Liderança é servidão e não poder

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Moisés e Aron pedindo libertação ao Faraó

Como de costume, todo Sábado procuro não escrever textos que não estejam relacionados com o Shabbat e com o estudo da Tora. Sem ter a intenção de dar uma conotação pessoal religiosa ao que escrevo, permito dirigir me a você, que acompanha minhas reflexões diariamente, compartilhar com o amigo(a), de uma forma humilde, esses momentos de introspecção dos meus estudos no Shabbat, que se iniciam todas às sextas-feiras, quando me recolho duas horas antes da primeira estrela surgir no céu, numa Sinagoga ortodoxa que freqüento em São Paulo.

Como já disse anteriormente, tenho profundo respeito por todas as crenças, religiões, e acima de tudo sou um brasileiro patriota, amo meu país e o povo brasileiro, e tenho sim, uma grande satisfação espiritual em ao estudar a Parashá (Porção da Tora semanal) relacioná-la ao que vivemos nos dias atuais. Parte das informações da Torah, são do Beit Chabab.

Como é uma reflexão de estudo pessoal, baseada na introspecção bíblica, recomendo a todos que acompanhem no Antigo testamento (Torah ) os comentários aqui expostos, para que possamos ter uma semana de paz; e que através dos estudos judaicos, possamos compreender nossas vidas e encontrar formas de superar as adversidades na visão de Hashem (Deus). Isso nos dará energia e um “Idiche Kop” ( perspicácia particular), para que enfim tenhamos condições de construir um Brasil cada vez mais digno e com mais justiça social, que é a base do Judaísmo, do Cristianismo, do Islamismo, e de todas as religiões que levam a um mesmo Deus.

E lembre-se, Deus não quer apenas que você ore, mas que você aja com um parceiro dele aqui neste mundo, promovendo mudanças, estudando, se aperfeiçoando cada vez mais em sua área de atuação, e lendo, lendo muito. Quem não lê não pensa, e quem não pensa será para sempre um servo . Nesses aspectos, ele ( Hashem ), precisa mais de você do que você dele. Somos aqui nesse mundo, parceiros de alguém maior.

A Parashat desta semana chama-se Vaera, e começa com D’us afirmando a Moshê que redimirá o povo judeu da escravidão e o conduzirá a liberdade, a Terra que prometeu a Avraham, Yistchac e Yaacov por herança. D’us incumbiu Moshê e Aharon de irem ao encontro do faraó e pedir que liberte o povo de Israel.

Instruiu-os a realizar um milagre, caso o faraó quisesse colocá-los à prova, de tomar a vara e jogá-la para que se transformasse em serpente. E procederam conforme Suas instruções. O faraó chamou seus sábios e feiticeiros e pediu que fizessem o mesmo através de suas magias. Mas a vara de Aharon tragou todas as outras varas enfurecendo o faraó e endurecendo seu coração, não permitindo o povo judeu partir. Iniciam-se então as dez pragas do Egito.

A primeira transformou as águas do Nilo em sangue, causando mal cheiro, morte dos peixes e impossibilitando os egípcios de beber de seus mananciais. Cada vez que o faraó recusava-se em libertar o povo judeu do Egito, D’us enviava uma nova praga. Desta forma sucederam-se as pragas enviadas “com mão forte e braço estendido” de D’us, sobre o Egito: após o sangue, as rãs, os piolhos, animais selvagens, cobras, escorpiões e serpentes, a peste, a sarna, chuva de granizo (gelo e fogo), a cada praga o faraó declarava que se a mesma se extinguisse, deixaria o povo partir. Mas novamente, assim que Moshê rezava para D’us para que parasse de ferir os egipcios, novamente o faraó mudava de idéia não permitindo ao povo partir.

Pêssach é a “Festa de nossa libertação”. Celebra um evento histórico: o Êxodo do povo judeu do Egito. No entanto, nossos Sábios nos ensinam que em toda geração, e em todo e cada dia, devemos nos ver como se tivéssemos acabado de ser liberados do Egito. A implicação é que a liberdade não foi atingida de uma vez por todas. Requer constante vigilância. Cada dia, e cada ambiente, encerra seu próprio Egito – um poder de minar a liberdade de um povo. Talvez a maior ameaça venha de dentro. A convicção que determinadas realizações estão além de nós – a crença forte, confortável, de que a pessoa não nasceu para atingir o auge da vida espiritual. Acreditar nisso é colocar barras ao redor de si mesmo, deixar-se aprisionar por uma ilusão.

” E disse-lhe Deus: Meus filhos são teimosos, desobedientes e resmungões.
Mesmo assim deveis aceitá-los, ainda que vos amaldiçoem e apedrejem ”
Midrash Shemot 7.2

Nos seus primeiros passos como líder de um povo, ao ver revelada sua primeira decepção, Moisés recebe de Deus uma espantosa lição sobre liderança: ” Assim é teu povo! Um povo amargo, resmungão, teimoso, pessimista e de pouca fé. Pois deves aceitá-lo com todos os seus defeitos, amá-lo e libertá-lo do jeito que ele é. É este o povo que deves liderar por momentos grandiosos, dando-lhe respeito e honra, lei e terra embora ciente de que a única recompensa que dele receberá, serão ofensas e pedradas. A liderança de Moisés, é servidão, e não poder. Tenha isto em mente ao iniciares o teu caminho, para evitar decepção no futuro “.

Isso nos mostra que atitudes de governança existem para serem tomadas independentemente de agradar a todos. Trazendo a questão para o nosso momento político, o importante são as atitudes de firmeza como as tomadas com o fim da CPMF. Liderar um povo é ter consciência de que não dá para agradar a todos, é insistir de forma incisiva, na defesa dos interesses dos humildes, dos pobres, daqueles que nada tem; e que por ganância dos poderosos, podem, se fraquezas surgirem por parte dos governantes, ficarem mais necessitados ainda. O conceito judaico de libertação passa pela redenção da humanidade, nos conceitos de justiça social, e de dignidade. Ao nível pessoal, é o momento para que possamos fazer uma reflexão sobre os ” Egitos” que habitam nossas vida, e até que ponto estamos aprisionados a eles; neste caso, temos que ser o próprio Moisés de nós mesmos. Liberte-se do ” Egitos” que existem dentro de você ! E ajude a libertar da escravidão os que padecem no “Egito do abandono”. Aos governantes uma lição: Liderança é servidão, e não poder.

Tenha um Sábado de paz

Fernando Rizzolo