, a probabilidade de ocorrer um assalto é maior nessa faixa por causa da posição dos automóveis.

Como tudo que se relaciona à segurança, tentei memorizar o tático conselho, mas naquela noite chuvosa, na avenida Brasil, em São Paulo, me descuidei. Lá estava eu na fila da esquerda – e dessa vez sem nenhuma conotação ideológica – me expondo bem diante do brilhante farol vermelho. Minha preocupação naquele momento era olhar para os lados, como a procurar pelo agente delituoso, mas o que eu não esperava era ver o brilho de um jovem malabarista de 16 anos que soltava fogo pela boca e fazia ali, no pretenso campo de batalha, um maravilhoso espetáculo circense.

Como num teatro, assisti durante alguns instantes a uma apresentação profissional, cronometrada e com direito a agradecimento que me remeteu aos espetáculos dos circos russos de antigamente. Ao terminar sua apresentação, o rapaz passou ao meu lado e ofereci a minha modesta contribuição pela dedicação ao seu amor à arte. Em seguida, perguntei: “Parabéns, você é ator?”. O jovem me olhou e com um sorriso amável agradeceu meu gesto respondendo: “Não, senhor. Estudei na Escola Nacional de Circo e nas horas vagas ofereço um pouco de arte às pessoas no trânsito. Obrigado pelos ‘parabéns’”.

Eu pouco sabia sobre iniciativas educativas como esta. A Escola Nacional de Circo da Fundação Nacional de Arte (ENC/Funarte) é a única instituição de ensino diretamente mantida pelo Ministério da Cultura. Foi criada em 13 de maio de 1982, pelo artista circense Luiz Olimecha, para realizar cursos regulares de formação profissional e de reciclagem de artistas, atendendo a uma antiga reivindicação dos profissionais de circo de todo o país.

Hoje, quando passo pela avenida Brasil, não encontro mais o malabarista – talvez ele tenha se arrumado melhor num grande circo -, mas daquela experiência descobri que existem surpresas no trânsito quando se observam as pessoas com bondade e sem medo. Constatei ali que a insistência em andar na fila da esquerda não passa a ser tão perigosa quando se vive num ambiente de inclusão social. Inúmeros jovens pobres ainda são, na verdade, os malabaristas do circo da vida e apostam num Brasil mais justo. Num simples farol, sempre existem talentos – alguns esquecidos, outros perdidos e um tanto sem rumo. Mas pensando nos jovens e apostando na educação teremos talentos despertos em todas as avenidas da cidadania do nosso Brasil, incluindo naquela em que inadvertidamente insisti em andar do lado esquerdo. Uma avenida chamada Brasil.

Fernando Rizzolo

Os Jovens e o Desemprego Juvenil

Um dos maiores problemas circunstanciais de qualquer crise financeira é a falta de perspectiva geral no que diz respeito à oportunidade de emprego. Essa situação agrava-se em demasia quando determinada faixa populacional é mais diretamente atingida, como os jovens. É de se analisar que as políticas de empregabilidade nos países ricos sempre estiveram nas pautas sociais, e houve, no decorrer da história, um elenco de lutas nesse sentido.

Contudo, a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), composta de economias de alta renda, com alto Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) – ou seja, elencada por países desenvolvidos –, alerta para o agravamento do desemprego juvenil. Num documento recém-divulgado, a OCDE constata que, se os jovens já eram vulneráveis antes da crise e foram suas primeiras vítimas, o futuro não vislumbra nada de bom, uma vez que, de acordo com a Organização, a situação continuará a deteriorar-se por vários anos.

No estudo, observa-se que quatro milhões de jovens engrossaram as fileiras do desemprego durante a crise, elevando este índice para 18,8% em 2009, mais do dobro da taxa média de 8,6% para o conjunto da população. Enquanto o desemprego geral aumentou 2,5 pontos percentuais, o juvenil agravou-se 5,9 pontos.

É sobre esses dados que podemos fazer uma reflexão crítica sobre os efeitos das crises financeiras nos países ricos, onde a participação do Estado como regulador desse segmento foi quase nula ou omissa. No caso de países em desenvolvimento como o Brasil, onde houve uma política mais realista e mais intervencionista do ponto de vista regulador do Estado, a crise e o desemprego em geral, em especial no tocante aos jovens, não foram tão significativos.

De qualquer modo, o grande desafio tanto dos países ricos quanto daqueles em desenvolvimento é traçar políticas claras e específicas para a criação de novos empregos, com vistas à população jovem, criando possibilidades e incentivos no encaminhamento das políticas de formação de mão de obra, na geração do primeiro emprego, na educação de base e, acima de tudo, na preservação da dignidade e esperança do jovem de se sentir integrado no mercado de trabalho. Sem isso, com certeza lançaremos os jovens do nosso país ao ostracismo da desilusão, ao abraço perdido do narcotráfico e ao desalento patriótico da desesperança e engrossaremos o universo da já profetizada “geração perdida”.

Fernando Rizzolo

Redução da Jornada e o Mercado Interno

Muito se tem discutido sobre a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 231/95, que reduz a jornada de trabalho no Brasil de 44 para 40 horas semanais. A grande questão suscitada pelos opositores da emenda, e que serve de esteio argumentativo, é que tal redução deveria ser feita sempre por meio de negociação, e não em forma de lei. Além disso, eles alegam que essa medida elevaria o custo das empresas, ou seja, aquelas que pudessem substituir mão de obra por processo de automação fariam isso, mas não mais contratariam funcionários.

Com efeito, o argumento patronal de que a redução de jornada de trabalho aumentaria os custos da produção é antigo. Ele é usado desde a década de 1920 do século passado, quando o movimento sindical brasileiro tentava proibir o trabalho de crianças de 5 e 6 anos de idade e lutava para conquistar férias e outros direitos. Ademais, todos sabem que os empresários lutam pela jornada negociada, mas não admitem a negociação quando se trata da terceirização e da redução da contribuição previdenciária, querendo que estas sejam, sim, estabelecidas por lei.

Do ponto de vista histórico, em termos de aplicabilidade, a França, com sua jornada de 35 horas, enfrentou e ainda enfrenta forte resistência do patronato. Contudo, predomina a avaliação, incluindo do Ministério do Trabalho francês, de que gerou entre 300 mil a 500 mil novos empregos. Seus efeitos no mercado de trabalho só não foram melhores porque o empresariado usou de todos os meios para reverter a medida, apelando especialmente para a intensificação e flexibilização do tempo de trabalho.

A boa notícia vem da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que após estudos concluiu que, no caso de adoção das 40 horas semanais no Brasil, seria beneficiado diretamente um contingente de 18,7 milhões de trabalhadores brasileiros. Eles compõem 33,2% das pessoas ocupadas no país, ou seja, 31,9 milhões de trabalhadores e trabalhadoras. Desse grupo, 58,6% trabalhavam em 2008 mais de 40 horas semanais, enquanto 41,4% trabalhavam 40 horas ou menos por semana.

Por bem, é grande hoje o número de empresários que enxergam os benefícios da medida, quer do ponto de vista da melhor condição de vida do trabalhador, de sua saúde e de sua integração familiar, quer do ponto de vista do fortalecimento do mercado interno, no combate ao desemprego, no aumento do consumo e na inclusão social, fortalecendo, assim, também a musculatura social na capacidade do aumento do poder aquisitivo e da consequente elevação da produção industrial.

A redução da jornada de trabalho propõe criar um círculo duradouro de participação no mercado de trabalho, que se traduz por cidadania, desenvolvimento intelectual e, acima de tudo, pela esperança da tão sonhada oportunidade do primeiro emprego, instrumento de percepção de uma vida digna por parte dos jovens do nosso país.

Fernando Rizzolo

“Senador escravocrata causa revolta ao povo brasileiro”

“Eles sempre falaram que a culpa da escravidão é dos próprios negros. É como se um erro justificasse outro”, declarou o professor Eduardo de Oliveira, poeta, presidente do Congresso Nacional Afro-Brasileiro (CNAB) e militante do movimento negro há mais de 60 anos, sobre as declarações do senador Demóstenes Torres (Dem), durante audiência pública no Supremo Tribunal Federal (STF), dias 3 e 4 de março, para debater a política de cotas no ensino superior.

Autor do Hino à Negritude e um dos maiores defensores das cotas para os negros nas universidades, o professor Eduardo condenou as declarações de Demóstenes que “tenta reverter toda a História dizendo que os negros eram culpados pela escravidão e as mulheres se entregavam aos senhores prazerosamente”. “Ele disse que as mulheres foram as responsáveis por serem violentadas. Que quem tinha prazer em servir os senhores eram as mulheres negras”.

Para o professor Eduardo, “o que o Demóstenes acabou fazendo é uma coisa horrível” e mereceu o repúdio de todos os que presenciaram aquele vexame. O presidente do CNAB se solidarizou “com as mulheres que estavam presentes à audiência no STF e redigiram um documento de protesto contra as palavras do senador”. “A atitude tomada por ele nessa audiência pública revoltou muito as mulheres”, declarou ao HP o autor de 10 livros publicados, entre os quais a enciclopédia “Quem é Quem na Negritude Brasileira”.

Eduardo Oliveira disse que os inimigos das cotas estão na contramão do momento em que o país vive, de “expressivas conquistas para a negritude, onde o governo Lula reconheceu a necessidade de compensar os afrodescendentes, com a criação das cotas e com a nomeação de negros para o primeiro escalão da administração pública nacional”.

As posições retrógradas do senador dos Demos provocaram reações indignadas de inúmeras lideranças negras e de várias personalidades. Segundo Demóstenes, “todos nós sabemos que a África subsaariana forneceu escravos para o mundo antigo, para o mundo islâmico, para a Europa e para a América” e “até o princípio do século 20, o escravo era o principal item de exportação da pauta econômica africana”. O professor Eduardo rebateu: “O que ocorria na época eram problemas de guerras tribais. Quem perdia era condenado à morte ou à escravidão”.

O líder negro assinalou que a política de cotas nas universidades “vem no sentido de corrigir uma injustiça histórica que privilegia a condição social e econômica de poucos em detrimento da grande maioria do povo brasileiro de origem afro-descendente”, mas ressalta que “temos ainda muito a conquistar”. Ele destacou, contudo, que “não podemos esquecer as inúmeras vitórias dos afro-brasileiros, fruto de um esforço hercúleo, como a definição do racismo como crime inafiançável, o reconhecimento do direito dos quilombolas às suas terras, a proliferação de conselhos afrodescendentes que hoje atuam em vários estados, a oficialização do Hino à Negritude e a criação da Secretaria Especial de Políticas da Promoção da Igualdade Racial”.

ANDRÉ AUGUSTO
Hora do Povo

Rizzolo: Conheço pessoalmente o professor Eduardo de Oliveira, que hoje é um dos expoentes na luta contra as injustiças cometida contra os negros neste país durante nossa história. É repudiável o discurso de Demóstenes que nos remete a uma época em que o Brasil se encharcava de ódio e preconceito. A luta dos negros deve continuar para que possam restabelecer seu lugar com dignidade junto à nação brasileira.

Intolerância e os Jardineiros do Futuro

Muitas são as situações que ainda subsistem, em que a demonstração de intolerância nos leva a uma reflexão de que pouco evoluímos desde a época da libertação dos escravos no Brasil, datada de 1888. A notícia de que jovens foram suspeitos de açoitar um jardineiro negro no interior de São Paulo, agredindo-o verbalmente, demonstra que, neste país, o negro ainda é visto como cidadão de segunda classe. No entanto, o mais interessante nestes episódios de intolerância, é que os atores desses crimes de racismo compõem substancialmente um cenário que é alvo de discussões, que vão desde o papel do negro na sociedade até ações afirmativas e políticas de afirmação do negro no Brasil.

Enquanto a imensa maioria negra é impedida de frequentar determinados cursos superiores como uma faculdade de medicina, particular ou pública, quer pelo alto valor das mensalidades, quer pela concorrência daqueles que dispõem de mais tempo para se preparar, a agressão, o desprezo e o ódio surgem diante de nós promovidos por representantes de uma elite branca jovem, economicamente privilegiada, que, de forma emblemática, como numa cena cinematográfica de violência, acaba traduzindo toda a questão maior que envolve a discussão daqueles que sempre serão os jardineiros e a dos destinados a um lugar de destaque na sociedade, desde a época da escravidão.

Na visualização dos conceitos de dignidade humana, é mister levarmos aos jovens de todas as classes sociais e origens os conceitos de direitos humanos, de civilidade e de humanidade, tão imperiosos quanto a educação, a cultura e as oportunidades que os programas de inclusão destacam. É preciso impregnarmos nossa sociedade com os valores de igualdade racial e de cidadania, para que nos próximos anos sintamos que efetivamente estamos longe da triste e trágica época escravagista, despertando nas novas gerações um verdadeiro senso de justiça e de igualdade de oportunidades, fazendo com que os estudantes de amanhã respeitem as minorias, os negros e os jardineiros do futuro.

Fernando Rizzolo

Jovens estudam cada vez mais e retardam entrada no trabalho, diz Ipea

Os jovens têm cada vez mais anos de estudo e retardam a entrada no mercado de trabalho, de acordo com análise feita pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

A análise se baseia na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2008, realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

O Ipea considera como jovens a população entre 15 e 29 grupos – 49,7 milhões de pessoas, ou 26,2% da população total -, sendo que há três subgrupos: jovem adolescente (15 a 17 anos), jovem jovem (18 a 24 anos) e jovem adulto (25 a 29 anos).

De acordo com os dados, entre os jovens adultos, a pesquisa mostra que o grupo tem 9,2 anos de estudo, o que representa 3,2 anos a mais do que a população com mais de 40 anos.

Os dados mostram ainda que quanto a maior a faixa etária do jovem, maior a taxa de analfabetismo. Entre os jovens de 15 a 17 anos, 1,7% são analfabetos – em 1998, o índice era de 8,2%. Entre os de 18 a 24 anos, 2,4% são analfabetos – eram, em 1998, 8,8%.

“O avanço representado pela redução substancial do analfabetismo na faixa etária entre 15 a 17 anos e na faixa de 18 a 24 anos mostra o aumento da capacidade do sistema educacional em incorporar e alfabetizar crianças e jovens. Pode-se também constatar pela tabela 1 que a incidência do analfabetismo é tanto maior quanto mais elevada é a faixa etária dos jovens brasileiros. Os jovens adolescentes, portanto, têm menor incidência de analfabetos, o que não deixa de ser uma conquista dessa nova geração”, diz a análise.
Fora da escola

A análise do Ipea diz ainda que 15,9% dos jovens entre 15 e 17 anos está fora da escola. Entre os jovens de 18 a 24 anos, 64,4% não estudam mais. Na faixa etária entre os 25 e os 29 anos, o percentual passa para 87,7%.

Entre os que saíram da escola entre os 18 e 24 anos, só 2,3% têm ensino superior completo – nível, segundo a análise, adequado a essa faixa etária. Na faixa de 25 a 29 anos, o índice de ensino superior completo passa para 10,2%.

O ensino superior é restrito, conforme os dados do Ipea. Apenas 13,6% dos jovens de 18 a 24 anos frequentam a faculdade.

Mercado de trabalho

Segundo a pesquisa, cada vez menos jovens adolescentes entram no mercado de trabalho. Em 10 anos, a taxa de participação desse grupo no mercado de trabalhou caiu. Em 1998, eram 45% trabalhando. Em 2008, 37% dos jovens de 15 a 17 anos trabalhavam. Segundo o Ipea, a queda ocorreu para ambos os sexos.

“A boa notícia é que esta queda foi mais aguda entre os homens, reduzindo a desigualdade de gênero nessa fase da vida, pois os homens, geralmente, mais do que as mulheres, sofrem grande pressão para entrarem precocemente no mundo do trabalho”, diz a análise.

Mulheres

A análise mostra que mulheres jovens, de 18 a 29 anos, têm menos espaço no mercado de trabalho. “As mulheres pobres tendem a assumir o trabalho doméstico em detrimento do estudo e de atividades laborais externa ao lar. Observa-se que tal tendência independe da condição de maternidade, ou seja, vale tanto para as jovens pobres com filhos quanto para as jovens pobres sem filhos.”

Desigualdade racial

O Ipea analisou ainda a contribuição da desigualdade regional para a desigualdade racial no Brasil. “As regiões do Brasil meridional, mais ricas, apresentam maior porcentagem de pessoas brancas do que as do Brasil setentrional: do Oiapoque ao Chuí, a população embranquece e a renda aumenta. Assim, pode-se demonstrar que, mesmo se não houvesse desigualdade racial dentro das regiões, ainda haveria desigualdade racial no Brasil.”

Ainda segundo a análise, “racismo e discriminação fazem parte de um conjunto complexo de fatores que determinam a reprodução da desigualdade racial ao longo do tempo, dentre os quais figuram as desigualdades regionais e a elevada desigualdade de oportunidades que caracteriza o regime brasileiro de mobilidade social. Portanto, políticas específicas para a população negra são necessárias, porém não suficientes para resolver o problema da desigualdade racial no Brasil”.
globo

Rizzolo: Um dado importante é a questão do ensino superior. Observem que Apenas 13,6% dos jovens de 18 a 24 anos frequentam a faculdade. É um número medíocre, temos muito o que fazer para inclusão dos jovens à Universidade. Falta uma política clara de Universidade Publica neste país, quando me refiro a pública é aquela que oferece vagas suficientes para que o aluno pobre não desembolse o pouco recurso que possui, ou que subsidie por completo o curso em Universidade particular. Recurso nós temos: petróleo, do Pré Sal.

De nada adianta promovermos universidades populares, se nem o recurso pouco necessário a grande maioria possui, vez que muitos sustentam famílias oferecendo seu quinhão de colaboração em casa. Nos depararmos com o fato de que entre os jovens de 18 a 24 anos, 64,4% não estudam mais, é desastroso. Mais uma vez no Brasil falta coragem para enfrentar desafios educacionais, e nesse ponto realmente o governo não cresceu, temos muito que fazer.

Os Jovens do Morro e os do Asfalto

Sempre ficamos indignados quando surgem conflitos nos morros, principalmente no Rio de Janeiro, mas a verdade é que refletimos muito pouco sobre por que atingimos este estado mórbido social e sobre suas causas. Muito já se falou da falta de permeabilidade do Estado nas comunidades, da injustiça social que reina nos morros e da omissão do Poder Público em assistir aos pobres. Com efeito, o somatório de todos esses fatores contribuiu para que atingíssemos tais níveis de violência.

A par desses fatores, a falta de uma política coordenada e sistemática de combate ao crime concorreu para que a delinquência organizada formasse um Estado paralelo de difícil controle. Temos que admitir que os órgãos de repressão agem e atuam de acordo com a lei, em respeito aos dizeres da nossa Constituição, e tornam, de certa forma, o Estado repressor limitado e incapaz de combater a criminalidade na nossa sociedade, em face da ousadia dos marginais.

O ponto central desta questão está, de um lado, no Estado Democrático de Direito, nas garantias individuais da pessoa humana, na democracia em si, e, de outro, na atuação da polícia, sempre focada no ponto de vista legal. Assim, as únicas medidas possíveis de acabarmos de vez com a criminalidade passam a ser de longo prazo, como o aumento da participação do Estado nas comunidades carentes, a promoção da inclusão social dos jovens da periferia e a conscientização de que, quando acompanhadas da real oportunidade de emprego e do desenvolvimento pessoal, a cultura e a educação são mais vantajosas que adentrar para o mundo do crime.

Diante dos fatos, é essencial acreditar que uma educação fundamental, composta de valores cívicos e religiosos, aliada à participação maciça do Estado na erradicação da miséria, poderá fazer com que a repressão, nos limites da lei, seja o suficiente. Desse modo, talvez alguns pobres jovens dos morros e dos asfaltos não desistam do bom caminho com tanta facilidade, rechaçando os fuzis e abraçando os livros, contribuindo, assim, para um Brasil melhor, que dependa, é claro, muito mais da boa vontade de um Estado justo e provedor do que da nossa omissa indignação diante das notícias.

Fernando Rizzolo

“Chega de corrupção e rolo, para deputado federal Fernando Rizzolo- PMN 3318”