‘Não acredito em Doha’, diz Stephanes

BRASÍLIA – Autoridade máxima da área agrícola do governo Luiz Inácio Lula da Silva, o ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, declarou ontem que não acredita na Rodada Doha de comércio multilateral, da Organização Mundial do Comércio (OMC). Na contracorrente dos esforços em Genebra de seu colega Celso Amorim, chanceler da República, Stephanes argumenta que a Rodada “não servirá para nada” e a demanda por alimentos em expansão provocará inevitavelmente a liberalização dos mercados agrícolas e a redução dos subsídios dos países mais ricos ao setor.

“As negociações podem até chegar a uma saída honrosa. Mas esse acordo não significará nada”, disse o ministro. “A Rodada Doha joga com números, e não com a realidade. Em termos práticos, não há razão objetiva para trazer impacto positivo à agricultura mundial.” Stephanes trabalha com um cenário de expansão da demanda mundial por alimentos na próxima década, com novos choques nos preços internacionais. O mais próximo, previsto para 2010 e 2011. O “mundo de demanda”, em seu ponto de vista, necessariamente forçará os países ricos a reduzir seus desembolsos com os subsídios. Igualmente elevará as pressões internas por mais abertura nos países com estruturas mais protecionistas.

“A liberalização de mercados agrícolas e a redução dos subsídios vão acontecer, inevitavelmente. Não em função de rodadas da OMC, mas por razões de mercado.” Stephanes deixou claro que não expôs seu ponto de vista ao presidente Lula – que se tornou entusiasta da Rodada por influência de Amorim – porque nunca foi solicitado a fazê-lo. Mas, em várias oportunidades, apresentou sua opinião ao chanceler. Para ele, as negociações desta semana podem até chegar a uma saída honrosa, sem impacto efetivo sobre o comércio agrícola mundial. Mas esse acordo não será aceito sem resistência pelos setores industriais do Brasil e do resto do Mercosul, que pagará com redução do atual nível de proteção.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Rizzolo: Existe ainda muito romantismo por parte do governo brasileiro e dos países emergentes em relação a uma postura de abertura ao subsídio agrícola. Utiliza-se ainda um discurso de “países ricos e pobres”, algo que passa meio pelo discurso de injustiça social, e nesse aspecto concordo com Stephanes. Acredito que da forma em que os países emergentes se colocaram, principalmente o Brasil, num discurso ” sindicalesco”, tentando se impor de forma inapropriada, impositora acirrou os embates e travou a negociação.

Na verdade, o próprio mercado poderá sim influenciar as resistências dos países ricos, nada melhor do que a demanda, a expansão para a liberação dos mercados agrícolas; isso para mim significa bom senso, o próprio mercado levará a uma liberação, agora os países emergentes devem também ter uma postura menos protecionista, senão fica tudo nós e nada para eles; até porque os Estados Unidos já limitaram a US$ 15 bilhões à ajuda a seus produtores. O difícil é convencer e levar a uma reflexão um ponto de vista desse quando na visão de muitos, trva-se uma ” luta entre os ricos e os pobres”, aí fica difícil.

Devastação Premiada

Muito já se falou sobre o instituto da delação premiada que é o ato de um acusado, em troca da redução ou até isenção da pena, denunciar outros participantes do crime, indicar a localização da vítima em caso de seqüestro ou contribuir, de alguma forma, para a resolução do caso. Para os cristãos, a delação lembra a traição de Judas Iscariotes. Entregou Jesus a Pilatos em troca de 30 moedas de prata. Para nós que vivemos no Brasil sob o jogo da omissão do governo em relação as questões ambientais, temos em vista agora, uma nova modalidade de incentivo a beneficiar transgressores, desta feita, em versão ambiental: a devastação premiada.

Na tentativa em reduzir e compensar o desmatamento na Amazônia Legal, o governo planeja dar uma anistia a quem ilegalmente derrubou a floresta. É isso mesmo que o leitor leu: anistia. Em estudo nos Ministérios da Agricultura e do Meio Ambiente empresas e agricultores poderão manter 50% das fazendas desmatadas, voltar à legalidade e ter direito ao crédito agrícola oficial se aceitarem recuperar e repor a floresta dos outros 50% das propriedades. Assim sendo, se a decisão for adotada, o governo vai legalizar em torno de 220 mil quilômetros quadrados de Amazônia desmatada ilegalmente, uma área correspondente à soma dos Estados do Paraná e Sergipe.

Ao que parece, e isso já comentei várias vezes, o governo demonstra-se totalmente perdido, face aos problemas internos nos Ministérios envolvidos na questão ambiental; por um lado, tenta comtemplar os davastadores que não são promovidas por pequenos agricultores, mas por especuladores. Está comprovado, que devastação requer capital e interesses de maior calibre. Já o Ministério do Meio Ambiente, procura culpados, alega o preço das commodities como o maior inimigo, para se eximir da culpa pelas “trapalhadas” indicativas nos números da devastação, ou seja, uma total contrariedade de interesses, de desinformação, um verdadeiro problema de gestão ambiental. Fala-se em tudo, menos sobre a necessidade imperiosa da presença ostensiva de uma fiscalização com rigor do Estado na Amazônia.

Não há dúvida que uma anistia a esses infratores, induzirá a novos desmatamentos, mas ao que tudo indica, parece que o governo com esse estudo, pretende criar um novo polo de produção agrícola, chancelando e premiando os infratores. É um triste caminho em direção à liberalidade visando interesses maiores. Aliás tutelar os interesses do capital, parece a especialidade desse governo, na sua imitigada propensão em privilegiar os poderosos. Atrás de invólucro de socialista, o governo ceifa a esperança e os interesses dos mais humildes, que como diz D. Cappio, insiste em ” oferecer-lhes esmolas “, ao mesmo tempo que induz aos infratores, à devatação clandestina e a extinção da fauna amazônica, demonstrando um desprezo aos seres da floresta e ceifando a esperanças daqueles que um dia lhes deram um voto de confiança .

Fernando Rizzolo