O animais e os conflitos da humanidade

*por Fernando Rizzolo

Não há nada mais digno de ser apreciado a cada dia que passa, com todo o avanço tecnológico que vivemos, do que o olhar de um cão para seu dono. É verdade que muitos ainda não tiveram a oportunidade de conviver com um animal de estimação, ou definitivamente não gostam do convívio – o que não lhes dá o direito de maltratá-los. Mas, mergulhado nesse universo dos dias de hoje, no avanço das comunicações, das informações, do consumo desenfreado, é incrível como nada é capaz de substituir essa antiga relação entre os animais e os seres humanos.

Neste último mês, fiquei muito sensível às notícias sobre o comportamento dos cães, na atualidade, hoje por demais humanizados; talvez pelo fato de ter recentemente perdido meu cão de estimação, chamado Brutus, um fila-brasileiro que durante treze anos esteve ao meu lado, tive de me conformar, buscando compreensão sobre o papel afetivo dessa nossa relação com os animais. Fiquei comovido com a notícia sobre um cachorro em uma aldeia na província de Shandong, na China, que ficou guardando o túmulo de seu dono. O animal pertencia a Lao Pan, que morreu no início de novembro, aos 68 anos, de acordo com reportagem da emissora de TV Sky News. Por sete dias o cão foi visto ao lado da sepultura, e, como o animal estivesse sem comer, moradores o levaram de volta à aldeia e lhe deram comida. No entanto, o cachorro voltou para o cemitério – mais de uma vez. Incrível…

Nesse esteio de fatos, foi revelado também que cada vez mais cães militares sofrem de estresse pós-traumático. Segundo o médico veterinário Dr. Burghardt, chefe do departamento de medicina comportamental no Hospital Militar de Cães estadunidense com base na Holanda, estimativas mostram que mais de 5% dos 650 cães militares enviados pelo governo americano às regiões de combate desenvolveram estresse pós-traumático, o que os tornou mais agressivos, ou mais dependentes e inseguros.

Num mundo em que há tantos valores deteriorados, tantos conflitos que geram guerras, desentendimentos, egoísmo, e falta de solidariedade, temos muito o que aprender com os animais, que desde as épocas mais remotas estiveram ao nosso lado, oferecendo sua lealdade, sua força, e nos instigando a refletir sobre a nossa incapacidade como seres humanos de administrar nossos conflitos de forma pacífica. Com efeito, desde a antiguidade usamos a resignação equina para promovermos guerras, levando conosco os cavalos a participar dos massacres da nossa espécie. Costumo dizer que história da humanidade foi construída com a figura equina sempre posta, leal e disposta a nos servir, mesmo diante de nossas contradições.

A grande verdade é que a humanidade, quer por conscientização ou através de legislação, enxerga os animais como nossos companheiros nesta jornada por esta vida. É um alívio ver que violências institucionais, ou individuais, como a praticada com o cão da raça rottweiler, chamado Lobo, que foi arrastado por ruas de Piracicaba (interior de São Paulo) pelo próprio dono, sejam punidas com penas mais severas. Soube que esse cão, o Lobo, também morreu, mas, com certeza, seu dono não foi visitá-lo nem deixou uma rosa no seu túmulo. Essa é a diferença entre um lobo e um ser humano….

Cana atinge 70% da lavoura paulista e governo barra expansão

Preocupado com o forte avanço da cana-de-açúcar, o governo de São Paulo promete endurecer as regras para instalação de novas usinas ou ampliação das já existentes. Levantamento das Secretarias do Meio Ambiente e da Agricultura, que vai mapear as regiões com restrições à expansão da atividade, deverá ser concluído até o dia 18, quando entram em vigor as novas regras. Leia reportagem completa na edição deste domingo do Estado.

De acordo com o secretário do Meio Ambiente, Xico Graziano, os canaviais, que no início da década respondiam por menos de 50% do espaço ocupado por lavouras no território paulista, hoje já se espalham por quase 70% da área plantada – excluindo as pastagens.

Considerando o total de 1,2 milhão de hectares previstos nos 31 empreendimentos aprovados ou em fase de aprovação no governo, a área com cana deve passar dos atuais 4,9 milhões de hectares para 6 milhões de hectares em 2010. O Estado tem 19 milhões de hectares de terras agricultáveis, dos quais 9 milhões são ocupados por pastagens. Também responde por mais de 60% de toda a cana produzida no País e algumas regiões já se encontram “saturadas” por canaviais.

Conforme a unidade de território usada no levantamento do governo paulista, a região onde há maior concentração de cana é a Bacia Hidrográfica do Baixo Pardo/Grande, que inclui os municípios de Barretos, Bebedouro, Orlândia e Terra Roxa, entre outros. Nessa região, os canaviais dominam 59% da área total, que soma 641,7 mil hectares.

Outra faixa onde a predominância da cana preocupa é a da Bacia Hidrográfica do Tietê/Jacaré, que está com 42% da área (1,4 milhão de hectares) ocupada por canaviais. Entre os municípios da região estão Dois Córregos, São Carlos, Jaú, Bocaina, Barra Bonita e Brotas.

A União da Indústria da Cana-de-Açúcar (Unica) informou, por meio de sua Assessoria de Imprensa, que só vai se manifestar sobre o assunto depois que as novas diretrizes forem publicadas pelo governo estadual.
Agência Estado

Rizzolo: Não resta a menor dúvida que a expansão do cultivo da cana-de-açúcar deve ser regulamentada, não só do ponto de vista das áreas em si, mas também deve haver um planejamento estratégico que envolve todas as questões referentes à natureza da cultura, como a territorialidade, a mão-de-obra que está ameaçada pela mecanização, uma política de formação da mão-de-obra da lavoura da cana. A racionalidade do plantio nada tem a ver com discursos ambientalistas ou de cunho ideológico como os apregoados por Fidel, mas sim de um planejamento cauteloso e racional, onde e em que tipo de terra a cultura deve ser priorizada. Já escrevi vários artigos em relação a esta questão, que envolve o valor das terras, o problema do ponto de vista da saúde da mão-de-obra, das condições de trabalho, das queimadas, e acima de tudo em relação aos investimentos maciços do exterior, no que se refere a compra das usinas. As questões que envolvem o cultivo da cana-de-açúcar merece um amplo debate na sociedade e agora é o momento. Leia artigo meu publicado pela Pastoral do Migrante da CNBB

A alta das commodities e da devastação

Um dos grandes desafios da atualidade, é como manter um nível de desenvolvimento e ao mesmo tempo preservar o meio ambiente. Essa questão atinge em maior impacto países como o Brasil, que possuem extensa área de cultivo e florestas que necessitam ser preservadas a todo custo.

Seria um excesso de ingenuidade, acreditarmos que o governo tem possibilidade de controlar a evolução do agronegócio, aquecido e impulsionado por financiamentos, e pela demanda internacional expressada nos altos preços das commodities agrícolas, minerais, e ambientais, cujos valores se sustentam em bons índices no mercado internacional. Com efeito, a elevação dos preços de pelo menos duas commodities, soja e carne, tiveram sim, participação no crescimento da derrubada ilegal de árvores; corroborando este fato, observarmos que um dos fatores que foram apontados para a diminuição do desmatamento, foi a queda nos preços internacionais. Mas só esses fatos não justificariam o problema ambiental.

As medidas de contenção como o bloqueio de financiamento público para atividades que desmatem, atingirá os créditos do Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar), um dos mais propalados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, além de financiamentos do Banco do Brasil, do BNDES e do Basa (Banco da Amazônia). Contudo, grande parte dessa devastação não e promovida pela pobre agricultura familiar, e sim, pela recuperação financeira do agronegócio, vez que, para se fazer devastação é necessário estar capitalizado.

Agora a grande questão, é saber de que forma poderemos ser grandes fornecedores de desses produtos em alta no mercado, e, ao mesmo, atuarmos numa “fina dosemetria” para que os excessos não sejam cometidos; esse é o grande desafio. Não há dúvida, muito embora românticos insistam em afirmar ao contrário, que o agronegócio vai cada vez mais prevalecer no Brasil, até porque, no ano passado o setor absorveu R$ 40 bilhões de reais em créditos. Apesar do governo tutelar com incentivos à agricultura familiar, ela é difusa, não organizada, e os recursos acabam não chegando de forma devida aos trabalhadores, face à burocracia.

A estrutura conceitual do agronegócio, passa mais por volume, produção e eficiência, e não há como negar que em razão disso, a balança comercial do agronegócio fechou o ano de 2007 com um saldo recorde: US$ 49,7 bilhões. Este valor foi alcançado graças ao desempenho das exportações do setor que atingiram a cifra de US$ 58,4 bilhões – 18,2% superior ao ano de 2006, contra US$ 8,7 bilhões das importações – resultado tanto do aumento dos volumes (5,6%) quanto dos preços (12%).

Um dos fatores de desenvolvimento não só do Brasil, mas de toda a América Latina é, sem dúvida, exclusivamente graças a fatores externos, como a expansão da economia mundial e os altos preços das commodities, e isso a meu ver é preocupante. Não podemos resumir nossa economia, e ficar de todo dependente das commodities, que impulsionam o valor das nossas exportações em virtude das demandas por estes produtos, principalmente pelos países asiáticos; surtos externos de crescimento, não vão durar para sempre.

De forma racional e sincera, o governo deve admitir suas falhas quando impõe totalmente as causas da devastação aos valores atribuídos internacionalmente às commodities, isso, na verdade, não justifica a intempestividade em aferir os danos causados ao meio ambiente. O que falta na realidade, é menos eufemismos e bravatas por parte da ministra do Meio Ambiente Marina Silva, e mais competência no monitoramento das áreas, para prever a tempo os danos não só causados pelo mercado internacional de commodities, mas face a problemas de ordem “técnica”.

Fernando Rizzolo

O meio ambiente não é (só) caso de polícia

O problema, entretanto, é quando as pessoas de bem precisam se transformar em malfeitores para garantir um amanhã melhor para si e sua família

Enquanto o presidente da República dava ontem tratos à bola no difícil tema do desmatamento recorde da Amazônia, o mundo tomava conhecimento de que a economia chinesa cresceu estonteantes 11,4% em 2007. E o Brasil descobria que o desemprego interno despencou para 7,4% em dezembro. O que o primeiro assunto tem a ver com os dois últimos? Tudo. O avanço do Brasil sobre a Amazônia não ocorre porque os brasileiros são maus ou não gostam da natureza. A exploração econômica da região progride porque a demanda por alimentos está aquecidíssima. Árvores são derrubadas para criar gado e plantar soja. Com um agravante: a expansão da cana-de-açúcar para produzir etanol na porção meridional do país empurra ainda mais outras culturas para o Brasil setentrional.

A principal ficção difundida pelo presidente da República em seu novo papel de garoto-propaganda do etanol brasileiro no mundo é que há terra sobrando aqui para plantar cana. E que, portanto, podemos muito bem expandir a oferta de álcool sem pressionar o preço dos alimentos ou cortar árvores. É a teoria palaciana das terras infinitas. Tese que não agüenta um sopro. Já perguntamos nesta coluna e repetimos a indagação: se está sobrando terra degradada (improdutiva) para plantar cana, por que falta terra para a reforma agrária? O pessoal do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) pede há anos que o Palácio do Planalto autorize a portaria que moderniza os índices de produtividade, para aumentar o estoque disponível para a democratização da propriedade rural. E nada de o Planalto se mexer.

A explosão do desmatamento é responsabilidade exclusiva do governo Lula e de quem o comanda. A administração federal divide-se entre os adeptos incondicionais do agronegócio e os militantes de um preservacionismo amazônico radical e utópico. Esses dois vetores, aparentemente opostos, na verdade potencializam-se. Ao não se lançar com ímpeto e determinação numa empreitada para tornar viável a exploração econômica racional da Amazônia, o governo petista aparece nos primeiros capítulos como o mocinho da novela. Mas, visto que é impossível ludibriar todos o tempo todo (já advertia Winston Churchill), um dia os números frios vêm à luz e a realidade se impõe: em resumo, a Amazônia brasileira está à mercê do latifúndio do século 21.

E assim continuará, enquanto o presidente da República estiver mais preocupado com o que pensam dele em Paris do que em Roraima. Quantas vezes Lula foi a Roraima desde que tomou posse em 1º de janeiro de 2003? Alguém sabe? Ontem, a cúpula do governo reuniu-se em palácio para discutir o aumento da repressão ao desmatamento ilegal. Ótimo. Mas será que o governo imagina solucionar o problema unicamente com o uso de força policial? A questão ambiental não é somente caso de polícia. Enquanto a árvore derrubada representar a criação de um valor maior do que mantê-la de pé, as estatísticas prosseguirão sua caminhada cruel. O homem se move pela busca da riqueza. Bloquear esse movimento sem oferecer opções é como construir um barragem de rio sem vertedor. Chega uma hora em que a força da água leva tudo de roldão.

Para evitar uma catástrofe na Amazônia, o Brasil precisa escapar do discurso catastrofista. Veja-se, por exemplo, o caso do aquecimento global. Se as teorias a respeito do assunto estiverem corretas, é provável que a elevação da temperatura no planeta acabe contribuindo mais para a extinção das florestas tropicais do que o contrário. O catastrofismo também preocupa por outra razão: do jeito que a coisa vai, daqui a pouco aparece alguém propondo um “Plano Brasil”, nos moldes do Plano Colômbia. Ali, justifica-se a presença de tropas americanas em nome do combate ao narcotráfico. Aqui, certamente haverá quem proponha chamar os marines para tentar salvar o ecossistema amazônico.

A Amazônia tem salvação. Ela está na expansão civilizada do homem, com base na agricultura e na pecuária familiares, no zoneamento ecológico-econômico e na produção científica com o aproveitamento da biodiversidade. A ação policial será sempre importante, como em todo lugar, para combater as ilegalidades e separar os malfeitores das pessoas de bem. O problema, entretanto, é quando as pessoas de bem precisam se transformar em malfeitores para garantir um amanhã melhor para si e sua família.

Por Alon Feuerwerker
Blog do Alon

Rizzolo: A política de incentivo do agronegócio faz com que a desmatamento de lugar a produtos relacionados aos commodities que estão em alta no mercado internacional. Uma política que não seja a policialesca como diz o texto poderia, uma vez bem planejada, conter esse desmatamento. Como apregoar o agronegócio, e ao mesmo tempo detê-lo? Eis a questão. Com crise americana e internacional a questão do ” afrouxamento” dos subsídios agrícolas perpetrados pelos países ricos parece potencializar essa questão. O perigo, é que quando falamos em meio ambiente, em Amazônia, os mariners ficam excitados, e os republicanos esperam o pretexto se cristalizar, para enfim, um dia darem o bote.