Confronto com arrozeiros deixa 10 índios feridos a bala em Roraima

Dez índios das etnias macuxi e ingaricó foram feridos a bala ontem na terra indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, após tentativa de ocupação da Fazenda Depósito, do rizicultor Paulo César Quartiero, prefeito do município de Pacaraima e líder da mobilização de produtores contra a demarcação da reserva. O conflito ocorre 26 dias depois da suspensão da Operação Upakaton 3 da Polícia Federal, destinada a retirar os não-índios da área. A ação da PF foi interrompida por liminar concedida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no dia 9 de abril.

A Fazenda Depósito fica a sete quilômetros de Surumu, localidade a 160 quilômetros de Boa Vista que concentra os conflitos entre índios e não-índios pela posse da reserva de 1,7 milhão de hectares. Às 5 horas, um grupo de 103 indígenas, entre homens e mulheres, iniciou a ocupação de uma área da fazenda livre de plantação de arroz e afastada da sede. Em pouco tempo, eles construíram quatro malocas com palha e madeira. Dois funcionários de Quartiero chegaram ao local em motos e ordenaram a saída dos índios. Diante da negativa, foram embora e retornaram com mais quatro funcionários, em três motos e uma caminhonete.

“Eles já chegaram atirando, sem dar chance de defesa às vítimas”, afirmou Júlio Macuxi, coordenador de programas do Conselho Indígena de Roraima (CIR). Ele disse que a ocupação se deu pela necessidade de ampliação da comunidade Renascer, próxima à cerca da fazenda, que estaria “sufocada”.

Quartiero sustentou que não estava na fazenda no momento do conflito, mas foi informado por seus funcionários de que os índios teriam invadido sua fazenda armados de cassetetes e de arco e flecha. “Os funcionários disseram que, quando tentaram retirá-los, eles atiraram flechas. Então houve reação.”

SOCORRO

Os tiros foram disparados de espingardas calibre 16. A PF abriu inquérito para investigar o caso e prestou o primeiro atendimento aos feridos. Sete foram levados para o hospital de Pacaraima. Os demais, Glênio Barbosa, 22 anos, João Ribeiro, 30, e Antônio Kleber da Silva, 25, foram removidos em avião da Fundação Nacional de Saúde (Funasa) para Boa Vista.

O médico Renerys Pinheiro, que atendeu os três no Pronto-Socorro Francisco Elesbão, disse que os ferimentos são leves e os indígenas receberão alta ainda hoje. Glênio é ingaricó e foi atingido com estilhaços de chumbo no nariz, no lado esquerdo do rosto, no tórax e na perna. João Ribeiro teve um ferimento na perna e Antônio Kleber foi atingido no tórax e no abdômen. Os dois são da etnia macuxi.

O episódio de ontem não intimidou o Conselho Indígena de Roraima, que pretende continuar a ocupação da Fazenda Depósito. Os índios não aceitam a posse de Quartiero nem dos seis rizicultores que permanecem na área. Para eles, os produtores é que são os “invasores”.

“Esse ataque é uma afronta à Constituição e ao Supremo Tribunal Federal, mas não intimida as comunidades. Ao contrário, só fortalece os indígenas da Raposa Serra do Sol e de todas as comunidades de Roraima”, disse o índio Júlio Macuxi. Ele ressaltou que vai reforçar o pedido de segurança feito há um mês, e exigir que a PF desarme o que ele classificou de “milícia”.

RESISTÊNCIA

A tensão na Raposa Serra do Sol recrudesceu com a Operação Upakaton 3. Comandados por Quartiero, os arrozeiros patrocinaram protestos e atos de sabotagem, que incluíram até a destruição de pontes, para impedir a entrada dos policiais nas fazendas.

Em meio à mobilização da PF, o Supremo determinou em 9 de abril a suspensão da retirada dos não-índios. O STF decidirá se a demarcação da reserva deve ser contínua ou dividida. A Raposa constitui área contínua de 1,7 milhão de hectares, na fronteira do Brasil com a Venezuela. Nela vivem cerca de 20 mil índios.
Agência Estado

Rizzolo: Já comentei várias vezes sobre essa questão indígena em Roraima, e a situação fica mais estranha agora, até porque me parece que no auge da tentativa de defender seus interesses, os grupos ” especializados” em ” incitar índios” começaram a agir com o puro intuito de fabricarem cadáveres. Ora, todo munda sabe que esses índios, que não são índios comuns, são militantes do Conselho Indígena de Roraima, que acabam sendo manipulados por aqueles que se dizem ” protetores da selva”, os chamados ongueiros internacionais, ou se quiserem, também incitados pelos chamados ” missionários” que de missionários nada tem, tudo para intimidar o Supremo, e faze-lo curvar-se aos seus desígnios.

A situação é clara, na argumentação desse pessoal, gerar um conflito vai de encontro aos seus interesses. Quem começou tudo ? Sinceramente, gostaria de fazer uma pergunta ao leitor. Se você fosse proprietário de uma fazenda – mata fechada- fronteira com países problemáticos, sabendo que existe inclusive perigo de adentrar grupos de guerrilha, você deixaria um grupo de índios – inimputáveis – tomarem conta da sua propriedade, sem o seu menor controle? Lógico que não. Pois é, o governo brasileiro os deixam à vontade, e o pior, membros petistas ficam melindrados quando os patriotas contestam, como o general Heleno. E tem mais, tem muito caboclo que acabou descobrindo que ser índio é um bom negócio, tem até índio com rosto de ator da Globo.

O meio ambiente não é (só) caso de polícia

O problema, entretanto, é quando as pessoas de bem precisam se transformar em malfeitores para garantir um amanhã melhor para si e sua família

Enquanto o presidente da República dava ontem tratos à bola no difícil tema do desmatamento recorde da Amazônia, o mundo tomava conhecimento de que a economia chinesa cresceu estonteantes 11,4% em 2007. E o Brasil descobria que o desemprego interno despencou para 7,4% em dezembro. O que o primeiro assunto tem a ver com os dois últimos? Tudo. O avanço do Brasil sobre a Amazônia não ocorre porque os brasileiros são maus ou não gostam da natureza. A exploração econômica da região progride porque a demanda por alimentos está aquecidíssima. Árvores são derrubadas para criar gado e plantar soja. Com um agravante: a expansão da cana-de-açúcar para produzir etanol na porção meridional do país empurra ainda mais outras culturas para o Brasil setentrional.

A principal ficção difundida pelo presidente da República em seu novo papel de garoto-propaganda do etanol brasileiro no mundo é que há terra sobrando aqui para plantar cana. E que, portanto, podemos muito bem expandir a oferta de álcool sem pressionar o preço dos alimentos ou cortar árvores. É a teoria palaciana das terras infinitas. Tese que não agüenta um sopro. Já perguntamos nesta coluna e repetimos a indagação: se está sobrando terra degradada (improdutiva) para plantar cana, por que falta terra para a reforma agrária? O pessoal do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) pede há anos que o Palácio do Planalto autorize a portaria que moderniza os índices de produtividade, para aumentar o estoque disponível para a democratização da propriedade rural. E nada de o Planalto se mexer.

A explosão do desmatamento é responsabilidade exclusiva do governo Lula e de quem o comanda. A administração federal divide-se entre os adeptos incondicionais do agronegócio e os militantes de um preservacionismo amazônico radical e utópico. Esses dois vetores, aparentemente opostos, na verdade potencializam-se. Ao não se lançar com ímpeto e determinação numa empreitada para tornar viável a exploração econômica racional da Amazônia, o governo petista aparece nos primeiros capítulos como o mocinho da novela. Mas, visto que é impossível ludibriar todos o tempo todo (já advertia Winston Churchill), um dia os números frios vêm à luz e a realidade se impõe: em resumo, a Amazônia brasileira está à mercê do latifúndio do século 21.

E assim continuará, enquanto o presidente da República estiver mais preocupado com o que pensam dele em Paris do que em Roraima. Quantas vezes Lula foi a Roraima desde que tomou posse em 1º de janeiro de 2003? Alguém sabe? Ontem, a cúpula do governo reuniu-se em palácio para discutir o aumento da repressão ao desmatamento ilegal. Ótimo. Mas será que o governo imagina solucionar o problema unicamente com o uso de força policial? A questão ambiental não é somente caso de polícia. Enquanto a árvore derrubada representar a criação de um valor maior do que mantê-la de pé, as estatísticas prosseguirão sua caminhada cruel. O homem se move pela busca da riqueza. Bloquear esse movimento sem oferecer opções é como construir um barragem de rio sem vertedor. Chega uma hora em que a força da água leva tudo de roldão.

Para evitar uma catástrofe na Amazônia, o Brasil precisa escapar do discurso catastrofista. Veja-se, por exemplo, o caso do aquecimento global. Se as teorias a respeito do assunto estiverem corretas, é provável que a elevação da temperatura no planeta acabe contribuindo mais para a extinção das florestas tropicais do que o contrário. O catastrofismo também preocupa por outra razão: do jeito que a coisa vai, daqui a pouco aparece alguém propondo um “Plano Brasil”, nos moldes do Plano Colômbia. Ali, justifica-se a presença de tropas americanas em nome do combate ao narcotráfico. Aqui, certamente haverá quem proponha chamar os marines para tentar salvar o ecossistema amazônico.

A Amazônia tem salvação. Ela está na expansão civilizada do homem, com base na agricultura e na pecuária familiares, no zoneamento ecológico-econômico e na produção científica com o aproveitamento da biodiversidade. A ação policial será sempre importante, como em todo lugar, para combater as ilegalidades e separar os malfeitores das pessoas de bem. O problema, entretanto, é quando as pessoas de bem precisam se transformar em malfeitores para garantir um amanhã melhor para si e sua família.

Por Alon Feuerwerker
Blog do Alon

Rizzolo: A política de incentivo do agronegócio faz com que a desmatamento de lugar a produtos relacionados aos commodities que estão em alta no mercado internacional. Uma política que não seja a policialesca como diz o texto poderia, uma vez bem planejada, conter esse desmatamento. Como apregoar o agronegócio, e ao mesmo tempo detê-lo? Eis a questão. Com crise americana e internacional a questão do ” afrouxamento” dos subsídios agrícolas perpetrados pelos países ricos parece potencializar essa questão. O perigo, é que quando falamos em meio ambiente, em Amazônia, os mariners ficam excitados, e os republicanos esperam o pretexto se cristalizar, para enfim, um dia darem o bote.