Jobim exonera general após provocação contra direitos humanos

O ministro da Defesa, Nelson Jobim, anunciou nesta quarta-feira (10) a exoneração do general da ativa Maynard Marques de Santa Rosa, chefe do Departamento-Geral do Pessoal do Exército. A punição veio após Maynard publicar carta onde diz que a Comissão da Verdade – criada pelo governo para investigar crimes contra os direitos humanos durante a ditadura militar (1964-1985) – seria formada por “fanáticos” e viraria uma “comissão da calúnia”.

Jobim fez uma declaração seca, sem comentar os motivos da punição. “Acabei de encaminhar ao presidente da República a exoneração do chefe do departamento-Geral do Pessoal do Exército. Ele está à disposição do comando do Exército. O assunto está absolutamente encerrado”, afirmou o ministro.

A contestação da Comissão da Verdade pelo general Maynard – que circula em sites de ultradireita na internet – viola a disciplina militar. O RDE (Regulamento Disciplinar do Exército) proíbe aos oficiais da Arma “,manifestar-se, publicamente, sem que seja autorizado, a respeito de assuntos de natureza político-partidária”; e “censurar ato de superior hierárquico ou procurar desconsiderá-lo, seja entre militares, seja entre civis”.

Manifestações como essa foram comuns durante o século passado, até culminar com o golpe e a ditadura. Depois da democratização de 1985, os militares em geral as arquivaram. Há tempos um general de quatro estrelas e do serviço ativo não se comportava como o agora ex-chefe do Pessoal do Exército, sobre um tema que compete apenas à cidadania e às instituições democtraticamente constituídas.

Na parte substantiva de sua mensagem, depois de um exercício de má filosofia em que cita Descartes e Nietzsche (grafando erradamente o nome do pensador alemão), Maynard afirma: “A ‘Comissão da Verdade’ […] será composta dos mesmos fanáticos que, no passado recente, adotaram o terrorismo, o seqüestro de inocentes e o assalto a bancos, como meio de combate ao regime, para alcançar o poder. Infensa à isenção necessária ao trato de assunto tão sensível, será uma fonte de desarmonia a revolver e ativar a cinza das paixões que a lei da anistia sepultou. Portanto, essa excêntrica comissão, incapaz por origem de encontrar a verdade, será, no máximo, uma ‘Comissão da Calúnia’.”
site do PC do b

Rizzolo: Achei a medida descabida e exagerada. O ministro Jobim não precisava se valer de tal expediente rigoroso, como a exoneração pelo fato do militar ter externado seu pensamento; valeria apenas uma advertência, mas ao que parece, existe interesse num confronto, e isso não é bom para o Brasil, nem para a democracia, e tampouco para as instituições, não aprovo a medida pela desproporção entre o fato em si, e a atitude extrema do ministro, gerando uma humilhação ao general, Lula endossou a decisão.

Em reação a militares, Tarso afirma ter orgulho de sua ficha

O ministro da Justiça, Tarso Genro, disse ontem ter “orgulho” de sua ficha pregressa ao rebater a iniciativa de militares da reserva, com apoio de comandantes da ativa, de organizar uma contra-ofensiva à sua proposta de debater meios de punição a “agentes de Estado” que tenham praticado tortura, assassinatos e violações dos direitos humanos durante o regime militar. “A minha (ficha) me orgulha.”

Os militares planejaram uma espécie de anti-seminário em reação à audiência pública patrocinada pelo Ministério da Justiça na semana passada para debater o tema. Eles marcaram um encontro para quinta-feira, no Clube Militar do Rio de Janeiro, conforme divulgou ontem o Estado.

No evento, nomes, fotos e “biografias” de autoridades do governo Luiz Inácio Lula da Silva e de personalidades do PT com “passado terrorista” serão apresentados. A lista traz a ficha de Tarso em quinto lugar – ele aparece, com os codinomes Carlos e Rui, como “terrorista dos anos 60/70”, “atraído para a luta armada”, que acabou aderindo “à Ala Vermelha” e intensificando suas atividades “depois do AI-5”.

O objetivo dos militares é discutir propostas para que os excessos cometidos por guerrilheiros durante a ditadura também sejam punidos.

Ontem, após participar do debate O Brasil e o Estado de Direito, realizado no auditório do Grupo Estado (leia reportagem nas páginas A8 e A9), Tarso afirmou primeiro aos jornalistas que considerava sua participação na discussão “interditada”, pois aguardava uma orientação técnica sobre o caso. Depois, manteve a defesa da tese de que torturadores do regime militar devem ser responsabilizados cível e criminalmente. A defesa foi o estopim que provocou a reação dos militares e até mesmo do ministro da Defesa, Nelson Jobim.

“Eles (oficiais da reserva) têm direito de fazer a manifestação que fizeram. A minha participação nesse debate está interditada, pois estou aguardando alguma resposta jurídica e técnica sobre isso, pois é uma questão jurídica”, afirmou Tarso. Logo depois, porém, ressaltou: “Em nenhuma legislação, em nenhum tratado internacional, em nenhum país democrático, tortura é considerado crime político.”

LEVIANA

Tarso criticou ainda aqueles que relacionam sua iniciativa de discutir mudanças na Lei de Anistia com possíveis interesses eleitorais. O nome de Tarso é cogitado como possível candidato do PT à Presidência, em 2010. Ele nega ser candidato.

“Considero leviana uma informação que circulou em determinada coluna de que levantar esse tema está vinculado a uma questão sucessória”, declarou o ministro aos jornalistas.

Tarso disse ter dois motivos para isso. Mas acabou listando três: “Primeiro, porque não sou candidato a presidente; segundo, porque quem conduz esse processo no nosso meio é o presidente da República, e terceiro porque misturar uma questão dessa seriedade, que é discutida em todo mundo, com questões políticas imediatas é uma ligação absolutamente despropositada e falsa.”

Petistas como o deputado Jilmar Tatto (PT-SP) e Cândido Vaccarezza (PT-SP) criticaram a decisão de Tarso de entrar em confronto aberto com as Forças Armadas – e a admitiram como uma possibilidade de se colocar como pré-candidato à Presidência dentro do PT.

IRRITAÇÃO

A defesa de Tarso de uma alternativa para que agentes do Estado sejam punidos cível e criminalmente por tortura durante o regime militar irritou diretamente o ministro da Defesa. Jobim fez questão de ressaltar que “a análise dos fatos que estão sendo levantados por Tarso cabe exclusivamente ao Judiciário” e nada tem que ver com o Executivo.

Ele teve de pessoalmente acalmar comandantes das Forças Armadas. Até o momento, eles não encamparam oficialmente o movimento dos militares da reserva, mas já apóiam nos bastidores o movimento de listar os guerrilheiros.

O advogado constitucionalista Pedro Estevam Serrano, professor de Direito Constitucional da PUC-SP, saiu ontem em defesa de Tarso e afirmou que é “absolutamente constitucional a interpretação do ministro de que os crimes de tortura praticados durante o regime militar devem ser julgados”.

“A Constituição de 1988 teve o caráter de fundar um novo regime jurídico e estabelece princípios muitas vezes retroativos. Foi o que ocorreu na Alemanha do pós-guerra, por exemplo. E realmente a Lei de Anistia não pode ser interpretada de forma a alcançar crimes não-políticos e de lesão à humanidade, como o de tortura”, defendeu o advogado.

Defensor da iniciativa de Tarso, Serrano diz, no entanto, que “mais relevante do que punir agentes é identificá-los”. “Indenizações a torturados e ofendidos são necessárias, mas não devem servir como arrimo para jogarmos nossa história para debaixo do tapete.”
Agência Estado

Rizzolo: Como venho dito, essa discussão em hora inapropriada só pode ter um sentido: a provocação. O ministro não deveria incitar questões dessa natureza que apenas denotam um revanchismo quase do ponto de vista pessoal. A questão da tortura, no meu entender é muito subjetiva; não há dúvida que houve excessos, tanto do lado dos opositores do regime militar quanto dos militares na época. O difícil, é com certeza, quantificar e classificar o “componente tortura”, vez que a argumentação do ministro de concretiza no conceito de tortura diferenciando-a do contexto exposto na Lei de Anistia.

Seqüestrar um avião com gritos, ameaças, e armas em punho, não se configuraria gesto de tortura aos passageiros? Seqüestrar um embaixador mantendo-o em cárcere privado não é um tipo horrível de tortura em relação à vítima? Como podemos inferir, não existe uma tortura legitimada, como assim querem nos induzir a pensar. Contudo a discussão foi lançada, sabemos como ela começa, mas não sabemos o quanto ruim poderá ser para o Brasil. Entramos num caminho que não levará a nada, a não ser sede de vingança, e constrangimento para o povo brasileiro.

Tarso volta a defender punição à tortura; militares marcam ato

SÃO PAULO – Enquanto o ministro da Justiça, Tarso Genro, voltou a defender nesta segunda-feira punição a torturadores do período da ditadura, militares que se sentiram descontentes com as declarações marcaram um ato em que pretendem discutir a Lei de Anistia.

“O que eu coloquei no debate –e estou aguardando alguma resposta jurídica sobre isso– é que em nenhuma legislação, em nenhum tratado internacional, em um país democrático, tortura é considerada crime político”, disse Tarso a jornalistas após participar de um debate no jornal O Estado de S. Paulo.

Na semana passada, durante seminário sobre o assunto, Tarso defendeu punição para torturadores do regime militar (1964-1985) pela prática de crimes comuns por envolverem tortura e violência física e psicológica.

Tarso afirmou ainda que a Lei de Anistia, de 1979, não protege torturadores. Há uma interpretação, válida até agora, de que a lei beneficiou os dois lados: os oposicionistas ao regime e os autores de torturas.

O seminário dos oficiais da reserva está marcado para quinta-feira na sede do Clube Militar, no Rio de Janeiro, e leva o título “A Lei de Anistia — Alcance e Conseqüências” que terá três palestrantes, um deles o general Sergio de Avellar Coutinho, além de dois civis, informou um assessor do clube.

Os militares estão sendo convocados por email e por um anúncio pago que será publicado na quarta-feira em um jornal do Rio de Janeiro. O clube, espécie de porta-voz dos militares, reúne 21 mil integrantes das três Forças. Especula-se que será divulgada no evento a participação de integrantes do governo em atos contra a ditadura.

“Os militares da reserva têm direito de fazer a manifestação que quiserem”, disse Tarso.

PRESIDENTE

O ministro da Justiça rechaçou que o tema tenha relação com a sucessão presidencial, como se especulou na mídia.

“Considero leviana a informação de que levantar esse tema está vinculado à questão sucessória. Primeiro porque não sou candidato a presidente da República, segundo porque quem conduz esse processo é o presidente da República e terceiro porque misturar uma questão desta seriedade com questões políticas imediatas é uma ligação despropositada e falsa.” (Reportagem de Carmen Munari)
Agência Estado

Rizzolo: Considerar o aspecto tortura que é por demais subjetivo como sedimentação argumentativa para justificar uma revanche, é realmente uma manobra diversionista. Na verdade existe uma pressão por parte de segmentos radicais do governo que querem o isolamento dos militares, que segundo eles se excederam – o que também é muito discutível o que é o excesso e se o excesso é considerado tortura – para que essa ala militar, fique na realidade “fora de circulação”, e não mais influenciem os militares de uma forma geral. No meu ponto de vista essa é a realidade, o resto é conjectura. Tarso com essa postura denota um radicalismo nunca antes visto de forma tão clara e tão preocupante num Brasil que ama a paz e o entendimento.