EUA tentam esvaziar retomada da Rodada Doha após comentário de Amorim

Os Estados Unidos já tentam esvaziar qualquer esforço para retomar hoje as negociações da Rodada Doha, que discute a liberalização do comércio mundial, baseados em um comentário agressivo do ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim. Ele comparou a resistência dos países ricos em negociar com a atitude do chefe da propaganda da Alemanha nazista, Joseph Goebbels.

Amorim lembrou que, em sua estratégia, Goebbels dizia que uma mentira contada muitas vezes acaba sendo aceita como verdade. Dada a sensibilidade do momento atual na economia global, em que se fala cada vez mais em protecionismo, um comentário desse tipo causou melindre àqueles que esperam qualquer desculpa para dificultar o processo de abertura.

Entenda o que é a Rodada Doha

Susan Schwab, a representante comercial dos EUA –e descendente de sobreviventes do holocausto– foi a primeira a reagir, através de seu porta-voz Sean Spicer. Ela disse que “esse tipo de comentário maldoso não tem lugar nessas negociações”. Amorim pediu desculpas ontem pela declaração. Mas o que tirou com uma mão, recolocou com outra, insistindo no conteúdo da idéia de Goebbels: “Mantenho: repetir uma distorção faz com que as pessoas acreditem que ela é a verdade”.

Em um tom um pouco menos diplomático, mais crítico, Spicer disse que “no momento em que tentamos encontrar um resultado bem sucedido para as negociações, esse tipo de declaração é altamente infeliz”. “Para alguém que é ministro de Relações Exteriores, ele devia estar mais atento para alguns pontos sensíveis.”

Ele ainda afirmou: “[Amorim] fazer declarações desse tipo é incrivelmente errado. Elas são insultuosas.”

Por mais inoportuno que tenha sido o comentário, as negociações comerciais já estavam estagnadas muito antes desse episódio. A obstrução de fato é causada pela dificuldade (ou desejo) que o governo norte-americano tem de enfrentar o lobby agrícola –um dos mais poderosos do país– e cortar os subsídios aos produtores do país. Tanta atenção a um comentário mal colocado seria uma forma de desviar o foco do que realmente é o caso em Genebra: evitar que a rodada seja declarada oficialmente morta –como disse o prêmio Nobel de Economia de 2001, Joseph Stiglitz, em seu livro “Globalização: Como Dar Certo”.

No sábado, Amorim disse que os líderes dos países ricos se baseiam em fórmulas diferentes de redução de alíquotas ao se referir às negociações, o que daria a entender que as concessões que poderão fazer em agricultura são muito maiores que as que os países em desenvolvimento estão dispostos a aceitar no capítulo industrial. “Essa é uma afirmação sob medida para aqueles que não querem fazer sua parte em agricultura”, afirmou.

Ele disse ainda que é um “mito” a crença de que a questão agrícola já está fechada, e que a OMC só está à espera de que os países do Sul demonstrem sua boa vontade em relação aos produtos industrializados para que se alcance o acordo esperado. “Ainda resta muito a fazer na agricultura”, ressaltou –prevendo que um fracasso da reunião ministerial iniciada hoje pode adiar a conclusão de um acordo de livre comércio em três ou quatro anos.

Repercussão

O diário americano “The Wall Street Journal” disse em um artigo que a declaração de Amorim é “absurda e realmente preocupante, vinda de um diplomata moderado”.

Já o jornal americano “The New York Times” diz que a rodada está viva “através de aparelhos”. O diário diz que a Índia e o Brasil “se recusam a reduzir suas tarifas devido ao medo das economias movidas a exportações, como a China”.

O jornal “The New Zealand Herald” disse que a declaração de Amorim é “potencialmente um incidente diplomático”. “O comentário motivou uma pronta resposta dos EUA, cuja representante comercial, Susan Schwab, é filha de sobreviventes do holocausto”.

Folha online
Rizzolo: Como sublinha o jornal americano “The New York Times” a declaração de Amorim é absurda e preocupante, não é possível que um ministro mencione uma frase Joseph Goebbels, ainda insinuando que os EUA e a Europa se portam como nazi-fascistas em termos comerciais. É o cúmulo do politicamente incorreto, é lamentável. O que falta na realidade é preparo para negociar; é o tipo do comentário que qualquer empresa privada orientaria sua gestão a não fazer numa negociação internacional. Agora uma pergunta: o presidente Lula, o que acha desse comentário?

América Latina não precisa de um líder, diz Lula

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse em uma entrevista exclusiva ao jornal americano The New York Times que a América Latina “não está tentando procurar um líder” nem “precisa de um líder”.
Segundo o jornal, Lula descartou sugestões de que ele deva ser um contraponto ao presidente da Venezuela, Hugo Chávez, que “tem agressivamente atraído as atenções na região com seus acordos na área de energia e suas manobras políticas em favor de candidatos de esquerda”.

“O que nós precisamos fazer é construir uma harmonia política, porque a América do Sul e a América Latina precisam aprender a lição do século 20”, disse o presidente, que se encontrou com Chávez na quinta-feira em Manaus.

“Nós tivemos a oportunidade de crescer, nós tivemos a oportunidade de nos desenvolver, e nós perdemos essa oportunidade. Por isso nós ainda somos países pobres.”

Gasoduto e banco

Em uma coletiva após o encontro com Chávez, Lula já havia dito que “não existe disputa” entre Brasil e Venezuela por um suposto papel de liderança na região, nem divergências entre os dois líderes.

Leia mais: Lula e Chávez confirmam projetos conjuntos de Energia

Mas, segundo o The New York Times, “as relação entre Brasil e Venezuela ficaram por vezes estremecidas (…), com o Brasil parecendo se distanciar de algumas propostas de Chávez para maior integração regional”.

Na entrevista ao jornal, Lula reiterou seu apoio a um projeto defendido por Chávez nesse sentido, o Banco do Sul, que financiaria projetos de desenvolvimento.

Mas com relação a outro projeto, o gasoduto que o venezuelano quer que seja construído entre Venezuela e Argentina, passando pelo Brasil e pela Bolívia, Lula se mostrou mais cético.

De acordo com o The New York Times, Lula disse que uma questão crucial é se haverá gás suficiente para tornar o projeto viável.

“Resiliente”

Na entrevista de 1h15 ao jornal americano, publicada com o título Um líder resiliente proclama o potencial do Brasil em agricultura e biocombustíveis, o jornal destaca o fato de que Lula parece não estar sendo afetado por problemas domésticos do Brasil, como a crise aérea ou os escândalos de corrupção.

“Essas preocupações praticamente não parecem deixá-lo preocupado”, descreve o autor da entrevista, Alexei Barrionuevo, que diz que Lula desenvolveu uma “notável resiliência política” devido ao bom momento econômico vivido pelo Brasil e à sua popularidade.

Barrionuevo também abordou na entrevista os planos de Lula para além de 2010.

O presidente voltou a deixar claro que não teria vontade de permanecer no poder e que espera voltar a viver em São Bernardo do Campo, no ABC paulista, onde começou sua trajetória política.

Falando de sua “aposentadoria” como presidente, Lula também aproveitou para, indiretamente, ironizar Fernando Henrique Cardoso.

“Eu não vou participar de um programa de estudos para graduados na Universidade de Harvard”, afirmou Lula, se referindo a uma atividade regular do ex-presidente tucano.

BBC Brasil

Rizzolo:Ao mesmo tempo em que a mídia americana e brasileira tenta gerar intrigas ou simular desavenças entre Lula e Chavez afirmando de forma ardilosa que “as relações entre Brasil e Venezuela ficaram por vezes estremecidas (…), com o Brasil parecendo se distanciar de algumas propostas de Chávez para maior integração regional”, envolve Lula como sendo um líder “mais democrático”, demonstrando e aprovando sua “volta por cima, sua flexibilidade”, um recado a Chavez que no entender de Bush não é democrata. Mas o que Bush quer na verdade, é fazer com que os EUA participem mais da nossa economia, e em contrapartida oferecem o de praxe e costume: nada. Vamos pensar em desenvolver nossa indústria nacional, e negociar o protecionismo americano não abrindo mais nosso mercado, mas impondo a dimensão do que somos hoje em termos de mercado consumidor, e negociar sim, abrindo um amplo debate sobre uma coisa que eles não gostam, imposto sobre remessa de lucros, coisa que não existe desde 1995. Que tal? Vamos negociar !