Brasil tem recorde de remessa de lucros e investimento dos EUA

Múltis drenaram US$ 21 bi do Brasil para suas matrizes

Remessa de lucros em 2007 foi recorde e também o “investimento direto estrangeiro”

Os dados divulgados no último dia 28 pelo Banco Central sobre a remessa de lucros e o “investimento direto estrangeiro” durante o ano passado mostraram onde residem os problemas do Brasil para que não seja afetado por uma crise que não é sua, que não provocou e que não tem necessidade alguma de importar ou de se submeter a ela.

Todas as crises no centro do sistema sempre foram uma excelente oportunidade para que os países da periferia desse sistema crescessem e implementassem o caminho do desenvolvimento e justiça social. Foi assim em 1930, onde inauguramos um ciclo de crescimento que iria preencher as décadas seguintes, e até na crise de 1973/74 – onde mesmo a ditadura percebeu o espaço, desenvolvendo o nosso setor de máquinas e equipamentos, antes fundamentalmente externo, e o país cresceu. E será assim nesta crise, se basearmos nosso crescimento firmemente no mercado interno. Exatamente por isso os dados anunciados pelo BC são ilustrativos dos problemas que necessitamos resolver.

LUCROS

A remessa de lucros para o exterior em 2007 foi de US$ 21,2 bilhões. Em 2006, havia sido de US$ 16,3 bilhões. O que representa uma escalada, aumentando sucessivamente de US$ 6,4 bilhões (2003) para US$ 8,2 bilhões (2004), US$ 10,6 bilhões (2005), US$ 16,3 bilhões (2006) e US$ 21,2 bilhões (2007). Ou seja, desde 2003 as remessas de lucros das empresas estrangeiras para o exterior – sem contar as formas maquiadas de enviar lucros – mais do que triplicou. Em relação ao ano anterior, as remessas de lucros em 2007 aumentaram 30%. Quanto a 2008, em apenas 28 dias as empresas estrangeiras enviaram US$ 2,1 bilhões para suas sedes.

Tal aumento de remessas se dá, exatamente, quando se prevê, neste ano, uma redução no saldo comercial de US$ 10 bilhões (de US$ 40 bilhões para US$ 30 bilhões). As remessas, que já são mais da metade do saldo comercial (exportações menos importações), tendem a aumentar em razão da entrada do “investimento” estrangeiro, ou seja, da tomada de setores da economia pelo capital externo. Ao mesmo tempo, o nosso saldo comercial tende a diminuir, devido à própria crise nos países centrais. O que mostra que esse quadro não é sustentável.

O “investimento direto estrangeiro”, isto é, o dinheiro externo para comprar empresas, aumentar a participação acionária externa ou turbinar empresas estrangeiras já instaladas aqui, subiu para US$ 34,6 bilhões. Em 2003, foi de US$ 10,1 bilhões; em 2004, US$ 18,1 bilhões; em 2005, US$ 15,1 bilhões; e, em 2006, US$ 18,8 bilhões. Ou seja, o dinheiro estrangeiro para dominar setores da economia por pouco não dobra em apenas um ano e, em relação a 2003, da mesma forma que a remessa de lucros, mais do que triplicou.

Quanto a esse último dado, há quem ache que ele mostra o “vigor” da nossa economia e que isso é muito bom para o país. Portanto, deveríamos abrir as portas, senão outras dependências mais íntimas, para que esse dinheiro estrangeiro invada o país – e, em seguida, comemorar efusivamente. Daí a importância que vêem no chamado “investment grade”, uma classificação das “agências de risco” – todas, braços de bancos americanos que zelam pela segurança dos especuladores, perdão, “investidores”.

Do jeito que falam nesse “investment grade”, parece até que a Polônia, a Tunísia, a Bulgária e a Romênia, países contemplados com a prebenda, conseguiram alguma coisa com ele, além de ter sua economia transformada numa economia externa, dirigida de fora, saqueada de fora, parasitada desde fora e com lucros enviados para fora. Além disso, esses países conseguiram rebaixar o salário real dos trabalhadores e aumentar o desemprego – pois esse é o efeito de ter monopólios industriais e financeiros externos operando à solta numa economia. O “investment grade” é, precisamente, uma carta de imunidade para que esses monopólios entrem num país.

O estouro na remessa de lucros é suficiente para perceber quais são as conseqüências dessa cegueira – ou quais podem ser, pois, apesar de tudo, o Brasil não é um país em bancarrota como a Polônia ou a Romênia, e esperemos que nunca seja.

Não por acaso, o “investimento direto estrangeiro” sempre foi considerado parte do “passivo externo” do país, assim como a dívida externa. Simplesmente porque ele significa que ativos aqui existentes deixaram de ser ativos brasileiros. Logo, em relação ao país, passaram a ser passivos, transferindo recursos nossos para fora, sob a forma sobretudo de lucros. Funcionam, portanto, como uma dívida, tirando recursos do país, ao invés de aportá-los, como faria um empreendimento nacional. É verdade que, ao contrário da dívida, esse desvio de recursos não tem fim à vista.

Não se trata, evidentemente, de uma questão meramente ideológica de patriotismo, sem base na realidade. Ao contrário, trata-se de uma questão muito prática. A solução não é impedir que haja qualquer capital estrangeiro no país. Subordinadas aos interesses do povo e do país, não há porque não admitir a existência de empresas estrangeiras aqui dentro.

No entanto, não existe país viável sem economia própria, isto é, de propriedade principalmente – ainda que não exclusivamente – nacional. Por que não existe? Entre outras razões porque, se a economia for propriedade principalmente de elementos externos, na primeira crise que houver o país será arrasado, escalpelado e esfolado, pois o primeiro interesse desses proprietários externos será arrancar daqui o que puderem para cobrir os rombos na economia do país deles.

Além disso, os objetivos de justiça social – maior distribuição de renda, maior salário real, mais emprego – são incompatíveis com o domínio da economia por monopólios. O que se chama de “investimento direto estrangeiro” é, precisamente, a entrada de monopólios estrangeiros para açambarcar ramos da economia do país e, no limite, o conjunto da economia. A conseqüência da monopolização, em especial se os monopólios não são do próprio país, é a concentração de renda, o salário baixo e o desemprego endêmico, pois é impossível ao monopólio realizar seu objetivo – o de extrair superlucros – sem que essa seja a conseqüência.

Por essa razão, uma enxurrada de “investimento direto estrangeiro” só é uma boa notícia para quem acha que os capitalistas dos EUA são franciscanos e não capitalistas.

JUROS

No ano passado, entraram US$ 47,97 bilhões (entrada líquida, já descontado o que saiu), para especular na Bolsa ou com títulos do governo. Para isso, o sr. Meirelles manteve os juros nas alturas, sacrificando trabalhadores e empresários nacionais. Logo ao primeiro rebate da crise nos EUA, esse dinheiro começou a sair. Daí a queda na Bolsa aqui no país.

Apesar disso, não há nenhuma inevitabilidade no estouro das contas do país. Pelo contrário, nunca, nos últimos anos, a situação foi tão favorável para que possamos crescer – até porque somos dos poucos países do mundo que contam com um mercado interno potencial enorme, além de amplos recursos naturais.

Certamente, isso significa aumentar o poder aquisitivo da população, aumentar o crédito – inclusive o financiamento às empresas – e avançar em áreas onde, até agora, permanecemos dependentes de importações. Nossa sorte é que foi para isso mesmo que nós elegemos o presidente Lula.

Há alguns anos, alguns débeis mentais – quase todos tucanos de primeira hora ou seus apologistas da mídia – pregavam que não havia diferença entre uma empresa nacional e uma estrangeira aqui instalada. Pois existe. Uma delas é que a empresa nacional não remete bilhões de dólares em lucros para fora do país. Outra é que ela não devasta o país para remeter recursos quando uma crise bate às portas do seu país de origem – simplesmente porque seu país de origem é o Brasil. Ou seja, ela não é um parasita da economia alheia. Não é pouca diferença, amigo leitor.

CARLOS LOPES
Hora do Povo

Rizzolo:O importante nessa análise, por sinal brilhante do jornalista Carlos Lopes, é que na medida em que os investimentos externos momentaneamente desafogam a economia, gerando uma sensação de empregabilidade, ela por outro lado, face a falta de uma política mais restritiva em relação às remessas de lucros acaba sendo prejudicial. Falta no Brasil, uma forte disposição em alavancar a nossa indústria nacional; uma coisa é certa, se estão investindo mais em determinados setores da economia, é porque na verade, é vantajoso, estão embasados nos ” investment grade” que os asseguram o bom negócio.

O capital estrangeiro nesses setores “avalizados” pelas ” agências de risco, por pouco não dobra em apenas um ano. Na realidade o IDE( investimento direto estrangeiro) deve ser considerado, sim, passivo externo, até porque não temos como mante-lo sob controle. Temos que desenvolver o parque industrial nacional e gerar um mercado interno forte robusto contando também, é claro com o capital externo, que é importante e necessário, porém, com maior controle e parcimônia, não se trata de nacionalismo infantilóide, mas gestão de interesses nacionais.